Em 2º turno, rejeitada homenagem ao tenente-coronel Pedro Gunha
Na votação de hoje, Zezinho Sabará não conseguiu apoio da maioria simples dos vereadores. Apenas 12 dos 38 parlamentares votaram favoravelmente. (Foto: Rodrigo Fonseca/CMC)
A Câmara Municipal de Curitiba (CMC) mudou de ideia em relação à proposta de lei que concedia o título de Vulto Emérito da capital ao tenente-coronel da Polícia Militar Pedro Gunha. Aprovada ontem (12), em primeiro turno, com 18 votos favoráveis, 13 contrários e 1 abstenção, nesta terça-feira (13) a iniciativa recebeu 14 votos “não”, 12 “sim” e 8 abstenções em segunda votação. Com o resultado, a matéria foi rejeitada pela maioria simples da Casa e será arquivada. O debate, com manifestações desfavoráveis à homenagem, aconteceu já na prorrogação da sessão plenária, após a análise do veto parcial à proposta que reconhece a educação como atividade essencial na cidade.
Instituído em 1963 pela lei municipal 2.255/1963 (já revogada) e hoje regulamentado pela lei complementar 109/2018, o título de Vulto Emérito é concedido a pessoas nascidas em Curitiba. Conforme a regulamentação, a honraria deverá ser indicada aqueles ou aquelas que tenham “reputação ilibada e de conduta pessoal e profissional irrepreensíveis que tenham contribuído para o desenvolvimento do Município de Curitiba na prática de fatos concretos em benefício da comunidade”. Na votação em primeiro turno, o autor do projeto (007.00003.2020), Zezinho Sabará (DEM) destacou a atuação do homenageado como administrador da Regional Portão, entre 1993 e 1996; como diretor da Secretaria Municipal de Administração, entre 1997 e 2000; e como assessor na criação da Secretaria Municipal da Defesa Social, entre 2001 e 2003.
O currículo do tenente-coronel, no entanto, não justifica sua indicação para Vulto Emérito de Curitiba, conforme observou Professora Josete (PT). Contrária à proposta em ambas as votações, ela frisou que, mesmo não conhecendo pessoalmente Pedro Gunha e não ter “nenhuma questão pessoal contra ele”, no seu entendimento, o título “deve ser concedido a pessoas que têm postura ética, correta, que são respeitosas em relação a outras pessoas”, o que não seria o caso. “Independente da posição política, ele tem postura desrespeitosa a homens e mulheres, de direita ou de esquerda, que eventualmente não pensem exatamente como ele pensa”, afirmou.
Segundo Josete, em suas publicações nas redes sociais, Pedro Gunha tem comportamento “misógino, de ódio às mulheres”. Como exemplos, a vereadora citou postagem feita pelo tenente-coronel em que ele se referiu à jornalista Miriam Leitão como “demônio” e “feia” e o compartilhamento de publicação de terceiros em que a apresentadora e também jornalista Fátima Bernardes é chamada de “vaca”. “Não é um debate ideológico, é uma leitura da postura desrespeitosa e misógina. Já começa chamando uma mulher de demônio, qualificando como feia. E o feio para mulher é utilizado como uma forma para desqualificá-la, independente da sua inteligência ou competência. E ele também reproduziu postagens em relação à Fátima Bernardes, chamando ela de ‘vaca’. A reprodução desse tipo de posicionamento é bastante recorrente, em diversos momentos ele qualifica diversas mulheres como ‘vacas’”, completou.
Em apoio à fala vereadora, Renato Freitas (PT) afirmou que, pelo Vulto Emérito ser o “título honorífico da cidade de Curitiba, dado a pessoas que contribuem de alguma forma para a edificação da cidade ou melhora da qualidade de vida das pessoas”, o indicado por Zezinho Sabará não merece a homenagem por ser uma pessoa “que reproduz, em grande escala, falsas notícias em suas redes sociais”. Outro motivo do vereador para rejeitar o projeto de lei tanto em primeiro turno quanto na votação desta terça, é o comportamento “odioso” de Pedro Gunha que, nas redes sociais, teria se referido ao ex-ministro da Cultura, Gilberto Gil, “como ‘aquele beiçudo’ e outras coisas que não cabe a mim, não tenho estômago, para reproduzir, tentando diminuir uma pessoa por conta de suas características [físicas], de pessoa negra.” “Uma pessoa dessa ganhar um título honorífico desta Câmara? É um absurdo. A prática do racismo, de pessoas racistas, ser homenageada por esta Câmara?”, questionou.
Reiterando ter sido contra o projeto no primeiro turno porque “já tinha conhecimento das informações que Josete trouxe à publico”, Amália Tortato (Novo) disse que não se sente à vontade para conceder um título como esse para “uma pessoa que faz postagens que considero raivosas em suas redes sociais”. “Palavras que tenham a intenção de diminuir outra pessoa por conta da cor de sua pele ou características físicas, não são quaisquer palavras, não é qualquer coisa, isso é racismo, e racismo é crime.” Na sua opinião, propostas de lei desta importância deveriam ser aprovadas por pelo menos dois terços do Legislativo, e não pela maioria simples de votos. “O projeto recebeu apenas 18 votos favoráveis em primeiro turno, que não é nem metade dos vereadores”, completou, sugerindo que a ideia seja debatida na revisão do Regimento Interno do Legislativo.
Para Dalton Borba (PDT), as informações a que teve acesso a respeito do comportamento do tenente-coronel, “públicas e de alcance a qualquer cidadão”, dão conta de que “Pedro Gunha não é uma pessoa que profere apenas palavras ofensivas, apenas palavras ao vento”. “Tratam-se de violação de preceitos constitucionais: racismo, discriminação [de gênero]. São coisas gravíssimas. Para além disso, não posso homenagear pessoas que são flagrantemente antidemocráticas: quando atacam a mídia, por exercer seu papel de informação; por atacar instituições, como o Supremo Tribunal Federal. A forma mais tradicional de se impor uma ditadura é derrubar as instituições democráticas e não posso concordar com isso”, atestou.
"A pessoa fala o que acha correto"
Agradecendo os votos favoráveis à iniciativa, Zezinho Sabará respondeu que conhece Pedro Gunha há mais de 30 anos, sabe de suas qualidades e que, assim como ele, todos têm defeitos. “A pessoa fala o que acha correto. Não são pequenas palavras que vão desqualificar as pessoas. Se pequenas palavras, pequenas coisas forem desqualificar não seríamos merecedores de nada. Atire a primeira pedra quem não tem defeito. Se fôssemos atirar a pedra, atiraríamos em nós mesmos”, disse, ao defender a “prestação de serviços, idoneidade, princípios e religiosidade” do tenente-coronel.
Para o vereador, o título era “muito merecido sim”, porque seu homenageado desenvolve um “trabalho sério, correto e honesto”. “Se formos olhar os defeitos, ninguém de nós seria merecedor de qualquer homenagem, qualquer título, até de estar aqui na Câmara Municipal. Se fossemos olhar defeitos até de vereadores que estão falando, não poderíamos estar na CMC, pois todos têm defeitos, modos de pensar, modos de agir”, finalizou.
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