Na Tribuna Livre, cientista do INPE aborda impacto das mudanças climáticas
Cientista do INPE, Paulo Nobre esteve na Câmara de Curitiba para falar sobre mudanças climáticas e meio ambiente. (Fotos: Carlos Costa/CMC)
Na Tribuna Livre dessa quarta-feira (5), a Câmara Municipal de Curitiba recebeu a visita do cientista Paulo Nobre, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE). O convite foi feito pelo vereador Marcelo Fachinello (PSC), presidente da Casa. O vereador destacou que Nobre tem graduação em Meteorologia pela Universidade de São paulo (USP) e mestrado pelo INPE, entidade na qual atua como coordenador da Rede de Pesquisas em Mudanças Climáticas Globais.
Fachinello salientou que Paulo Nobre foi convidado pela cidade de Curitiba para dirigir um grupo de trabalho com o objetivo de pensar ações a médio e longo prazo. “No mês de março, durante a Semana do Meio Ambiente, Paulo Nobre esteve em Curitiba conversando com o prefeito Rafael Greca e com Marilsa Dias, titular da Secretaria Municipal do Meio Ambiente (SMMA), sobre as formas de planejamento e de prevenção no que diz respeito aos problemas climáticos, haja vista o impacto direto que esses fenômenos exercem na vida das pessoas. Daí a importância da sua presença na Tribuna Livre”, afirmou o presidente da Câmara.
A Tribuna Livre é o espaço reservado durante as sessões ordinárias realizadas pela Câmara Municipal de Curitiba todas as quartas-feiras, no qual vereadores convidam especialistas em áreas diversas para informar e para esclarecer sobre temas pertinentes ao bem-estar da população de Curitiba.
>> Assista, no canal da Câmara no YouTube, a íntegra da participação do cientista Paulo Nobre.
Para Paulo Nobre, o enfrentamento dos problemas climáticos passa necessariamente pela discussão do legado que será deixado para as gerações futuras. “Essa discussão demanda sabedoria, coragem e perseverança. O tema das mudanças climáticas não foi tratado de forma apropriada no passado, mas o momento agora é de enfrentamento destas questões”, disse o cientista. De acordo com ele, houve um longo período de estabilidade climática que se encerrou e agora a realidade é a das fortes chuvas que provocam enchentes e desabamentos ou das secas que se prolongam por meses. Nobre explicou que os processos indutores de mudanças planetárias são de três ordens: ação humana, mudanças climáticas e mudanças ambientais.
“A cada hora, nascem 8 mil pessoas no planeta, 4 milhões de toneladas de CO2 são emitidas, 1,5 mil hectares de florestas são devastados e três espécies entram em extinção. E tudo está interligado! Vejam, por exemplo, o recente aumento da morte dos sapos em São paulo, acarretou um aumento do número de casos de febre amarela”, disse o metereologista. Ele citou algumas soluções: entender as causas e os impactos; mitigar as causas e adaptar-se à realidade; e restaurar serviços ecossistêmicos perdidos.
Para Paulo Nobre, uma transformação grande e multissetorial demanda capacidade adaptativa, cooperação, confiança, inovação e comunicação. Muitas cidades não conseguiram lidar com esses problemas, de acordo com ele, pois enfrentaram problemas como falta de memória e perpetuação de maus hábitos, falta de soluções, capacidade limitada de financiamentos, falta de cooperação entre os atores e resistência social às mudanças. “É necessário”, enfatizou o pesquisador, “ressignificar o papel das árvores no espaço urbano. Uma das sugestões que faremos à Secretaria do Meio Ambiente de Curitiba será o mapeamento de todas as árvores de Curitiba por meio de inteligência artificial, satélite e drones”, disse ele.
Pirâmide Solar
O vereador Bruno Pessuti (Pode) destacou que Curitiba é uma cidade inovadora, porque foi a primeira a gerar energia a partir de uma queda d’água em um parque, dando um exemplo de geração de energia renovável. “E, agora, a Pirâmide Solar do Caximba, que já está gerando 30% de toda a energia consumida em prédios públicos municipais. Sugeri ao presidente da Câmara que a Casa adote o uso de carros elétricos”, disse o parlamentar que perguntou quais outras formas o município poderia colaborar com a manutenção do meio ambiente. Paulo Nobre disse que a resposta está na conscientização, na educação das crianças “A proximidade das crianças com a natureza é nosso dever”, disse o pesquisador.
