Primeira vereadora de Curitiba batiza Escola do Legislativo
Da esquerda para a direita, Noemia Rocha, Alice Mochel, Maria Leticia e Danielli Wandembruck. (Foto: Rodrigo Fonseca/CMC)
Nesta segunda-feira (6), durante a abertura da “Semana Pró-Mulher: el@s no centro do debate público”, a Câmara Municipal de Curitiba (CMC) homenageou a primeira vereadora da capital paranaense, Maria Olympia Carneiro Mochel. Ela passa a dar nome à Escola do Legislativo, responsável por capacitar servidores e vereadores.
Até hoje a mulher mais jovem a fazer parte da CMC, Mochel se elegeu aos 21 anos de idade e fez parte da primeira legislatura contemporânea, de dezembro de 1947 até dezembro de 1951. As brasileiras puderem ir às urnas, pela primeira vez, em 1933. Nas eleições para vereadores de 1935, a única da Era Vargas, elas já podiam concorrer, mas nenhuma candidata concorreu às cadeiras da Câmara de Curitiba. Somente 12 anos depois, com a reabertura dos Legislativos, é que ocorre um novo pleito, uma mulher entra na disputa e é eleita.
“Esta semana que configura como uma das mais especiais do ano”, disse Maria Leticia (PV), procuradora da Mulher e segunda-secretária da CMC. Mais do que celebrar o Dia semana Internacional da Mulher, ela explicou que o objetivo da programação especial é “promover um calendário de capacitação, empoderamento e atividades que fazem da nossa cidade um lugar melhor para todos nós”.
“Batizar nossa Escola com o nome da nossa primeira vereadora não é mera convenção, é valorizar uma mulher pioneira, que em 1947 inaugurou a presença feminina no Parlamento Municipal, com apenas 21 anos”, saudou a procuradora. “E eu tenho certeza que posso dizer, em nome de todas as vereadoras, estar aqui não é fácil. Se hoje, em pleno 2023, nossa presença nos espaços políticos significa enfrentar inúmeras resistências e violências, que por vezes acontecem diante dos olhos de todos, sem o menor constrangimento, o que terá então enfrentado Maria Olympia para ocupar este espaço?”, ponderou. Vale lembrar que na década de 1940 as mulheres eram proibidas de fazer coisas que hoje consideramos super normais, como jogar futebol”, continuou Maria Leticia.
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“Maria Olympia tomou posse em dezembro de 1947, na primeira legislatura contemporânea da CMC. “Ela abriu um caminho extenso, difícil, tortuoso, com muitas pedras ainda, mas para diversas vereadoras que passaram por aqui desde a década de 1940”, parabenizou o presidente Marcelo Fachinello (PSC). Ele lembrou que esta legislatura manteve o recorde de eleição com maior bancada feminina, com oito parlamentares. Ano passado, durante passagens da atual deputada estadual Ana Júlia (PT), a Casa chegou a ter nove vereadoras.
A diretora da Escola do Legislativo Maria Olympia Carneiro Mochel, Danielli Wandembruck, recebeu o certificado com a denominação em homenagem à primeira vereadora de Curitiba. A servidora ressaltou o papel do órgão da estrutura funcional da Casa: "Escola esta que compõe a estrutura do Poder Legislativo e supera as competências constitucionais atribuídas a este Legislativo”. “Se o papel da escola foi um dia ser um centro de treinamento para os processos operacionais”, ponderou, “hoje nossa responsabilidade é muito mais abrangente; internamente, nosso desafio é ressignificar a função do servidor público”.
Histórias de vida
Um dos cinco filhos de Maria Olympia, a médica Alice Mochel veio de Brasília para Curitiba com o objetivo de acompanhar a homenagem. Ela compartilhou em plenário histórias sobre a vida da mãe, falecida em janeiro de 2008, aos 82 anos de idade. "Essa é uma ocasião bastante especial. A vida da minha mãe em Curitiba nunca foi negada, a história foi contada por ela aos filhos e pelo meu pai, que morou aqui."
