Curitiba e o Rock: Ivo Rodrigues (1949-2010)
Em comemoração ao Dia Mundial do Rock, a Assessoria de Comunicação da Câmara dá enfoque à vida e a produção musical de Ivo Rodrigues, vocalista das bandas A Chave e Blindagem, falecido em 08 de abril de 2010 e homenageado pela Casa com a nomeação de uma praça no Bairro Alto (Lei 13.613/2010)
Segundo a jornalista Adriane Perin, em matérias publicadas pelo jornal A Gazeta do Povo, em 2001, essa cena era alimentada principalmente pelas rádios que produziam programas de auditório como Ídolos da Juventude, apresentado por Dirceu Graeser na rádio Guairacá e Expresso das Quintas, comandado por Mário Vendramel na PRB2. Adolescentes entre 14 e 17 anos lotavam esses programas e não demorou para que surgissem os primeiros grupos locais, como The Little Devils, The Marvels (que depois se tornaria Metralhas), The Jets, os Vondas e Excelsior.
Foi num desses programas de auditório que Ivo conheceu o guitarrista Paulo Teixeira, da banda The Jetsons (de Palmeiras). Em 69, ambos se juntariam aos músicos Carlão Gaertner (baixo) e Orlando Azevedo (bateria) para montar o grupo A Chave, o nome mais representativo do rock curitibano daquele período.
A Chave
Quando A Chave começou a ter alguma visibilidade no começo dos 70, o rock brasileiro já não mais respirava o ar ingênuo dos primeiros tempos. Dois nomes predominavam absolutos junto ao grande público: Raul Seixas e Rita Lee. Além deles, uma série de grupos circulava por feiras, bares e festivais alternativos, como por exemplo, Casa das Máquinas, Som Nosso de Cada Dia, Made in Brazil, Moto Perpétuo, Som Imaginário Patrulha do Espaço e os Mutantes (cujos integrantes continuaram em atividade mesmo após as saídas de Rita Lee e Arnaldo Baptista).
Segundo o crítico Aramis Millarch, entre 69 e 74 “(A Chave) fez 247 apresentações, das quais 155 em Curitiba, 54 no Interior do Paraná, 37 em Santa Catarina e uma no Rio Grande do Sul, aplaudida por 140.555 espectadores”. Ivo e os colegas passaram toda a década de 70 em atividades frenéticas para fazer a banda despontar com sua sonoridade que remetia ao rock feito por bandas como Rolling Stones, Deep Purple, Sttepenwolf e Led Zeppelin, entre outras Eles espalhavam cartazes enigmáticos por Curitiba, faziam apresentações em locais inusitados, etc. Chegaram a gravar algumas músicas que permaneceram na gaveta por 30 anos e só vieram à tona com o advento da internet.
O ambiente no qual as bandas brasileiras dos anos 70 produziram seus trabalhos era fragmentado e os músicos praticamente não contavam com apoio de mídias especializadas para divulgação. Tudo era precário. No caso de Curitiba, basta dizer que durante muitos anos, o único estúdio em atividade foi o SIR que, dotado de apenas uma pequena mesa de 4 canais, também atendia todo o mercado publicitário.
O poeta Paulo Leminski fez amizade com Ivo e passou a frequentar a “Casa Branca das Mercês”, residência coletiva dos membros da banda A Chave. Essa proximidade trouxe aprendizados não só para Ivo (que presenciou um mestre da palavra em ação) como também para Leminski, que passou a entender melhor o processo de composição de uma música. A Chave e sua sonoridade “Classic Rock” se desfez em meados de 1979, sob o furor da onda Punk, mas Ivo já estava envolvido com aquela que seria sua futura banda: Blindagem
Blindagem
Entre o final de 2007 e o começo de 2008, a banda Blindagem teve a oportunidade de realizar alguns shows no Teatro Guaíra, acompanhada pela Orquestra Sinfônica do Paraná. O momento representou a consagração de um grupo de músicos que, ao longo de 40 anos, conseguiu não só ser reconhecido pela qualidade das canções, mas também pela empatia que gerou junto ao público curitibano.
