Rejeitado pedido de revisão do contrato entre Prefeitura e creches conveniadas
Atualmente, os CEIs conveniados seguem o calendário escolar das creches municipais e recebem por 200 dias letivos. (Foto: Rodrigo Fonseca/CMC)
A sugestão para que a Prefeitura de Curitiba remodele o sistema de repasse de recursos aos Centros de Educação Infantil (CEIs) conveniados com a Secretaria Municipal de Educação (SME) foi rejeitada pela maioria do plenário da Câmara Municipal de Curitiba (CMC): foram 19 votos contrários e 11 favoráveis. A votação simbólica aconteceu na segunda parte da Ordem do Dia desta quarta-feira (6). A discussão levou cerca de 1h20min e contou com os posicionamentos de 10 vereadores e vereadoras.
O debate aconteceu após a votação da proposição ter sido adiada duas vezes, em 28 de fevereiro, a pedido da liderança do Governo, e em 4 de março, a pedido dos coautores da indicação. Na semana passada, Tico Kuzma (PSD) solicitou que a análise ficasse para esta semana, porque a pasta da Educação teria uma agenda marcada com representantes das creches conveniadas, para tratar justamente do mote da proposição. A sugestão inicial (205.00061.2024) foi retirada pelos autores e reapresentada para a votação de hoje, com o mesmo teor.
Em resumo, a sugestão ao Executivo pede a revisão do Edital de Credenciamento 003/2023, da SME, para que seja feita a remodelagem do sistema de repasse e distinção entre as instituições privadas do Ensino Fundamental e os Centro de Educação Infantil (CEIs) sem fins lucrativos que atendem exclusivamente a Educação Infantil (205.00070.2024). Os autores da proposição são os vereadores Angelo Vanhoni (PT), Dalton Borba (PDT), Giorgia Prates – Mandata Preta (PT), Maria Leticia (PV), Marcos Vieira (PDT), Noemia Rocha (MDB) e Professora Josete (PT).
Na justificativa da indicação, os vereadores explicam que, em 2019, a Prefeitura de Curitiba remodelou a distribuição das crianças da Educação Infantil e fez alterações na forma e cálculo de repasse para as instituições conveniadas. O grupo reconhece que o número de vagas foi ampliado a partir desta data, com mais CEIs contratados – de 75, em 2017, para 158 em 2024 –, mas explicou que a faixa etária que hoje é atendida por estas creches (0 a 3 anos) tem um custo “mais oneroso em razão da maior demanda de cuidadores e dietas especiais” e que o reajuste do per capita (feito em 2019), que é o valor pago por cada criança matriculada, “está defasado, haja vista que os estudos que estabeleceram o cálculo do per capita foram realizados entre os anos de 2016 e 2017”.
Na sugestão que foi rejeitada pela maioria do plenário, os autores ainda explicam que a forma com que a SME repassa a verba aos CEIs conveniados, cuja remuneração é apenas pelos dias letivos (200 por ano) e parcelada em dez vezes, “gera uma distorção pelo fato de as instituições terem despesas 365 dias do ano, ou seja, mesmo sem o atendimento das crianças, há despesas de manutenção e investimento na estrutura das creches, além da folha de pagamento de funcionários e todos os encargos”.
Autores da sugestão defendem a remodelagem do contrato
Quem abriu o debate sobre a necessidade da remodelagem do contrato foi Professora Josete. Assim como na semana passada, quando foi discutido o adiamento da votação, hoje a vereadora voltou a repercutir o caso do CEI Maria Cazetta, que fechou as portas no mês passado, devido a uma crise financeira. Segundo ela, apesar do aumento do número de conveniadas, algumas creches deixaram de manter o contrato com a Prefeitura, após as mudanças de 2019. Outras, completou, também correm o risco de fechar as portas, porque temem não conseguir cumprir o contrato até o final deste ano.
A vereadora comentou que isso acontece, porque “grande parte dos CEIs conveniados não tem uma mantenedora, que ajuda a complementar o valor per capita para poder atender as crianças”. “Se a gestão quer garantir uma isonomia entre os CMEIs e os CEIs conveniados, ela tem que dar as mesmas condições. E eu defendo que seja o mesmo valor que hoje é investido nos CMEIs. Se nós queremos uma educação de qualidade, que proporcione as mesmas oportunidades às crianças, temos que tratar desta forma: de maneira igualitária não só no calendário, mas também de maneira igualitária nos recursos investidos”, defendeu Josete.
Coautor da sugestão, Marcos Vieira endossou a preocupação da colega. “Se não fossem esses CEIs, essa fila de crianças que aguardam uma vaga em creche seria muito maior. É um trabalho diferenciado. É importante que se faça esta revisão, para que seja diferenciada a tratativa dos CEIs sobre as escolas privadas [aquelas que têm mantenedoras e ainda sim são conveniadas com o Poder Executivo]”, disse o vereador. “Não existe sistema econômico que se sustente recebendo por 10 meses e tendo custos por 12 meses, que é o que tem acontecido desde 2019. CEIs que só atendem crianças de 0 a 3 anos foram impactados fortemente [com isto]”, complementou Maria Leticia, também coautora.
