Amizade Social: campanha da Igreja Católica é apresentada na Tribuna Livre
“Transformamos quem pensa diferente ou divergente em um inimigo e em seguida justificamos esta diferença como algo para que se cometa uma tentativa para eliminá-lo”, disse o bispo auxiliar. (Foto: Rodrigo Fonseca/CMC)
Mais uma edição da Campanha da Fraternidade foi apresentada na Câmara Municipal de Curitiba (CMC), nesta quarta-feira (3). O balanço da ação, promovida em todo o país pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), foi apresentado aos vereadores e vereadoras da cidade pelo bispo auxiliar da Arquidiocese de Curitiba, Reginei José Modolo. O tema de 2024 da campanha foi “Fraternidade e Amizade Social”.
O representante da Igreja Católica de Curitiba esteve em plenário, no espaço da Tribuna Livre, para falar da campanha de 2024 a convite da vereadora Professora Josete (PT). A Campanha da Fraternidade coincide com o período da quaresma — ou seja, começou na Quarta-Feira de Cinzas e foi até a manhã da Quinta-Feira Santa. Cada ano são trabalhados, nacionalmente, diferentes temas e lemas. Conforme a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), a iniciativa surgiu em 1962 na cidade de Nísia Floresta, Arquidiocese de Natal, no Rio Grande do Norte (RN).
O lema de 2024 foi "Vós sois todos irmãos e irmãs" (Mt 23,8). “O tema da amizade social nos convida a refletir sobre as causas dos conflitos, da hostilidade nas relações humanas e da agressividade interpessoal. Onde não há a experiência da amizade, pode haver não somente a indiferença, mas também a violência. São dois graves males”, acrescenta a proposição que agendou a participação do bispo (076.00005.2024).
“A campanha é uma ação evangelizadora da Igreja do Brasil. Não é uma ação desta ou daquela pastoral, desta ou daquela comunidade, paróquia ou diocese, mas de toda a Igreja Católica Apostólica Romana”, disse a vereadora. Josete explicou que, através dela, a Igreja buscou um caminho quaresmal em três perspectivas: ver as situações de inimizade que geram divisões, violência e que destroem a dignidade das pessoas; deixar que o Evangelho resgate o sentido das relações humanas baseado no respeito e na reciprocidade do bem comum; e agir no esforço para transformações comunitárias e sociais, em busca de uma sociedade amiga, justa, fraterna e solidária.
“Sempre, dois anos antes do lançamento do tema, a CNBB já define qual será o tema da campanha da fraternidade. O projeto da Igreja Católica, no Brasil, responde a convites da própria sociedade, de ambientes eclesiais, e do próprio Papa, o que foi o caso desta campanha”, explicou o bispo auxiliar, também conhecido como Padre Zico. “Deus, nosso criador, nos ensina que a fraternidade é decorrente de uma condição da nossa própria natureza. É uma realidade ontológica. Nós somos em Deus, sendo Deus pai […], nós somos todos irmãos”, completou o sacerdote.
O convidado usou como exemplo a história de Caim e Abel, chamada de “Drama do pecado”, quando o primeiro irmão, tomado pela inveja, matou o segundo. “Caim mente para si e para Deus, levanta sua mão e o assassina. Quando perguntado por Deus ‘onde está o teu irmão?’, Caim responde ‘acaso sou guarda do meu irmão?’. […] Deus responde ‘sim, o outro é o meu irmão, sou guarda do meu irmão e todos somos responsáveis uns pelos outros’”, relatou.
“A problemática que se vê é que transformamos quem pensa diferente ou divergente em um inimigo e em seguida justificamos esta diferença como algo para que se cometa uma tentativa para eliminá-lo, de diferentes formas [calúnia, difamação, perseguição, aumento das guerras, da violência, do ódio]. A perspetiva não é a da amizade, mas da inimizade”, continuou Padre Zico. Para o bispo auxiliar, a banalidade do mal é tão presente, e tão dentro das pessoas, que o outro, o inimigo, deve ser eliminado para dar segurança.
A amizade social, tema da campanha, foi inspirada na encíclica do Papa Francisco, “Fratelli Tutti”, e significa o amor que ultrapassa as barreiras da geografia e do espaço; uma fraternidade aberta, que permite reconhecer, valorizar e amar todas as pessoas, independente da sua proximidade física. Um dos objetivos da ação de 2024, continuou o bispo Reginei José Modolo, é compreender as principais causas da atual mentalidade de oposição e conflito, da violência, do olhar que identifica o outro como um inimigo, e não como um amigo, um irmão.
Campanha da Fraternidade repercute no plenário
“Alargar a tenda social”. Para o bispo auxiliar, a Campanha da Fraternidade 2024 pode ter diferentes desdobramentos e “frutos” que podem ser partilhados pela Câmara Municipal: valorizar o voluntariado e o serviço comunitário; implementar e popularizar a justiça restaurativa, um amplo projeto junto às pessoas em situação de rua; a promoção da discussão de grandes temas do momento, como a migração e o preconceito; e orientação para a busca do bem comum e reconstrução da ordem política e social.
“O maior voluntário, como todos já sabem, foi Jesus Cristo. Mas nós, como cristãos, independente de religião, também podemos fazer a nossa parte”, disse Oscalino do Povo (PP), ao sugerir que a Igreja Católica adote uma campanha de incentivo para que seus membros adotem o voluntariado, oferecendo suas expertises para ajudar o próximo. Além do vereador, que é declaradamente católico, outros parlamentares também participaram do debate, com comentários e sugestões baseadas no tema da campanha.
“Fico encantando porque, em poucas palavras, em pouco tempo, o Padre Zico chamou a atenção de nós parlamentares, nós servidores públicos, referente a dois assuntos dos mais importantes que temos que ter atenção na nossa cidade: a população em situação de rua e a migração. No dia a dia, às vezes a gente acaba não identificando o tamanho da importância disso na nossa rotina. Quero agradecer e dizer que suas palavras, sem dúvida, abriram um pouco mais a minha visão para que eu possa colaborar [para melhorar as políticas públicas] junto com meus pares”, afirmou Alexandre Leprevost (Solidariedade).
Marcos Vieira (PDT) também fez sua análise sobre o tema da campanha: “como ele cai muito bem para este momento em que vivemos, um momento muito difícil, que muitas vezes a gente não vê saída […]. Deveríamos estar somando forças para promover o bem, mas é visível, até nas redes sociais, parece que quem mais cresce é quem mais destrói o próximo”. Também católico, o vereador Tico Kuzma (PSD) argumentou que é difícil transmitir a palavra de que quem pensa diferente não é inimigo, tanto dentro quanto fora do Parlamento, e muito disso se deve à polarização. Sobre a justiça restaurativa, ele relatou que a Prefeitura de Curitiba já realizou dois mutirões com foco neste atendimento à população em situação de rua.
Professor Euler (MDB) se ofereceu para levar um programa de voluntariado ao conhecimento da Arquidiocese de Curitiba, com foco nos universitários. Também participaram do debate os vereadores Angelo Vanhoni (PT), Mauro Bobato (PP) e Rodrigo Reis (sem partido).
O que é a Tribuna Livre da Câmara de Curitiba?
A Tribuna Livre é o canal de interlocução entre a sociedade e os vereadores de Curitiba. Os temas são de livre escolha, sugeridos pelos próprios parlamentares. As falas servem, por exemplo, para a prestação de contas e a apresentação de uma campanha de conscientização. Conforme o Regimento Interno (RI) do Legislativo, as Tribunas Livres ocorrem nas quartas-feiras, durante a sessão plenária, após o espaço do pequeno expediente.
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