Ativista pede inclusão de pessoas com Down no mercado de trabalho
“As pessoas com Down têm as suas limitações, mas elas também têm as suas capacidades”, disse a vice-presidente da Federação Paranaense de Associações de Síndrome de Down. (Foto: Rodrigo Fonseca/CMC)
Com o tema “Chega de estereótipos, abaixo o capacitismo”, o Dia Internacional da Síndrome de Down foi abordado na Tribuna Livre da Câmara Municipal de Curitiba (CMC) desta quarta-feira (20). A data, celebrada todos os anos no dia 21 de março, é reconhecida internacionalmente pela ONU (Organização das Nações Unidas). Em plenário, a vice-presidente da Federação Paranaense de Associações de Síndrome de Down (FEPASD), Marlene Dias Carvalho, pediu mais apoio dos vereadores e vereadoras na inclusão das pessoas com Down no mercado de trabalho.
A Tribuna Livre é um espaço democrático de debates da instituição do Legislativo. Ativista, Marilene Carvalho é mãe de uma moça com síndrome de Down, Mayara Dias Carvalho, e esteve na CMC a convite do vereador Pier Petruzziello (PP), que defende a necessidade da conscientização da sociedade “sobre os desafios enfrentados pelas entidades e famílias que tenham pessoas com a síndrome de Down” (076.00003.2024).
A síndrome de Down é causada pela presença de três cromossomos 21 em todas ou na maior parte das células da pessoa. Esse desequilíbrio acontece na hora da concepção de um bebê. Pessoas com Down têm 47 cromossomos em suas células em vez de 46, como a maior parte da população. A síndrome de Down não é uma doença, mas uma condição da pessoa associada a algumas questões para as quais os pais devem estar atentos desde o nascimento da criança.
Algumas das características associadas à trissomia do 21 (síndrome de Down) são olhos amendoados, maior propensão ao desenvolvimento de algumas doenças e hipotonia muscular. Em geral, as crianças com síndrome de Down são menores em tamanho e seu desenvolvimento físico, mental e intelectual pode ser mais lento do que o de outras crianças da sua idade. As pessoas com Down são mais vulneráveis a uma maior incidência de algumas doenças, como cardiopatias e problemas respiratórios.
O Dia Internacional da Síndrome de Down foi instituído em 2006 pela Down Syndrome International e reconhecido, seis anos depois, pela Organização das Nações Unidas (ONU). A data escolhida, 21 de março, remete à trissomia (triplicação) no cromossomo 21. Em Curitiba, por iniciativa do próprio vereador, Pier Petruzziello, foi instituída, em 2023 a Política Municipal de Proteção aos Direitos da Pessoa com Síndrome de Down (lei municipal 16.150/2023).
“Há um ano, demos esse importante passo. Aproveito para agradecer aos colegas que votaram a favor e nos permitiram consolidar os direitos dessas pessoas em nossa cidade. A luta apenas começou, para chamar atenção para o papel que as pessoas com síndrome de Down tem na sociedade. […] Estamos aqui buscando a quebra de preconceitos e a diminuição de barreiras que impeçam ou dificultem o acesso dessas pessoas e de suas famílias aos seus direitos”, disse o parlamentar.
Luta pela inclusão é permanente, defende ativista
Marlene Carvalho afirmou que a atuação da Federação Paranaense de Associações de Síndrome de Down (Fepasd) é contínua: “Há muito tempo, estamos lutando por visibilidade às pessoas com síndrome de Down”. Desde 2014, o trabalho da instituição é pela inclusão digna delas no mercado de trabalho, que até então eram só contratadas com empacotadoras de mercadorias. “Se existe dificuldade, são as [demais] pessoas, é o ambiente que não dá as condições objetivas para que a pessoa com deficiência mostre sua capacidade, sua disponibilidade, seu bem-querer para o trabalho”, afirmou.
A vice-presidente da federação recordou que, em 2022, esteve nesta mesma Tribuna Livre para pedir apoio dos vereadores e vereadoras para a abertura de vagas para pessoas com Down na estrutura da Câmara. E lamentou que, apesar de ter tido sua solicitação atendida – foram abertas quatro vagas –, as dificuldades continuaram existindo. Ela exemplificou o caso de uma jovem que já tinha trabalhado em outras empresas que, quando assumiu uma vaga no Legislativo, “ficou sentada o dia todo”. “A gente não tá pedindo cargo para ninguém, a gente quer vagas de trabalho. Às vezes a pessoa fica com medo [de abrir a vaga].”
“As pessoas com síndrome de Down têm as suas limitações, mas elas também têm as suas capacidades”, disse a convidada, ao contar que dois jovens foram contratados na Assembleia Legislativa do Paraná (Alep). “Por isso, a gente tem aquele profissional de apoio, que tem a competência para ajudar na inclusão”, orientou. “Cada um de vocês, que foi eleito pelo povo curitibano, ajude a acabar com as barreiras aqui na Câmara e a preencher estas quatro vagas para pessoas com síndrome de Down. Nós temos duas pessoas na Assembleia e eles têm produtividade”, solicitou Marilene Carvalho, ao colocar a Fepasd à disposição da Câmara Municipal para ajudar na inserção dos jovens com Down no quadro de pessoal.
