Uso de áreas públicas na habitação pauta debate sobre alienação de imóvel

por Pedritta Marihá Garcia — publicado 31/03/2021 18h40, última modificação 31/03/2021 18h43
Projeto de iniciativa do Executivo recebeu 30 votos favoráveis e 6 contrários em segundo turno.
Uso de áreas públicas na habitação pauta debate sobre alienação de imóvel

Vereadores defenderam que terrenos do município sejam aproveitados para a construção de moradias de interesse social e equipamentos públicos. (Foto: Rodrigo Fonseca/CMC)

Além de aprovar o projeto que regulamenta o laudo permanente para atestar o Transtorno do Espectro Autista (TEA) no município, os vereadores também acataram nesta quarta-feira (31) em segundo turno a alienação de uma área pública de cerca de 500 m², localizada no bairro Santa Cândida. O debate, que durou cerca de 1 hora e meia, foi focado na possibilidade do aproveitamento desses terrenos para a construção de moradias e equipamentos públicos. 

A mensagem do Executivo que solicitou a autorização dos vereadores para vender imóvel de 505 m², por meio de concorrência pública (005.00144.2020) recebeu 30 votos “sim” e 6 votos “não”. O terreno fica na rua São João, no Santa Cândida, e deverá ter o lance mínimo de R$ 818 mil – conforme definição da Comissão de Avaliação de Imóveis (CAI) da prefeitura. A área será posta à venda após solicitação de aquisição formalizada por Vinícius Gulin, em 2018 

Se no primeiro turno, nesta terça-feira (30), três vereadores discutiram a matéria, hoje 11 parlamentares participaram do debate. Contrária à iniciativa em ambas as votações, Professora Josete (PT) voltou a sustentar sua opinião de que nesta área poderia ser construído um equipamento público, uma praça, uma área de lazer ou até mesmo moradias. “Entendemos que vários destes terrenos que estão sendo vendidos, poderiam ter sido doados à Cohab, para que a Cohab os direcione às pessoas que não tem acesso à moradia ou não conseguem pagar o aluguel e, por isso, acabam engrossando as áreas de ocupação irregular que são muitas na nossa cidade”, argumentou.

Esse reforço para que a Prefeitura de Curitiba tenha uma política pública de habitação de interesse social mais efetiva também foi corroborado pelos colegas de bancada, Renato Freitas e Carol Dartora. Para o vereador, nenhuma gestão pode comprometer o patrimônio da cidade, sem pensar nas gerações futuras. “Já percebemos que a cidade não tem uma política de moradia. Curitiba não constrói e não regulariza moradias, ela realoca”, afirmou Freitas. “A Cohab funciona como [empresa de] economia mista e ganha dinheiro construindo casas. Não ganha dinheiro quando regulariza uma casa, quando dá o título de propriedade. Pelo contrário, quando regulariza precisa urbanizar a área”, complementou.

Para Dartora, para garantir mais investimentos na habitação de interesse social, “Curitiba precisa mudar a política da alienação de imóveis”, regularizar mais e não promover, “muitas vezes, desocupações em momentos inoportunos”. “As realocações muitas vezes são muito mais onerosas. Curitiba [deve] se democratizar no sentido da política de habitação e de interesse social e fugir desta lógica da especulação imobiliária.”

Também contrário à venda do terreno no Santa Cândida, Salles do Fazendinha (DC) explicou que áreas públicas usadas na construção de equipamentos públicos trazem ganhos para a comunidade. Como exemplos, ele citou áreas do bairro Fazendinha, onde houve especulação para venda, mas que foram usadas pelo Executivo para a implantação do Bosque Fazendinha, do Parque Cambuí, do Parque Guaracá, da Rua da Cidadania do Fazendinha, além de unidades do Armazém da Família, Sacolão da Família e da UPA Fazendinha. O vereador ainda sugeriu que, antes de pedir autorização da CMC para alienar um imóvel, a prefeitura analise se ele pode ser usado para outros fins, “afinal de contas é uma coisa pública”.

Mais pontos de vista
Apesar de entender os pontos colocados pelos vereadores do PT em relação à habitação, Indiara Barbosa (Novo) pontuou que “nós do Partido Novo entendemos que o Estado não tem que resolver todos os problemas, não tem que ser enorme, não tem que ter imóveis e ter um monte de coisas”. “Precisamos de um Estado menor, mais eficiente e que atrapalhe menos a vida do cidadão”, emendou, antes de propor que a administração municipal faça um estudo detalhados sobre os imóveis públicos que podem ser vendidos ou usados na construção de equipamentos públicos ou na habitação.

Ao corroborar de que o Estado não pode ser “babá”, o líder do governo na CMC, Pier Petruzziello (PTB) defendeu que, se é legal e contribui para a diminuição do Estado, uma área pública deve ser vendida. “Neste caso, esta venda passa por processo licitatório”. E continuou: “É evidente que temos que pensar em moradias dignas. Não é uma questão de direita, de esquerda ou de centro, é uma questão humanista. (...) Particularmente acho que a Cohab deve mudar a forma de agir, de pensar e de trabalhar políticas públicas. Não é porque sou líder do governo que vou deixar de dizer e fazer as críticas que devem ser feitas”.

“Neste caso menos é mais”, complementou João da 5 Irmãos (PSL), favorável à diminuição do Estado. “Quantos imóveis Curitiba tem e que não podem ser aproveitados? E aquele ali [do Santa Cândida] tá ganhando valor e tá parado, sem uso. Muitas vezes não tem o recurso para ser investido ali no momento, para a construção de uma unidade de saúde por exemplo, e fica ali por anos e anos parado, gerando mato, gerando problemas sociais”, concluiu, ao recomendar que o dinheiro arrecadado com a venda do imóvel possa ser aplicado na construção de moradias, “um clamor popular”.

Em defesa da Cohab
Ex-diretor da Cohab, Ezequias Barros (PMB) saiu em defesa da política de habitação de Curitiba. Para ele, quem afirma que a Cohab “dá lucro” mostra que desconhece a realidade da companhia, que “vive e depende do município para pagar seus funcionários, inclusive”. “Na minha época, a Cohab tinha R$ 90 milhões passivos para receber, parte deles no Caiuá, boa parte das pessoas não pagou seus imóveis”, contou, ao também apontar que a companhia deixou de lucrar quando vendeu imóveis “a 10% de seu valor para a Caixa [Econômica Federal]”.

“Dizer que a Cohab não faz regularização fundiária é uma inverdade. (...) O município não pode regularizar moradias que estão em APPs [áreas de preservação permanente] ou APAs [áreas de preservação ambiental]”, continuou Ezequias Barros. Ele ainda explicou que, por isso, nem todas as pessoas que moram atualmente na Caximba, após a implementação do projeto especial da Cohab, poderão permanecer no local, “porque parte da área ocupada está em uma APP”.

Dalton Borba (PDT), Noemia Rocha (MDB), Amália Tortaro (Novo) também participaram do debate. Com a aprovação do projeto de lei em segundo turno, a mensagem do Executivo será enviada ao prefeito para sanção. Sendo sancionada, a lei entrará em vigor na data de sua publicação no Diário Oficial do Município e, assim, a prefeitura estará autorizada pela CMC a promover a venda da área pública, mediante licitação.