População negra pede ações do poder público contra o racismo

por Claudia Krüger | Revisão: Alex Gruba — publicado 08/08/2023 14h40, última modificação 09/08/2023 08h19
Foi proposta a criação de um programa antirracismo no comércio e um dossiê sobre dados de violência.
População negra pede ações do poder público contra o racismo

Poder público e sociedade civil se reuniram na segunda-feira para debater o combate ao racismo. (Foto: Carlos Costa/CMC)

A Câmara Municipal de Curitiba (CMC) promoveu, na noite de segunda-feira (7), audiência pública para debater estratégias de enfrentamento ao racismo e à discriminação racial. Por iniciativa da vereadora Giorgia Prates - Mandata Preta (PT) e da deputada federal Carol Dartora (PT-PR), representantes do poder público e da sociedade civil organizada puderam falar de suas experiências e suas demandas relacionadas ao tema. A íntegra do evento pode ser conferida no YouTube da CMC. 

Como resultado, foi sugerida a criação de um programa antirracismo, por parte da Associação Comercial do Paraná (ACP), a fim de levar informação e esclarecimento aos trabalhadores destes estabelecimento, inclusive com a instituição de um selo de “ambiente livre de discriminação”. Foram propostas ainda a construção de um dossiê com dados sobre racismo e violência, especialmente ocorridas nas escolas do município, além de se fiscalizar o cumprimento da Lei de Cotas (lei federal 12.990/2014). 

Em sua fala inicial, Giorgia Prates comentou sobre a representatividade, em números, da população que se autodeclara negra ou parda na cidade de Curitiba. O percentual, segundo dados do último senso do IBGE, aponta para 24% da população que se enquadra nesses critérios, ou seja, cerca de 430 mil pessoas. No entanto, isso não se expressa nos espaços de poder e de cargos de liderança nas empresas. “Ao mesmo tempo, vemos muitas das nossas pessoas nos presídios, nas filas do desemprego e, infelizmente, nos índices de violência, na condição de vítimas”, pontuou. 

Para ela, é importante se pensar em políticas públicas eficazes e voltadas a solucionar os casos de discriminação e de racismo estrutural. Giorgia citou o requerimento de sugestão ao Executivo, admitido na sessão plenária de segunda (7), para a criação do Centro de Referência Afro Enedina Alves Marques de Combate ao Racismo e à Intolerância Religiosa (Cream). O órgão teria como finalidade promover a igualdade racial e proteção dos grupos étnico-raciais em articulação com a Assessoria de Direitos Humanos e da Promoção da Igualdade Étnico-Racial e Povos Originários de Curitiba (205.00279.2023). 

Representação

A deputada federal Carol Dartora, por sua vez, afirmou que o Brasil é o país mais racista do mundo, ao ter 56% da sua população negra ou parda, mas invisibilizada em espaços de representação. Ela citou ainda o chamado “pacto da branquitude”, em que mesmo com dados suficientes, não são levados em conta para políticas efetivas a essa parcela da população. “A gente precisa que o estado brasileiro e que as instituições públicas se coloquem de verdade para a superação do racismo”, frisou.

Já o deputado estadual Renato Freitas (PT), ex-vereador de Curitiba, citou o caso do estado da Bahia, o qual tem a maior população negra do país e também é considerado estatisticamente o ente federativo mais violento. Ele criticou, inclusive, a governança daquele estado, que pertence ao seu partido. “São números incríveis de assassinatos. Mas o espírito não se impressiona com aquilo que é incrível, mas sim com aquilo que é crível”, fazendo referência ao fato de que aquilo que não se vê, logo não existe e por isso seria ignorado pelas autoridades públicas. 

Durante a audiência, houve emoção com a fala de Isabel Oliveira Caldas, professora e vítima de racismo em um supermercado de Curitiba, no mês de abril, e que ganhou repercussão nacional. Na ocasião, ela foi seguida por um segurança por mais de meia hora, dentro do estabelecimento. Como forma de protesto, e de mostrar que não oferecia “perigo”, ficou de calcinha e sutiã. “Por acaso eu sou uma ameaça? O que me torna uma pessoa suspeita transitando pelas gôndolas de um supermercado? Não quero jamais ter que orientar o meu filho a erguer as mãos e não correr. Nem impedi-lo de carregar um guarda-chuva, para não ser visto como uma ameaça”, reiterou. 

Participações

Também participaram do debate o promotor Rafael Moura, do Ministério Público do Paraná; a professora doutora do Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros da UFPR, Megg Rayara; o coordenador de Projetos na Assessoria Parlamentar do Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania, Rafael Oliveira; a assessora de Igualdade Racial da Prefeitura de Curitiba, Marli Teixeira, e do presidente da Associação Comercial do Paraná (ACP), Antonio Gilberto Deggerone. Estiveram presentes os vereadores Professora Josete (PT) e Herivelto Oliveira (Cidadania).

Todas as fotos da audiência pública podem ser conferidas no Flickr da Câmara Municipal.