Marilene Carvalho ainda repercutiu denúncias recebidas pela entidade sobre a falta de inclusão nas escolas regulares e de abuso sexual dentro das instituições de ensino. Segundo ela, os pais reclamam que as instituições de ensino regular não querem incluir os alunos com Down, orientando-os a levar as crianças para as escolas especiais. E há casos em que estudantes que têm a síndrome têm sido abusados por outros alunos, dentro das escolas. “Isso é muito doloroso para os pais. Estejamos sempre atentos a essas questões. Tem um jovem em uma escola particular aqui, que dizem que é muito boa, onde os colegas abusaram sexualmente dele [no banheiro]”, relatou.
Jovem de 39 anos com Down dá seu depoimento
Além da participação da vice-presidente da Fepasd, a autodefensora Sayane Tomé Leite também falou sobre a importância da inclusão. Com 39 anos, ela tem Down e contou que sua família sempre a ajudou com estímulos, o que contribuiu com seu desenvolvimento.Seu primeiro emprego foi aos 18 anos, em um supermercado, onde ficou por dois anos. “Ia sozinha de ônibus”, relembrou.
Foi contratada pela empresa Furukawa em 2014, onde atua como auxiliar administrativo até hoje. “Vou ao trabalho sozinha e pego três ônibus, adoro meu trabalho e meus colegas. Quero ficar lá até aposentar. A empresa fez a diferença na minha vida, pois entendeu que tenho limitações e afastou todas as barreiras que poderiam me afastar do trabalho. [A empresa] descobriu minhas competências e nunca me deixou sem nada. Tenho sempre um trabalho para desenvolver e isso me dá muito prazer e felicidade.”
Sayane Leite relatou que, apesar da síndrome, leva uma vida normal. “Faço aula de dança do ventre, jogo golfe, gosto de surfar. Tudo é pago com meu salário. Já tive namorados, mas no momento estou solteira, sonhando, como todas as outras moças, com meu príncipe encantado. […] Como podem ver, a minha história não é diferente. É exatamente igual a de outras mulheres, não importando se tenho ou não um cromossomo a mais”, finalizou.
A história da auxiliar administrativa e a demanda da Federação Paranaense de Associações de Síndrome de Down foram ressaltadas pelos parlamentares. Leonidas Dias (Solidariedade) parabenizou a atuação da Fepasd, completando que a relação de Sayane Leite com a empresa que a contratou deve servir de exemplo para os gabinetes parlamentares e para a gestão de recursos humanos da Câmara Municipal.
“Temos que avançar, sabemos que é um processo. Nosso país, via leis, entende que é um direito da pessoa com deficiência, ampliando os serviços. Mas o debate deve ser de forma contínua”, ressaltou Serginho do Posto (sem partido). Também na mesma linha, João das 5 Irmãos (sem partido) lembrou que, em Piraquara, neste mês, promoveu a Semana Municipal de Orientação sobre a Síndrome de Down: “É um exemplo que todas as cidades podem seguir. Quando a gente traz informações, quando a gente fala de um assunto, tende a crescer o debate e ter mais holofotes.”
Para Pier Petruzziello, a sociedade precisar enxergar o Down como algo absolutamente intrínseco na cidade, sem exclusão. “Aqui, cada um tem um tipo de trabalho. […] E quando se traz essa necessidade, isso mexe com o ecossistema da Câmara, com o coração de cada um. […] É um trabalho que todos nós temos condições de fazer juntos. Que a gente volte a sugerir que o presidente [Marcelo] Fachinello para que ele possa chamar de volta essas pessoas [com Síndrome de Down] e preparar a Câmara melhor para recebê-las”, finalizou.
Utilidade Pública Municipal tramita na Câmara
Tramita na Câmara Municipal o projeto de lei que declara de Utilidade Pública Municipal a Federação Paranaense de Associações de Síndrome de Down (014.00050.2023). A proposta é de iniciativa de Pier e é analisado na casa desde outubro de 2023. Atualmente, o texto está no gabinete do vereador para adequações técnicas, solicitadas pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) em parecer pela devolução ao autor, aprovado no dia 12 de março.
O que é a Tribuna Livre da Câmara de Curitiba?
A Tribuna Livre é o canal de interlocução entre a sociedade e os vereadores de Curitiba. Os temas são de livre escolha, sugeridos pelos próprios parlamentares. As falas servem, por exemplo, para a prestação de contas e a apresentação de uma campanha de conscientização. Conforme o Regimento Interno (RI) do Legislativo, as Tribunas Livres ocorrem nas quartas-feiras, durante a sessão plenária, após o espaço do pequeno expediente.
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