“A eleição foi uma surpresa para todo mundo. Ela chegou aqui e não tinha banheiro feminino na Câmara [cuja sede, na época, era o Paço Municipal]", relatou Alice. Segundo ela, “havia toda uma pressão e nenhuma ajuda”. “Ela foi eleita com 21 anos, ela teve dois filhos aqui em Curitiba, e quando a situação ficou insustentável [após o fim do mandato], eles foram para o Maranhão [de onde era a família do marido]”, afirmou. “Ela se considerava maranhense de coração, ela adquiriu o sotaque maranhense, mas não esquecia de Curitiba. Tinha família aqui, minhas tias já estão falecidas. Ela gostava, tinha boas lembranças, apesar de todas as dificuldades que ela passou.”
Em São Luís, disse Alice, Maria Olympia ficou os primeiros dez anos sem atividades profissionais, dedicando-se à criação dos quatro filhos. Depois é que ela foi cursar Medicina, sendo que no quinto ano do curso teve a quinta e última gestação. A ex-vereadora escolhei a psiquiatria como área de atuação, onde também foi precursora. “Eu brincava que ela saiu de uma pedreira e entrou em outra. Ela foi a primeira psiquiatra de São Luís e provavelmente do Maranhão”, frisou a filha, que também é médica.
“Na família, a gente brincava que ela era a pistoleira”, citou. A arma, segundo Alice, foi comprada para sua segurança em viagens pelo Maranhão pelo Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social (Inamps), precursor do Sistema Único de Saúde (SUS), “numa época em vigorava a lei da bala”. “Ela tinha essa coisa da bondade, da sensibilidade com o paciente psiquiátrico, e ela tinha também uma força interior de fazer o que era direito, mesmo que, para isso, precisasse de uma atitude dura.”
A filha contou ainda que Maria Olympia trabalhou nos principais hospitais psiquiátricos, defendia a reforma manicomial e fundou a Associação Maranhense de Psiquiatria. “Ela esteve muito envolvida nos processos todos da psiquiatria em São Luís”, disse. Os ex-pacientes, revelou, até hoje lembram dela: “A vida dela foi voltada para a família e para a psiquiatria, e isso foi muito reconhecido”. “E ela formou uma geração, ou três, talvez, de profissionais médicos ajudando a entender as nuances da psiquiatria”, completou.
Equidade e direitos
Primeira-procuradora-adjunta, Giorgia Prates - Mandata Preta (PT) lembrou que Curitiba só elegeu uma mulher negra para a Câmara em 2020: Carol Dartora (PT), que também fez história, em 2023, por se tornar a primeira deputada federal negra do Paraná. “Eu ainda sou a segunda. E nós ainda não temos uma mulher indígena”, apontou. Mais que ocupar esses espaços, nós queremos que eles não sejam motivo de adoecimento, que não atinjam nossos corpos com violência política. E é sempre bom lembrar que se existem direitos, é porque nós não aprendemos o que é o respeito.”
“Este reconhecimento da Procuradoria da Mulher desta Casa é justo, faz a diferença”, disse a segunda-procuradora-adjunta, Noemia Rocha, defendendo a equidade de mulheres e homens nos Parlamentos brasileiros e no mercado de trabalho. A vereadora relembrou que também partiu de Maria Olympia a organização da primeira Conferência de Mulheres no Paraná, mas que o evento não pôde ser divulgado.
Primeiros-secretário da Câmara, Osias Moraes (Republicanos também se manifestou), destacou a importância do Dia Internacional da Mulher e a representação feminina nos cargos de chefia do Legislativo. “Os esforços de todos devem caminhar para que jamais mulheres e meninas tenham oportunidades negadas, sejam agredidas, violentadas ou mortas pelo fato de terem nascido do gênero feminino”, declarou. Alertando ao feminicídio, lamentou o caso recente da presidente da Câmara de Juazeiro do Norte (CE), Yanny Brena Alencar Araújo (PL).
A abertura da programação foi prestigiada também pela ex-vereadora Julieta Reis; pelas vereadoras da cidade de Arapongas (PR), Marisa Staub (PSC) e Meiry Farias (PRTB); e pela secretária do Podemos Mulher, Luciana Fiorelli.
As sessões plenárias são realizadas de segunda a quarta-feira, a partir das 9 horas, com transmissão ao vivo pelos canais da Câmara de Curitiba no YouTube, no Facebook e no Twitter. Confira, no Flickr, o álbum da solenidade de batismo da Escola do Legislativo:
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