Repercutindo demandas apresentadas ao seu gabinete parlamentar por gestoras de creche conveniadas, Indiara Barbosa (Novo) afirmou que a Prefeitura de Curitiba fez “o mínimo que deveria ser feito”, ao aumentar o número de vagas na Educação Infantil – em 2017, eram 45 mil crianças matriculadas, e em 2024 saltou para 56 mil, segundo a liderança do Governo. Conforme a vereadora, que foi favorável à indicação, as creches contratadas reclamam que os editais são cada vez mais exigentes. “Este edital, em relação ao edital anterior, exige várias coisas [dos CEIs conveniados] que às vezes não são exigidos dos próprios CMEIs. Por exemplo, que não pode ser refeito nenhum repasse [de dinheiro, pelos pais]. Nos CMEIs, as diretoras acabam sim tendo que solicitar valores para os pais, para complementar. Agora no CEI, elas não podem de jeito nenhum”, disse.
Outras exigências que elevaram o custo de manutenção dos CEIs citadas pela vereadora foram: as fronhas e os lençóis usados pelas crianças do berçário, que agora precisam ser fornecidos pelas creches conveniadas, quando antes eram os pais que os levavam; o aumento do número de funcionários, como, por exemplo, a necessidade da contratação de mais cozinheiras para fazer a alimentação dos alunos, conforme o número de matriculados; e o fato de que o CEI, se precisar mudar de endereço, para um imóvel mais barato, estará impedido de o fazer durante a vigência do contrato, sob pena de ser descredenciado. “Várias escolas não estão conseguindo [se manter] por causa destas mudanças do edital. Não assinei o requerimento, mas reforço a solicitação para que a Secretaria de Educação possa ver o que dá para ser feito. São demandas que fazem sentido.”
Liderança afirma que sugestão vai contra a legislação
“Somos contrários ao requerimento, porque a [creche] filantrópica [contratada] não pode ser tratada diferente da privada [conveniada]. Isto não pode, é contra a Legislação”, afirmou o líder do Governo na CMC, Tico Kuzma, ao pedir o voto contrário à indicação da sugestão. “[A revisão do edital] não pode ser feita neste sentido. A Prefeitura tem que pagar pelo serviço prestado, pelos 200 dias letivos, por mais que o custo seja anual. Os 200 dias letivos representam os 10 meses, por isso é pago em 10 meses o custo anual da unidade. E a secretaria está aberta para debater os custos e fez este compromisso com os CEIs contratados”, atestou.
Ainda segundo o parlamentar, desde 2019, quando a forma de contratação foi alterada, houve “avanços significativos” na Educação Infantil. Além de 27 novos CMEIs inaugurados entre 2017 e os dias atuais, o número de conveniadas passou de 75 para 158 instituições; e houve aumento dos valores pagos aos CEIs contratados por criança matriculada. “Antes, as instituições cobravam dos pais, ou pediam ajuda, de 10%, 30%, 50%. E desde 2019 a Prefeitura mais que dobrou este valor que é pago às instituições, para que elas não cobrem ou não exijam nada em troca dos pais, pelos alunos matriculados. […] O aumento foi de quase 120% do valor [per capita]”, afirmou.
Até 2019, conforme dados apresentados por Tico Kuzma, a Prefeitura de Curitiba repassava o valor mensal de R$ 443,17 por criança de 0 a 3 anos, e R$ 399,40 por criança de 4 ou 5 anos. Em 2019, o valor per capita mensal, independente da faixa etária, passou para R$ 970,17. “Antes não tinha-se nem o cálculo sobre o custo de uma criança e, a partir de 2019, juntamente com os CEIs contratado, a Prefeitura fez uma planilha incluindo todos os custos do ano: professores, material, alimentação, aluguel, IPTU. Antes não tinha. Era um valor arbitrado por criança, que realmente não dava para que aquele CEI contratado arcasse com as despesas, por isso tinha que pedir uma complementação [financeira] para os pais”, completou. Em 2024, o valor per capita mensal será de R$ 1,180,66, para o berçário, e R$ 1.073,33 para o maternal.
Para Serginho do Posto (União), que votou contrário à sugestão, o contrato “reza" que o Município tem que cumprir o que estiver no edital: “vai ter que pagar em dia, dar as diretrizes pedagógicas”. “É um dinheiro público e, através de um convênio, é repassado uma [quantidade] per capita para as instituições. É importante uma reflexão do ponto de vista contratual. Por mais que existam as dificuldades de algumas instituições, o contrato está vigente e a Prefeitura, através da sua Procuradoria-Geral [do Município], não pode desvirtuar o contrato. Se nós desvirtuarmos o contrato, para a Prefeitura será muito difícil, depois, responder aos órgãos fiscalizadores. Se há distorção, e precisam ser feitas correções [de valores], esta Casa nunca se furtou à discussão”, emendou. “É preciso prezar pela segurança jurídica.”
Além dos vereadores já mencionados, também se manifestaram em plenário Ezequias Barros (PMB), que justificou seu voto contrário, Alexandre Leprevost (Solidariedade), Dalton Borba (PDT) e Noemia Rocha (MDB), que defenderam a revisão do edital.
Votadas em turno único e de maneira simbólica (sem o registro no painel eletrônico), as indicações de sugestão são um tipo de proposição diferente dos projetos de lei. Elas recomendam ações para serviços de competência apenas do Poder Executivo. Ou seja, apesar de serem uma manifestação legal dos vereadores, submetidas ao plenário, as sugestões não são impositivas. Cabe à administração municipal avaliar e acatar, ou não, cada proposta.
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