Vistorias técnicas: "Vamos esperar que tragédias aconteçam?"
“Vamos esperar que aconteça uma tragédia para só então pensarmos numa lei de vistoria de edificações em Curitiba?” perguntou o engenheiro e professor Rui Medeiros, da Universidade Federal do Paraná (UFPR), durante uma reunião pública promovida pela Comissão de Urbanismo, Obras Públicas e Tecnologias da Informação. O encontro, realizado nesta quinta-feira (25) no auditório da Câmara Municipal, tratou do projeto de lei que determina que alguns tipos de edificações devem receber vistorias técnicas e manutenções periódicas por parte do poder público, com base no poder de polícia administrativa. O evento contou com a presença dos vereadores Bruno Pessuti (PSD), Felipe Braga Côrtes (PSD) e Mauro Bobatto (PTN), além de representantes de diversas entidades ligadas ao tema.
O projeto foi originalmente apresentado pelo vereador Tico Kuzma (PROS) em 2012, mas foi arquivado por final de legislatura. O texto estabelecia que a primeira vistoria técnica deveria acontecer contando o prazo de cinco anos a partir da data de expedição do Certificado de Vistoria de Conclusão de Obras (CVCO) ou da ocupação do imóvel com repetição dos procedimentos de vistoria a cada cinco anos. A proposição também previa que a recuperação, manutenção, reforma ou restauro necessários apontados pelos laudos seriam atribuições dos responsáveis pelas edificações e estabelecia multa de R$5 mil no descumprimento da norma.
Jacson Paulo Tessaro, do Instituto Brasileiro de Avaliações e Perícias de Engenharia do Paraná (IBAPE-PR), lembrou de três episódios: reformas irregulares em um prédio no Rio de Janeiro, que geraram um desabamento nas proximidades do Teatro Municipal; o incêndio na Boate Kiss, em Santa Maria, no Rio Grande do Sul; e o incêndio no Mercado Municipal de Porto Alegre. “Foram situações que fizeram ver a necessidade de leis de vistoria”.
O engenheiro Rui Medeiros, foi um dos responsáveis pela implantação na Universidade Federal do Paraná (UFPR) de uma disciplina em nível de graduação sobre “patologias em edificações”. Para ele, se não houver gastos com prevenção, os custos provenientes da posterior manutenção aumentam em cinco vezes. Ele também destacou que há um despreparo por parte dos síndicos tanto em relação à parte estrutural quanto à parte elétrica das edificações.
Eduardo Villas-Boas, engenheiro de segurança do trabalho, destacou que cinco capitais já possuem suas leis de inspeção predial: Porto Alegre, Rio de Janeiro, Salvador (em função da queda das arquibancadas do Estádio da Fonte Nova), Fortaleza (em função da queda de uma sacada) e Vitória (onde ocorreu a queda da lage de um prédio que matou um zelador). Ele fez uma analogia com a saúde das pessoas, “que fazem plásticas e procedimentos estéticos mas não vão ao médico ver coração, estômago, etc. Com os prédios é a mesma coisa”. “Essa lei”, diz ele, “é a oportunidade que temos de prevenir tragédias. A economia em termos de vidas humanas não tem preço”.
Emerson de Mello, vice-presidente de perícias do Instituto Brasileiro de Avaliações e Perícias de Engenharia do Paraná (IBAPE-PR) entende que a vistoria deveria ser anual “E que o vistoriador quando identificar diferentes comprometimentos dos sistemas construtivos acione um mecanismo pra que esse prédio promova um laudo de inspeção predial”. Segundo ele, o subsolo de prédios antigos muitas vezes estão repletos de bolor e de fungos. “Os elevadores acabam funcionando como seringas que espalham esse bolor por todos os andares da edificação”, denunciou.
Outro lado
Carlos Eduardo, do Sindicato da Habitação e dos Condomínios (SECOVI), entende que é necessária mais discussão sobre o tema. “Vai haver impacto econômico”, argumentou. Ele lembrou que a lei 11.095/2004, em seu artigo 57, já prevê a emissão de certificado de vistoria de segurança. “Da mesma forma, comércios e condomínios também precisam do laudo do Corpo de Bombeiros”.
Para Maria Miranda, arquiteta do Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba (IPPUC), há questões que do ponto de vista da administração municipal devem ser consideradas. “Como vamos dar conta de prazos anuais? A prefeitura teria de contratar equipes específicas para isso”. Ela também lembrou que o mobiliário urbano não tem CVCO (pontes, trincheiras, etc).
Também se manifestaram a arquiteta Vera Shebalj; Walter Linzmayer, gerente de fiscalização do Conselho de Arquitetura e Urbanismo (CAU); Keiro Yamawaki, da Associação Brasileira dos Escritórios de Arquitetura (ASBEA); José Rodolfo de Lacerda, do Instituto de Engenharia do Paraná (IEP); Artur Henrique, consultor jurídico do SECOVI; Cássio de Macedo, do Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura do Paraná; Milton Carlos Zanelatto Gonçalves, presidente do Sindicato dos Arquitetos e Urbanistas do Estado do Paraná (SINDARQ-PR); e Gilson Ribeiro, da Associação Brasileira de Engenheiros Civis (ABENC).
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