Redução da maioridade penal gera debate na Câmara

por Assessoria Comunicação publicado 18/05/2015 19h00, última modificação 30/09/2021 09h36
“Sempre fui contra a redução da maioridade penal, não existe nenhum argumento objetivo que me convença do contrário”, declarou Professora Josete (PT), proponente da audiência pública sobre o tema realizada na Câmara Municipal, nesta segunda-feira (18). Para a vereadora, é necessário que o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) seja cumprido “para que os jovens tenham seus direitos garantidos e cumpram com seus deveres”.

De acordo com Josete, o Brasil precisa vencer ainda a desigualdade social que, em sua opinião, é a maior causa da criminalidade no país. “As pesquisas mostram que apenas 1% dos jovens cometem crimes. Em geral, eles é que são as vítimas, sendo que a maioria dos adolescentes assassinados são pobres, negros e do sexo masculino”, acrescentou.

A audiência foi conduzida pelo líder do prefeito na Câmara, vereador Paulo Salamuni (PV). Para ele, é importante discutir o tema em todas as esferas da sociedade, para que o maior número de pessoas conheça os impactos que a medida pode causar. “Temos ouvido discursos muito ralos sobre esse tema, sem aprofundamento das questões. Não podemos tratar os assuntos dessa maneira na vida pública”, declarou.

Para o procurador de justiça do Ministério Público do Paraná, Olympio Sá Sotto Maior, a PEC 171/93 faz jus ao número que recebeu, pois o número 171, no Código Penal Brasileiro, refere-se ao crime de estelionato, quando se tenta enganar ou levar alguém ao erro. “Não podemos aceitar a manipulação da informação para induzir e manter a população em erro”, sentenciou.

O desconhecimento de grande parte da sociedade, sobre o conteúdo do ECA, é apontado pelo procurador como um dos grandes problemas a ser enfrentado. Conforme Sotto Maior, o Estatuto já prevê a responsabilização do jovem sobre seus atos, com penas e sanções específicas. “Em vez de transformar nossas crianças em bodes expiatórios pela situação de insegurança, melhor é pressionarmos o Estado para que cumpra seu papel constitucional de garantir a todos eles os seus direitos. E que além disso, tenham destinação privilegiada nos orçamentos públicos.”

Um manifesto foi elaborado pelo Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente de Curitiba (Comtiba), e será encaminhado à Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados Federais. Segundo o documento, lido pela presidente do conselho, Daraci dos Santos, a infância e juventude no Brasil “estão prestes a receber um duro golpe” diante a possibilidade de redução da maioridade penal de 18 para 16 anos e pela ampliação do tempo de privação de liberdade (internação).

Em média, um jovem morre por hora no Brasil, segundo anunciou na audiência o presidente do Conselho Municipal da Juventude (CMJ), Rodrigo de Andrade. De acordo com ele, a possibilidade de modificação da lei denota o grande desconhecimento sobre o conteúdo do Estatuto da Criança e do Adolescente. Para Andrade, trata-se de uma medida “populista e oportunista” empreendida por alguns representantes federais. “Queremos a recuperação desses adolescentes, mas sabemos que nosso sistema carcerário é falido”, acrescentou.

Debate
A advogada criminal Camila Fronza de Camargo, integrante do Movimento Paraná Contra a Redução da Maioridade Penal, criticou a PEC 171, afirmando que o jovem tem consciência sobre o que faz mas que “talvez não tenha noção sobre as consequências dos seus atos”. Para a jurista, a análise da justificativa da proposta é capaz de mostrar o quão desvinculada da realidade está a proposta em análise no Congresso.

“Não existe uma idade pré-determinada para dizer que uma pessoa possui maturidade ou não. Esse recorte abrupto não encontra base em estudos psicológicos nem psiquiátricos”, afirmou ela, referindo-se à justificativa de que os jovens de hoje possuem “desenvolvimento mental” maior do que aqueles de 1940, quando o Código Penal Brasileiro foi escrito.

A discordância da Defensoria Pública do Paraná sobre a redução da maioridade penal foi comentada pelo subdefensor público geral, André Ribeiro Giamberardino. “Essa discussão tem sido conduzia com má-fé e com desconhecimento”, acusou. Segundo ele, é preciso diferenciar responsabilidade penal juvenil e de adultos. “A partir dos 12 anos de idade o jovem já pode ser responsabilizado, por meio da internação. Aos 18, a responsabilização é de acordo com o código penal.”

Além disso, André Giamberardino falou da dificuldade de gerenciar o sistema carcerário atual e o quanto custaria aos Estados a criação de novas vagas em penitenciárias. “O custo para gerar uma vaga no sistema prisional é de R$ 40 mil. Para suprir o deficit atual levaríamos quase 70 anos. Imaginem criar vagas e colocar jovens infratores junto a adultos”, comparou.

A experiência pessoal fez o coordenador dos Conselhos Tutelares de Curitiba, o psicólogo Josimar Lemes da Silva, trabalhar em prol da defesa das crianças e jovens. Silva contou que ficou entre a vida e a morte, após ser baleado por um adolescente. “Como tive a oportunidade de sobreviver, resolvi lutar em favor desses jovens”, relatou.

De acordo com o coordenador, é preciso combater o discurso “populista” de que haverá resolução para o problema da violência por meio da segregação dos jovens. “Nosso sistema carcerário é falido, não se consegue o mínimo de ressocialização de um adulto, imagina isso para um adolescente. O ECA é respeitado por muitos países. Tornamo-nos referência nesse sentido. Precisamos efetivar políticas públicas em benefícios dos jovens brasileiros”, concluiu.

Também participaram das discussões integrantes da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-PR), entidades de defesa da criança e do adolescente, além de membros de movimentos sociais.