Covid-19: CMC debate obrigatoriedade de vacinação em crianças
Propositor da moção, Eder Borges quer que os pais tenham o direito de decidir se seus filhos vão ou não se vacinar contra a covid-19. (Foto: Rodrigo Fonseca/CMC)
A Câmara Municipal de Curitiba (CMC) formou maioria ao aprovar uma moção de "desagravo ao Ministério da Saúde pela obrigatoriedade imposta à imunização da covid-19 em crianças e violação de dispositivos legais que facultam o cumprimento”. O requerimento foi debatido na sessão plenária desta quarta-feira (28) por quase uma hora e, no momento da votação, 17 dos 21 vereadores e vereadoras que estavam presentes em plenário foram favoráveis à proposição.
A moção foi protocolada por Eder Borges (PP) e se refere à Nota Técnica 118/2023, do Ministério da Saúde, que incorporou a vacina Covid-19 pediátrica no Calendário Nacional de Vacinação a partir de 2024. Conforme o Programa Nacional de Imunização (PNI), a vacina Pfizer passa a ser obrigatória para crianças entre 6 meses e 4 anos. O esquema vacinal será composto por três doses (D1, D2 e D3), sendo que entre a D1 e a D2 a aplicação deve ocorrer com intervalo de quatro semanas, já entre a D2 e a D3 esse espaço deve ser de oito semanas.
Contrário à imunização obrigatória em crianças, o vereador disse que não pode “se calar diante desta situação”. Segundo Borges, estudos científicos que respaldam a imposição do MS em incluir a vacinação contra a covid-19 no PNI “são insuficientes para atestar a eficiência do imunizante”. “Não à toa prevalece a desagregação dos órgãos competentes”, complementou, durante a defesa da moção de desagravo (416.00001.2024).
Eder Borges também acusou a pasta federal de violar direitos fundamentais previstos na Constituição Federal, na Declaração Universal dos Direitos Humanos e no ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente. “Esta política é terrivelmente equivocada, sem qualquer evidência ou consenso científico. Grande parte de médicos, cientistas, apontam efeitos colaterais bastante graves. O covid é uma doença muito pouco ativa em crianças”, afirmou o vereador. Para ele, as verbas destinadas ao tratamento da doença deveriam ser destinadas a ações de combate à dengue.
“Já passou a pandemia da covid. Não faz o menor sentido impor aos pais esta vacinação obrigatória. E a Prefeitura de Curitiba não deve se curvar a estas imposições ideológicas, certamente com conflitos de interesse do Governo Federal”, emendou o parlamentar. “Somos contra a nota técnica, e pedimos à gestão municipal que tenha coerência, bom senso, e dê liberdade aos pais [para decidir sobre] a questão da vacinação, e da matrícula escolar”, defendeu. Eder Borges exibiu, em plenário, dois trechos de um debate que aconteceu no Senado Federal, contrário à inclusão da vacinação contra covid-19 no Calendário Nacional de Vacinação.
Vereadores a favor da moção ratificaram posição de Eder Borges
De um total de 38 vereadores e vereadoras, 21 participaram da votação, sendo 17 favoráveis à moção de desagravo ao MS. Osias Moraes (Republicanos) foi incisivo ao criticar a obrigatoriedade, emitida por meio de uma nota técnica, que sequer poderia ser revogada pelo Senado Federal, pois não é normativa. “Isto é um absurdo.” Conforme o parlamentar, ele tem recebido reclamações de pais e familiares em relação à medida, “principalmente em relação às matrículas nas escolas”.
Moraes continuou: “Nós recebemos muitas denúncias de abuso, inclusive, de [que] alguns administradores estão obrigando que o pai ou responsável tivesse a carteirinha de vacinação e de que o filho ou a filha fossem vacinados. Nós sabemos que a vacina não impede a proliferação do vírus. […] A vacina a qual o Ministério da Saúde propõe às crianças está extremamente ultrapassa na eficácia. O MS precisa ter coerência. O Senado não consegue nem revogar este ato porque não é normativo, não é obrigatório. A que pontos chegamos? O MS divulga que há uma obrigatoriedade, quando é uma nota técnica.”
Ezequias Barros (PMB) também criticou a obrigatoriedade e atestou que “não existe comprovação” da eficácia do imunizante. Ele disse estar preocupado com efeitos colaterais após tomar duas doses da vacina e disse “eu não me vacino mais”. “Por que vacinar uma criança de 3, 4 anos para entrar na creche? A gente não sabe se existe alguma coisa maior por trás disso. O Ministério da Saúde precisa dizer, sim, que isto aqui funciona. […] A gente já tem cidades em Santa Catarina que estão dizendo não à vacina contra a covid [para as crianças]”, disse.
“Não sou contra as outras vacinas. A gente sabe que o Brasil é referência na questão da imunização. Mas a gente está falando especificamente das vacinas do covid para crianças e bebês. […] Acredito que ainda não haja consenso em relação a esta vacina, e a decisão deve ser dos pais. Os pais devem se informar, devem decidir se vacinam ou não os seus filhos, seguindo inclusive orientação médica. Sou contra a obrigatoriedade, a decisão deve ser dos pais”, opinou Indiara Barbosa (Novo).