Antes de contar com Ivo e Paulo Teixeira, a banda Blindagem já possuía a experiência de se apresentar para milhares de pessoas no I Festival de Águas Claras, de 78, e no Camburock, de 79, promovido em Camboriú. A banda contava com o baixista Paulo Juk e os paraguaios Alberto Rodriguez, na guitarra e Ruben “Pato” Romero, na bateria. Com o novo grupo, Ivo optou por uma abordagem musical menos pesada, menos impactante do que a que desenvolvia com A Chave. A banda Blindagem poderia perfeitamente se enquadrar (de uma forma tardia) na vertente conhecida como rock rural, que tinha entre seus representantes Sá, Rodrix & Guarabyra, A Barca do Sol, 14 Bis, Recordando o Vale das Maçãs e outras. Dentro dessa perspectiva, os músicos da banda Blindagem retomaram as antigas parcerias com Leminski, fizeram novos arranjos e gravaram. Desses registros resultou o disco “Blindagem”, de 81, clássico instantâneo do rock brasileiro.
“Já quanto ao Ivo, tenho certeza que gravou um LP com a Blindagem, uma banda de gatos brabos do terreno baldio daqui, que o acompanha fielmente, (...) gente guitarreira, zoenta, punk, jóia de repertório, (...) Oito letras minhas com Ivo, inclusive ‘que eu sou legal eu sei’, que a censura só liberou agora”, escreveu Paulo Leminski em carta para o amigo Régis Bonvicino. Curiosamente, o disco teve uma vendagem expressiva, apesar do seu não enquadramento nas tendências do rock brasileiro da primeira metade dos anos 80. A banda chegou mesmo a ter um fã-clube em São Paulo. Relançado em CD em 1998, hoje o disco se encontra disponível no youtube.
Depois do lançamento deste primeiro disco, a banda Blindagem prosseguiu suas atividades e se consolidou como a banda de rock curitibana por excelência. Falta espaço para lembrar de todas as etapas da história da Blindagem, mas basta lembrar a participação da banda na montagem de Horror Picture Show, em 82, que teve tradução de Zé Rodrix. Quem frequentava a boemia curitibana daquele período, poderia encontrar a figura do Ivo, sempre bem humorado, pelos bares e caracterizado como seu personagem na peça.
Os muitos anos de dedicação ao rock cobraram seu preço. A saúde de Ivo se debilitou e ele se foi, em 2010. Permanece vivo o seu legado de canções, que tão bem soube capturar o espírito daquelas décadas. Em reconhecimento a esse legado para a música curitibana, a Câmara Municipal homenageou o músico emprestando seu nome a uma das praças da cidade. Além desse reconhecimento, a Câmara também homenageou a banda Blindagem com o Prêmio João Batista Gnoato, em 2008.
Por João Cândido Martins
Referências Bibliográficas
História do Rock Curitibano Partes I, II e III. Gazeta do Povo, Caderno G, 2001.
(Acesse a parte 1, parte 2 e parte 3)
Políticas Públicas e Produção de Música Popular em Curitiba – 1971 a 1983. Ulisses Quadros de Moraes. Dissertação apresentada no Departamento de Pós-Graduação da UFPR, para a obtenção do mestrado em História. Curitiba, 2008.
Envie meu Dicionário: Cartas e alguma Crítica. Org. Régis Bonvicino. Paulo Leminski e Régis Bonvicino. São Paulo, Editora 34, 1999.
O bandido que sabia latim. Toninho Vaz. São Paulo, Editora Record, 2001.
Blog do escritor Toninho Vaz, autor de O bandido que Sabia Latim, biografia de Paulo Leminski (acesse aqui).
MANOEL, J. de Souza (ORG.) O Rock no Paraná; ou de como os paranaenses passaram de imitadores a vanguardistas do rock, dos idos de 1955 a 1970. In: A [des] Construção da Música na Cultura Paranaense. Curitiba: Ed. Aos Quatro Ventos, 2004.
Artigos escritos pelo jornalista Aramis Millarch para a coluna Tablóide, publicada no jornal O Estado do Paraná: A Chave do Projeto (27/09/1974); Blindagem, a busca do espaço rock (07/12/1984).
Algumas músicas:
Banda A Chave: De Ponta Cabeça; Luva de Pelica.
Banda Blindagem: Blindagem (1981 – disco na íntegra)
Reprodução do texto autorizada mediante citação da Câmara Municipal de Curitiba