Professora Josete (PT) lembrou que a Amazônia é equivocadamente conhecida como o “pulmão do mundo”, mas, de acordo com ela, já ficou comprovado que essa função é exercida pelas algas que habitam os oceanos. Para ela, o cuidado com a região da Amazônia pode prevenir novas catástrofes. Paulo Nobre concordou e disse que o destaque do Brasil na agricultura se deve justamente à Amazônia, cuja localização favorece a regulação das chuvas em diversas regiões do país. Amália Tortato (Novo) questionou sobre o reaproveitamento energético de resíduos sólidos e sobre o uso em São Paulo de plantas nas paredes dos viadutos.
Paulo Nobre se lembrou da antiga campanha publicitária veiculada nos anos 90 com os personagens da Família Folha ensinando a população a separar o lixo orgânico do não-orgânico. “O ideal”, afirmou o pesquisador, “seria as pessoas usarem pequenos trituradores de material orgânico em suas casas”. Sobre as “paredes verdes”, ele concordou com o fato de que elas produzem essencialmente um apelo emocional na população. “Mas, não só isso: elas respiram e fazem com que a cidade seja também para pessoas e não só para veículos”, disse Nobre.
Rodrigo Reis (União) perguntou sobre o paradoxo de preservar as árvores e, ao mesmo tempo, alimentar as 8 mil pessoas que, de acordo com Paulo Nobre, nascem por hora no planeta. O vereador também questionou sobre a relação entre as recentes inundações e a chamada “Zona de Convergência”, que abrange a cidade de Curitiba. Paulo Nobre concorda que a produção de alimento é fundamental, mas lembrou que o alimento que consumimos não vem dos grandes plantios do cerrado e, sim, do cinturão verde que circunda as grandes cidades e capitais do país.
Para o cientista, seria desejável uma política pública de estímulo ao cinturão verde, baseada num sistema inclusivo, distributivo de renda e que possa gerar segurança alimentar. “Estudos produzidos pelo próprio agronegócio já demonstraram que uma diminuição da Amazônia pode diminuir as chuvas no cerrado” Quanto à Zona de Convergência, Paulo Nobre explicou que se trata da umidade que vem da Amazônia, um fenômeno de difícil previsão que modula as chuvas no sudeste e no sul. “O problema de um planeta mais quente é o desequilíbrio, porque vai haver novas massas de ar polar que podem afetar as zonas de convergência, causando mais secas e enchentes. A melhor maneira de tratar isso é restituirmos os serviços florestais nas cidades por meio do reflorestamento”, respondeu o cientista.
Curitiba Mais Energia
Tico Kuzma (PSD), atual líder da prefeitura na Casa, elencou algumas ações realizadas nos últimos tempos, no âmbito do meio ambiente. “Dentro do Programa Curitiba Mais Energia temos a Pirâmide Solar com mais de 8 mil painéis fotovoltaicos que, somados aos painéis que estão no Palácio 29 de Março, no parque Barigui e no Jardim Botânico, representam 30% da energia dos nossos prédios públicos. Uma economia de R$ 2,6 milhões. E a ideia é chegar a 50% com a implantação dessa tecnologia nos terminais de ônibus”, afirmou o vereador. Paulo Nobre entende que a Pirâmide Solar foi um marco, mas lançou um desafio: todos os telhados de Curitiba dotados de recursos de captação de energia solar. “Seria uma cidade inapagável”, afirmou Nobre.
Sidnei Toaldo (Patriota) perguntou qual a importância da vontade política no combate ao aquecimento global e se há algum relatório trazendo perspectivas otimistas sobre a natureza. Para Paulo Nobre, o momento é favorável. “Entre 2021 e 2022, o Painel Intergovernamental das Alterações Climáticas (IPCC em inglês) apresentou três relatórios do seu sexto ciclo de avaliação (AR6). Nele, todos os representantes dos países envolvidos assinaram um ‘mea culpa’ sobre a responsabilidade antrópica das mudanças climáticas. Eles também concordam que mudanças comportamentais em relação ao meio ambiente são necessárias, sempre buscando um alinhamento político e econômico”, disse Nobre.
