Violência contra mulheres em estádios é debatida na Câmara
A violência contra mulheres nos estádios foi tema de reunião promovida pela vereadora Maria Leticia. (Foto: Carlos Costa/CMC)
Nesta terça-feira (7), a Câmara Municipal de Curitiba (CMC) promoveu um encontro aberto ao público para o debate da violência contra mulheres nos estádios da cidade. O evento foi uma iniciativa da vereadora Maria Leticia (PV) e teve a participação de integrantes de torcidas femininas dos clubes mais representativos de Curitiba. A vereadora proponente da reunião declarou que a intenção é a de que essa reunião, de natureza apartidária, seja a primeira de muitas outras que terão como tema não só os temas pertinentes à segurança das mulheres, mas também outras situações de interesse da coletividade.
Ela se disse espantada com o fato de saber, em conversa com o delegado da Delegacia Móvel de Atendimento a Futebol e Eventos (Demafe), que não haveria demandas ou denúncias sobre situações de constrangimento, importunação ou violência contra mulheres em estádios nos dias de jogos importantes. Para a vereadora, é necessário que a sociedade entenda o problema em todas as suas dimensões e isso envolve estimular e conscientizar as pessoas quanto à importância da questão. “As ideias, demandas e sugestões trazidas a esse encontro serão avaliadas e levadas em consideração na elaboração do texto do projeto sobre a segurança feminina nos estádios e também na realização de novos encontros e de uma audiência pública com a presença de representantes dos órgãos oficiais ligados ao tema”, disse Maria Leticia.
A advogada Gisele Szmidt, assessora do bloco parlamentar PT/PV, esclareceu todos os artigos da minuta de projeto de lei que será proposta pelo mandato da vereadora. De acordo com ela, o objetivo desse projeto de lei é instituir uma campanha contra a importunação sexual nos estádios e estabelecer ações afirmativas. A assessora apontou que o texto do projeto prevê ações para prevenir, coibir e viabilizar a sanção dessas condutas. A instalação de placas nos estádios com os termos da lei e com as penas referentes aos atos de violência e importunação contra mulheres é uma das medidas adotadas no texto da proposição. Da mesma forma, o sistema de áudio e vídeo dos estádios também devem informar quanto às atitudes que devem ser tomadas pela vítima para fazer valer seus direitos, prática já adotada no estádio Mineirão, em Belo Horizonte.
A capacitação de funcionários também deve ser implantada pelas entidades responsáveis pela administração dos estádios. Esses funcionários ficam, de acordo com a lei, autorizados a acionar a Polícia Militar (PM-PR) para que tome as medidas cabíveis nos casos em que se configure o flagrante de importunação e violência contra a mulher. Nesse sentido, o projeto de lei também prevê que os estádios forneçam espaços adequados para que a polícia desenvolva suas atividades. A necessidade de que os estádios tenham a cobertura de sistemas de vídeo que exibam o máximo possível de locais nas partes internas dos estádios também foi mencionada. “Um dos locais em que as importunações são mais frequentes é nas proximidades dos banheiros. Esses espaços devem ser filmados para que as imagens possam servir como prova de que houve uma importunação”, afirmou Gisele.
Sugestões
Representantes das torcidas femininas sugeriram medidas para a diminuição da violência contra mulheres nos estádios e, entre elas, ideias quanto a importunações que possam ocorrer contra as mulheres no transporte público. Uma delas, por exemplo, é a operacionalização de linhas especiais para o atendimento exclusivo de mulheres que queiram se dirigir aos estádios nos dias de jogos. “Em São Paulo, já é comum nos dias de jogos importantes que linhas de ônibus e metrôs sejam destinadas de forma específica para mulheres e crianças. O mandato da vereadora Maria Leticia já aprovou uma lei que institui campanha permanente em prol da segurança das mulheres no transporte público em situações gerais, mas no caso do transporte de mulheres torcedoras para os estádios em dias de jogos, as demandas e situações podem ser mais numerosas e de difícil flagrante”, observou Gisele.
A presença de policiais femininas na segurança dos estádios em dias de jogos foi uma das demandas apresentadas por representantes das torcidas femininas. Elas também apontaram a necessidade de que as imagens registradas pelas câmeras sejam armazenadas por um período de tempo, com o objetivo de garantir que importunações possam ser comprovadas visualmente. Confederações também devem garantir que as equipes de segurança de empresas particulares estejam preparadas para lidar com as situações. De acordo com as representantes de torcidas femininas, essas entidades alegam que, por serem serviços terceirizados, seria difícil administrar a capacitação desses funcionários.
Outra questão relativa à segurança nos estádios como um todo é, no entendimento das representantes de torcidas femininas, o emprego da cavalaria para a contenção de situações extremas. Para elas, a simples presença de crianças, mulheres e pessoas idosas já seria motivo para que esse método não fosse posto em prática. A Delegacia Móvel de Atendimento a Futebol e Eventos (Demafe), da Polícia Civil, deveria, de acordo com as torcedoras, criar mecanismos que ajudem as mulheres que sofrem violências e importunações nos ambientes internos dos estádios e nas suas proximidades. Uma das torcedoras, lembrando as palavras da vereadora Maria Leticia sobre a declaração do delegado da Demafe de que não haveria demandas envolvendo importunações a mulheres, declarou que esse fato deve ser atribuído ao despreparo de alguns policiais que desconsideram e minimizam as situações.
Preconceito contra organizadas
Funcionários de empresas contratadas para fazer a segurança dos estádios teriam, segundo as torcedoras, preconceito em relação a integrantes de torcidas organizadas, em especial integrantes mulheres. “É necessário realizar a desconstrução de conceitos que potencializam as importunações, como a ideia de que a mulher seria um ‘sexo frágil’. Esse tipo de conceito é alimentado até por seguranças femininas”, apontou a representante da torcida do Coritiba Futebol Clube. Outras torcedoras reforçaram que a omissão por parte de agentes de segurança deve ser punida. A necessidade de discutir o tema dentro das próprias torcidas organizadas foi ressaltada por outras torcedoras. “Os próprios clubes deveriam promover campanhas sobre a violência contra as mulheres e essas campanhas não deveriam ser destinadas exclusivamente às mulheres”, salientou torcedora do Clube Athletico Paranaense.
As torcedoras entendem que o assunto deve ter maior exposição na mídia e a discussão deve contar com a participação de autoridades de mais diversas entidades da administração pública. Embora haja contrariedade por parte de algumas mulheres, o entendimento geral é o de que os homens devem ser incluídos no debate. “Percebam que a presença masculina nessa reunião foi baixa, mesmo sendo o evento de interesse público”, salientou a assessora Gisele. Uma medida de caráter prático lembrada pelas torcedoras é a de que os responsáveis pela administração dos estádios reservem um espaço para que a Polícia Militar possa efetuar prisões em flagrante. “É importante que o agressor não consiga sair do estádio”, reforçou torcedora do Paraná Clube. O próprio ato de torcer foi debatido na reunião. “De que modo devo tratar a torcida oponente na saída do estádio? Esse tipo de reflexão gera efeitos na própria maneira como os homens vão tratar as mulheres e as crianças que estiverem nos estádios”, concluíram as torcedoras.
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