Em 1º turno, CMC acata Plano da Igualdade Étnico-Racial de Curitiba
Após debate sobre a igualdade racial iniciado nessa segunda, o Plamupir foi aprovado em primeiro turno. (Foto: Carlos Costa/CMC)
A Câmara Municipal de Curitiba (CMC) aprovou, na sessão desta terça-feira (23), o primeiro Plano de Promoção da Igualdade Étnico-Racial da cidade. A mensagem do Executivo, que começou a ser discutida em plenário nessa segunda (22), recebeu 34 votos favoráveis e 1 abstenção (005.00059.2021). Com acordo firmado para adequação da técnica legislativa, emenda para incluir a habitação e as políticas urbanísticas como 10º eixo temático do documento será reapresentada e votada amanhã (24), na análise da matéria em segundo turno.
O Plano Municipal de Promoção da Igualdade Étnico-Racial de Curitiba (Plamupir) pretende consolidar diretrizes para o enfrentamento do racismo e da violência contra a população negra, indígena, cigana e outros grupos étnicos historicamente discriminados. Conforme o Executivo, as prioridades definidas no documento resultam do trabalho da Assessoria de Direitos Humanos (ADH), do Conselho Municipal de Política da Igualdade Étnico-Racial (Comper) e de ações propostas pelas secretarias, fundações e agências municipais. Também foi realizada consulta pública, pela internet e nas administrações regionais, entre julho e agosto de 2020.
Além do enfrentamento ao racismo, à discriminação, ao preconceito e à violência, são objetivos do Plamupir: o trabalho intersetorial, considerando as metas pactuadas pelas secretarias e órgãos municipais; a garantia do acesso aos direitos fundamentais da população negra (preta e parda), indígena e cigana, promovendo a inclusão e a igualdade social; a promoção dos direitos humanos, com ações afirmativas de valorização dos grupos étnicos discriminados; e o monitoramento periódico das políticas públicas e ações afirmativas, por meio do diálogo com a sociedade civil organizada.
O plano municipal é dividido em nove eixos temáticos: saúde; educação; diversidade cultural e ambiental; esporte, lazer e juventude; direitos humanos, enfrentamento à violência e ao racismo; desenvolvimento social; segurança alimentar e nutricional; trabalho e desenvolvimento econômico; e comunicação.
O documento será válido até o dia 31 de dezembro de 2024. Encerrado esse prazo, deverá ser reformulado com base na análise das ações aplicadas. O monitoramento dos objetivos pautados pelas secretarias, órgãos e agências municipais caberá à equipe da Assessoria de Direitos Humanos. Em uma segunda etapa, sua eficácia será debatida pelo Conselho Municipal de Política de Igualdade Étnico-Racial.
Emendas à mensagem
Com 34 votos favoráveis e 1 contrário, os vereadores acataram emenda substitutiva, da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), para adequação da técnica legislativa (035.00005.2021). Proposição aditiva ao texto, da vereadora Carol Dartora (PT), referente à habitação, teve 23 “não”, 11 “sim” e 2 abstenções (032.00068.2021).
De acordo com o líder do prefeito, Pier Petruzziello (PTB), foi necessário derrubar a emenda porque a autora não estava em plenário para retirar a proposição. A vice-líder da oposição, Professora Josete (PT), encaminhou o voto favorável, para que a adequação da técnica legislativa, indicada pela assessoria do Executivo, fosse acatada na quarta-feira. Para a emenda em segundo turno são necessárias pelo menos 13 assinaturas. Se acatada, o projeto passará por nova deliberação – chamada de redação final.
Dartora, que representou o Legislativo, na noite dessa segunda, em palestra na Assembleia Legislativa de Santa Catarina (Alesc), durante a 1ª Conferência Parlamentar de Políticas Públicas de Promoção da Igualdade Racial, relatou atraso do voo. “Mas conseguimos o acordo com a prefeitura”, registrou. Segundo a vereadora, o Plamupir precisa da emenda para ficar alinhado ao plano nacional na área.
Debate em plenário
“Haverá um tempo em que nós não precisaremos mais elaborar projetos como este. É o meu sonho”, disse Petruzziello. O projeto do Executivo, defendeu, busca aliar a informação e a educação no combate ao racismo, alinhando políticas públicas a favor da população negra, indígena e cigana. Citando o pronunciamento da jornalista Dulcineia Novaes, homenageada por Herivelto Oliveira (Cidadania), nessa segunda, e casos de racismo no esporte, o líder avaliou que “o Brasil é sim, assim como grandes países da Europa, um país racista. Esta é a verdade, e isso tem que ser enfrentado".
“O plano não vai acabar com o racismo. Porém, é um avanço muito importante para as políticas públicas. Os eixos estão muito bem definidos. Nós temos mecanismos de aferições”, pontuou Serginho do Posto (DEM). Rejeitando o racismo, Amália Tortato (Novo) traçou histórico sobre as ações afirmativas e sua conceituação.
