Em 1º turno, aprovada proibição de tatuagens e piercings em animais
Durante a discussão do projeto, Osias Moraes (Republicanos) exibiu em plenário fotos de animais com tatuagens, prática que tem crescido mundo afora. (Foto: Carlos Costa/CMC)
A Câmara Municipal de Curitiba (CMC) aprovou em primeiro turno, nesta terça-feira (5), o projeto de lei que proíbe, na capital paranaense, a realização de tatuagens ou aplicação de piercings, com fins estéticos, em animais. A medida, no entanto, não foi acatada pela unanimidade dos vereadores e vereadoras: 29 deles foram favoráveis e 5 contrários – Amália Tortato (Novo), Indiara Barbosa (Novo), Marcelo Fachinello (PSC), Professora Josete (PT) e Renato Freitas (PT). O debate, que durou pouco mais de uma hora das três regimentais, foi transmitido ao vivo pelas redes sociais do Legislativo.
De iniciativa de Osias Moraes (Republicanos), a matéria não altera a lei municipal 13.908/2011, que estabelece sanções e penalidades administrativas para aqueles que praticarem maus-tratos aos animais, e sim propõe uma nova legislação, com penalidades específicas para os tutores que fizerem tatuagens ou aplicarem piercings em animais silvestres, domésticos ou domesticados com fins estéticos (005.00159.2021). Ao descumprir a regra, o infrator receberá uma multa de 5 salários mínimos – atualmente, R$ 5.500 – por tatoo ou piercieng colocado. A sanção será dobrada em caso de reincidência.
Conforme o texto, a penalidade fixada não exclui a aplicação de outras sanções de natureza penal, cível e administrativa previstas na legislação federal, estadual e municipal, “inclusive ao executor dos procedimentos”. A fiscalização da legislação e aplicação das sanções, completa a proposta de lei, ficarão a cargo dos órgãos competentes da administração pública.
Para propor a proibição, o vereador justificou que infligir dor e sofrimento a um animal é uma prática cruel, relacionada a maus-tratos e é proibida pela nossa Constituição Federal, podendo levar à prisão dos infratores, de acordo com o art. 32 da lei federal 9.605/1998, a Lei de Crimes Ambientais. Segundo Moraes, animais tatuados ou com piercings já são comuns no mundo e no Brasil “e Curitiba não está fora desta realidade”. O objetivo da norma é impedir com que essa “moda” chegue à capital.
Como exemplo, o autor compartilhou com vereadores e vereadoras o depoimento de um tatuador que denunciou uma situação ocorrida em Poços de Caldas (MG), em que um cachorro foi tatuado no rosto. No relato, o profissional citou a Lei de Crimes Ambientais e reforçou que mesmo em seres humanos, qualquer modificação no corpo deve ocorrer com consentimento, “o que não é possível no caso de um animal, domesticado ou não”. Osias Moraes também exibiu um vídeo em que a médica veterinária e residente técnica na Sedest (Secretaria de Estado do Desenvolvimento Sustentável e do Turismo), Daniela Tozetto defendeu a aprovação do projeto de lei.
“[Aplicar uma tatuagem ou um piercing é] submeter o animal a um risco, um sofrimento, uma mutilação, a um processo que ocasiona a dor, simplesmente para suprir o ego do proprietário do animal. É um procedimento totalmente desnecessário ao animal. Por mais que durante um procedimento ele seja anestesiado, seja sedado, a gente sabe que todo procedimento anestésico tem risco, o animal vai estar correndo um risco”, disse a veterinária. Ela orientou que há casos em que a tatuagem “tem justificativa técnica”, quando funciona como método de marcação e identificação dos animais, como em campanhas de castração. Mas se usada “simplesmente por uma questão estética é sim uma crueldade, é sim maus-tratos”.
Porque “sim” e porque “não”
Dos 38 parlamentares, 29 foram favoráveis à matéria e 5 votaram “não”. Dentre os que de posicionaram contra, 3 são integrantes da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) e também foram contrários ao parecer favorável do colegiado, aprovado em 24 de agosto. O argumento usado por esses vereadores para não aprovar o projeto de lei de Osias Moraes foi embasamento na técnica legislativa.
Autor de voto em separado na CCJ que pediu a devolução do texto ao gabinete parlamentar de Moraes, Marcelo Fachinello defendeu que propor uma nova lei ao invés de alterar a que está em vigor possibilita a criação de “um vácuo jurídico que pode, inclusive, dificultar a punição dos proprietários dos animais que sofrerem maus-tratos”. “As penalidades existentes na Lei de Maus-Tratos já existem e são maiores do que as punições estabelecidas no projeto. São multas de R$ 200 a R$ 200 mil. Criar um novo sistema de sanção por lei esparsa pode fazer com que os infratores aleguem que há uma punição dupla, argumentando pela penalidade mais branda [no caso, a prevista pela proposta]”, disse.