O vereador Mauro Bobato (Pode) exaltou a presença do convidado, realçando a importância do tema e lembrando que o bairro do Umbará, onde nasceu e reside, possivelmente tem um dos maiores índices de área verde por habitante da cidade. João da 5 Irmãos (União) comentou que apresentou um projeto na Câmara visando à criação da Semana de Conscientização sobre Mudanças Climáticas, mas a proposta foi arquivada. Ele perguntou sobre outras formas de contribuição por parte do cidadão comum, além da reciclagem e do plantio de árvores. Paulo Nobre respondeu que o plantio de árvores é o maior investimento para as futuras gerações. “É uma prática que vai proporcionar resultados daqui a 5, 10 e até 20 anos. Da mesma forma, a separação de lixo, que gera a economia circular”, disse o meteorologista.
PSA
Nori Seto (PP) disse que, em 2022, seu mandato destinou uma emenda parlamentar por meio da Secretaria Municipal do Meio Ambiente para fazer uma parceria com a Sociedade de Pesquisa em Vida selvagem (SPVS), com o intuito de desenvolver um estudo sobre a regulamentação dos pagamento sobre serviços ambientais (PSA) no município. “Eles fizeram o estudo e protocolaram uma minuta de legislação municipal. O senhor acredita que o PSA é uma prática que pode contribuir de forma efetiva com a preservação ambiental e a prevenção de mudanças climáticas?”, indagou o vereador.
De acordo com Paulo Nobre, o pagamento sobre serviços ambientais já é uma prática adotada na bacia de captação de água da represa de Guarapiranga, em São Paulo. “As pessoas que têm propriedades na bacia de captação recebem um valor anual pra manter suas áreas. A qualidade da água é mantida. É mais barata a conta de receber uma água limpa do que receber água de um terreno antropizado que vai precisar ser tratada. Além da segurança hídrica que essas áreas florestadas permitem”, comentou o pesquisador.
A vereadora Maria Letícia (PV), presidente da Comissão de Meio Ambiente da Câmara, ressaltou o fato de que Curitiba sempre teve uma preocupação com a natureza. “É uma cidade com 64% de área verde por habitante, o que é maravilhoso. Por outro lado, Curitiba tem oito carros para cada dez habitantes. A mobilidade é restrita ao BRT, ciclovias são poucas e, para além disso, apesar do retorno da Família Folha, a separação do nosso lixo sofre bastante dificuldade”, disse ela. Paulo Nobre acredita que uma das respostas é ressignificar o trabalho dos catadores. “Eles são heróis da nossa sociedade. Devemos investir na aplicação de tecnologias que façam essa reciclagem e essas pessoas possam contribuir de forma mais efetiva ainda para a construção de uma nova Curitiba”, afirmou Nobre.
Serginho do Posto (União) perguntou como o pesquisador tem visto a aplicação das leis aprovadas em âmbito federal, estadual e municipal, que conferiram às empresas a responsabilidade sobre a logística reversa. Paulo Nobre revelou que já foi detectado nanoplástico no leite materno e também se verificou a presença desses materiais no cérebro humano. “O nanoplástico, em atuação no interior de um organismo, vai atuar nas células que envolvem a reprodução”, disse ele. Para ele, a logística reversa pode ser um mecanismo eficaz na preservação do meio ambiente. O cientista citou, como exemplo, as rodovias construídas com asfalto emborrachado. “Mais leis que criem incentivos para que as empresas adotem o uso desses materiais seriam bem-vindas”, finalizou.
>> Confira o álbum de fotos desta Tribuna Livre clicando na imagem abaixo:
*Notícia revisada pelo estudante de Letras Brunno Abati
Supervisão do estágio: Alex Gruba
Reprodução do texto autorizada mediante citação da Câmara Municipal de Curitiba