Para Eder Borges (PSD), que se absteve da votação, o preconceito racial é “inadmissível e incabível”, mas tem diminuído nas últimas décadas. Ele disse concordar com o combate ao racismo e outros pontos do projeto. No entanto, chamou de “tribunal racial” medidas, como a emenda de Carol Dartora, que buscariam “resolver uma injustiça com outra injustiça, que seria preterir pessoas tendo como critério a cor de pele”. Em sua opinião, o critério deve ser social, e não racial.
Visibilidade e reconhecimento
Também em primeiro turno, teve aval do plenário projeto para denominar o Centro Municipal de Educação Infantil Vila Torres como CMEI Enedina Alves Marques, a primeira engenheira negra do Brasil (008.00003.2021). Assinada por 12 vereadores, por iniciativa de Pier Petruzziello, a proposta de lei teve 34 votos favoráveis e 2 abstenções.
Graduada em 1945, Enedina foi a primeira mulher a concluir o curso de Engenharia Civil na Universidade do Paraná, atual UFPR, numa turma formada por homens brancos. Ela trabalhou como auxiliar na Secretaria de Estado de Viação e Obras Públicas e, em seguida, foi transferida para o Departamento Estadual de Águas e Energia Elétrica do Paraná. Atuou no desenvolvimento do Plano Hidrelétrico do Paraná, com destaque ao projeto da Usina Capivari-Cachoeira. A engenheira se aposentou em 1962, com reconhecimento profissional, e faleceu em 1981, aos 68 anos.
Herivelto Oliveira, que no debate em primeiro turno do Plamupir havia alertado à falta de visibilidade, frisou que as ações da Comissão Especial da Visibilidade Negra, criada em agosto passado para revisar denominações de monumentos e edificações públicas, ampliando a presença da população negra no contexto histórico e turístico da cidade, vêm nesse sentido. “Muitos adultos que eu encontro hoje, muitos negros, dizem que resolveram seguir o Jornalismo porque se inspiraram no meu trabalho.”
Oliveira exibiu vídeo do professor e historiador negro Sandro Fernandes, que desde 2008 pesquisa a vida da engenheira. Ele relatou, por exemplo, que a homenageada, antes de ingressar na graduação de Engenharia Civil, atuou no magistério.
João da 5 Irmãos (PSL) também destacou o trabalho do colegiado especial da CMC, como o Passeio AfroCuritiba, coordenado pela historiadora Joseli Maria Nunes Mendonça, da UFPR, e audiência pública realizada há um mês. “Não adianta a gente só falar da semana, a gente tem que falar sempre [das políticas públicas étnico-raciais]. A desigualdade existe, a discriminação”, completou.
“Se hoje já é difícil vermos pessoas negras na universidade, imagine naquela época. E essa questão do mérito é relativa. Muitas das nossas crianças acabam abandonando a escola por conta da situação de vulnerabilidade social”, avaliou Josete. “Fui pesquisar a história dela e acho [a homenagem] muito justa. Ela é prova do poder de superação do ser humano”, declarou Borges.
Consciência Negra
A pauta alusiva à Semana da Consciência Negra, na CMC, começou na noite da última quarta-feira (17), com sessão solene promovida por Carol Dartora, Herivelto Oliveira e Renato Freitas (PT), os três vereadores negros de Curitiba. Além do Plamupir e da homenagem a Enedina, a sessão desta quarta terá primeira votação de projeto de diversos vereadores para alterar o nome da Escola Municipal Vila Torres para Irmãos Rebouças, os primeiros engenheiros negros do Brasil, com obras de destaque na capital (008.00004.2021).
No espaço da Tribuna Livre, o Legislativo receberá a professora Ana Helena Passos, cofundadora e diretora de comunicação do Instituto Ella Criações Educativas. A convite da Comissão Especial da Visibilidade Negra, ela falará sobre as pesquisas na área de relações étnico-raciais e da branquitude (076.00043.2021).
O presidente da Casa, Tico Kuzma (Pros), ainda lembrou da entrega da Cidadania Honorária ao jogador de futebol Maycon Vinícius Ferreira da Cruz, o Nikão, em solenidade na noite dessa segunda. Natural de Belo Horizonte (MG), ele foi autor do gol que levou o Club Athletico Paranaense ao bicampeonato da Copa Sul-Americana, no último sábado (20).
Nesta terça, reunião extraordinária da Comissão de Serviço Público liberou, para a votação em plenário, projeto de lei de Carol Dartora que assegura cotas para negros e indígenas nos concursos públicos municipais (005.00033.2021). Para a autora, as cotas são uma “política inclusiva” comprovada até mesmo na iniciativa privada, considerando-se o impacto do racismo estrutural no mercado de trabalho.
As sessões têm transmissão ao vivo pelos canais do Legislativo no YouTube, no Facebook e no Twitter.
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