Renato Freitas, que integra a CCJ,também questionou a necessidade de uma nova lei, “quando já existe a lei municipal 13.908”, que define que os maus-tratos contra animais podem ser entendidos como “toda e qualquer ação decorrente de crueldade, abuso, imprudência, negligência, imperícia ou ato voluntário e intencional, que atente contra sua saúde e necessidades naturais, físicas e mentais, como por exemplo, o ato de mutilar animais”. Para o vereador, não há necessidade de se formular outra lei sobre uma temática já regulamentada. “As leis não são feitas para levantar um debate, mas de transformar a realidade, quando cumpridas. Se esta realidade já foi transformada a partir de lei municipal e federal, então é supérflua uma nova lei.”
Apesar de concordar com o mérito da proposta de lei, por defender a necessidade do aperfeiçoamento de legislações e de políticas públicas para combater os maus-tratos aos animais, Professora Josete explicou que foi contrária à norma porque já existe legislação que trata especificamente da questão. “Na própria CCJ, foi uma votação apertada, 5 a 4, porque realmente a técnica legislativa não foi cumprida e esta Casa tem que ser primar por isso”, analisou. Indiara Barbosa também justificou o voto contrário, corroborando com os argumentos levantados pelos três vereadores acima.
Contrário ao parecer pela tramitação na Comissão de Constituição de Justiça, Dalton Borba (PDT) também questionou a técnica legislativa, mas votou favoravelmente hoje, em plenário. “A tendência do Poder Judiciário no Brasil é garantir um lugar de sujeito e de direitos, cada dia mais, aos animais. A lei já existe e é geral e abstrata, não fala especificamente em tatuagens e piercings”, disse, para em seguida indagar ao autor, Osias Moraes, se não seria mais adequado alterar a lei em vigor, incluindo estas condutas como maus-tratos, “ao invés de criar uma lei autônoma? A fim de que não haja um conflito entre ambas as leis?”.
Osias Moraes respondeu que, neste momento, “por conta da excepcionalidade do assunto”, é necessário que Curitiba tenha uma lei direta a respeito destas condutas e que o projeto foi proposto com a colaboração de protetores de animais e médicos veterinários. “Pediram para que pudéssemos não deixar com que essa moda nacional e internacional chegasse até nossa capital.” Em apoio à matéria, Noemia Rocha (MDB) pediu que essa prática tão “maléfica” seja combatida e justificou que uma lei específica pode eliminar qualquer margem de interpretação jurídica.
“Votei sim por entender que a norma é necessária justamente para que nós pontuemos, de forma clara, que a tatuagem e o piercing significam, sim, maus-tratos”, reforçou Denian Couto (Pode), que é membro da Comissão de Constituição e Justiça e na ocasião foi um dos cinco integrantes favoráveis ao trâmite regimental do projeto. Ele justificou que ainda que “haja consenso da medicina veterinária” de que essas condutas são maus-tratos, “é possível sim que uma interpretação judicial seja no sentido contrário”. “Votei favoravelmente e passei por cima da técnica legislativa por entender que, amanhã ou depois, isso pode ser corrigido numa codificação, numa norma mais conjunta”, emendou o vereador.
Presidente da Comissão de Meio Ambiente, Desenvolvimento Sustentável e Assuntos Metropolitanos, Maria Leticia (PV) explicou que foi favorável ao projeto tanto no colegiado quanto em plenário por considerar que a prática de tatuagens e piercings é uma crueldade com os animais. Ela também citou que outras cidades brasileiras, como Niterói (RJ), já tem legislações semelhantes. Também participaram do debate os vereadores Alexandre Leprevost (Solidariedade), Eder Borges (PSD), Jornalista Márcio Barros (PSD) e Professor Euler (PSD).
Além do projeto, a CMC também acatou uma emenda modificativa que faz adequações ao texto (034.00070.2021). A proposição recebeu 31 votos “sim”, 2 votos “não” (de Indiara Barbosa e Amália Tortato) e 2 abstenções (de Fachinello e Renato Freitas). Com a aprovação da matéria em primeira votação, esta retorna à pauta de amanhã (6) em segundo turno (confira a ordem do dia). Hoje, o plenário ainda aprovou a abertura de um crédito de R$ 80 milhões para compras do Armazém da Família.
As sessões plenárias têm transmissão ao vivo pelos canais do Legislativo no YouTube, no Facebook e no Twitter. Confira a íntegra da sessão plenária desta terça-feira.
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