Para Rodrigo Reis (União), a “vacina é um remédio como qualquer outro” e ninguém deve ser obrigado a tomar. O vereador informou ter conhecimento de que o Conselho Tutelar de Curitiba está “intimando” pais a levarem seus filhos ao posto de saúde para tomar a vacina. Sargento Tânia Guerreiro (União) também endossou as falas que a antecederam. Segundo a vereadora, as crianças precisam ser protegidas, e os pais não podem ser obrigados a imunizar seus filhos. “Espero que a gente ainda consiga decidir por nós mesmos, o que fazer.”
Vacina tem comprovação científica, defende minoria no plenário
Quatro parlamentares foram contrárias à moção de Eder Borges, e quem puxou a discussão para contrapor os argumentos do vereador foi Maria Leticia (PV). Médica, a vereadora endossou a necessidade da vacinação em crianças e lembrou que os Estados Unidos foram os primeiros no mundo a vacinar bebês a partir de 6 meses contra a covid-19. Canadá, Irlanda, Alemanha e Grécia são países que também imunizam crianças a partir desta idade.
“A vacinação já diminuiu a mortalidade das crianças. E o fato de vacinar as crianças contribui com a diminuição da doença entre adultos. […] O benefício é para toda a população. Temos que pensar no coletivo. Quando a fake news é disseminada em um espaço como o nosso, isto desestabiliza as famílias. Isto deixa as famílias incertas quanto à vacinação. E elas não levam seus filhos para vacinar. E acontece o quê? Estas crianças adoecem”, completou a vereadora, ao pedir para os colegas fazerem consultas técnicas e “não se basearem em mentiras”.
Também contrária à moção, Professora Josete (PT) analisou que a ciência deve ser colocada com referência. “Acho interessante quando alguns vereadores dizem que esta é uma ação ideológica, do Ministério da Saúde. Ideológico é quem traz um dado totalmente equivocado e faz uma defesa anticientífica e anti-vacina aqui [na Câmara Municipal de Curitiba].” A vereadora argumentou, ainda, que nenhum imunizante tem 100% de eficácia. “A resposta imunológica varia, conforme faixa etária. Algumas crianças reagem melhor [a uma vacina], em outras os adultos reagem melhor. A gente tem que ter este entendimento: não há 100% de proteção com as vacinas”, esclareceu Maria Leticia.
Na opinião de Giorgia Prates – Mandata Preta (PT), a justificativa da moção apresentada por Eder Borges traz “instabilidade social”. “Todo mundo tem aqui a marca da vacina da varíola, está todo mundo, todo mundo em pé graças exatamente a pessoas que se dedicaram ao estudo [da doença].” Autor do requerimento, Eder Borges rebateu os argumentos contrários, afirmando que propôs a discussão sobre se o “Estado deve obrigar os pais a vacinarem seus filhos, a ponto de serem incomodados pelo Conselho Tutelar”. “Não há consenso científico, e quando não há consenso científico não faz o menor sentido pretender obrigar alguém a fazer algo”, finalizou.
Governo do Paraná e Curitiba seguem a nota técnica do Ministério da Saúde
Em dezembro, o Governo do Paraná informou que iria seguir a recomendação da nota técnica do Ministério da Saúde. “A Sesa irá seguir a determinação do Ministério da Saúde e, a partir do próximo mês, todas as crianças acima dos 6 meses devem receber as doses do imunizante. É válido reforçar que as vacinas são as responsáveis por evitar os casos mais graves e os óbitos, sendo assim, é muito importante que todas as crianças nessa faixa etária, público muito mais suscetível às formas mais graves da doença, sejam contempladas com a vacina em todo o Paraná”, explicou o secretário de Estado da Saúde, Beto Preto, à época.
As doses foram distribuídas pela Secretaria Estadual de Saúde para as 1.850 salas de vacinas das Unidades Básicas de Saúde (UBS) dos 399 municípios do Paraná. Até o final da primeira quinzena de dezembro, 385.978 doses (entre D1, D2 e D3) já haviam sido aplicadas em uma população estimada de 687.475 crianças no Paraná. A cobertura vacinal de 1ª dose para o público de 6 meses a 2 anos de idade era de 21,72% e para a população de 3 a 4 anos era de 41,12%, sendo que a meta preconizada pelo Ministério da Saúde é de 90%.
A Prefeitura de Curitiba é uma das 399 cidades do estado que incluiu esta imunização no calendário de vacinação. Na audiência pública de prestação de contas da Saúde, realizada na semana passada, na Câmara Municipal, a secretária municipal de Saúde, Beatriz Battistella Nadas, fez um alerta sobre a importância da vacinação. “Em 2023, ficamos ainda aquém do que é recomendado pelo Ministério da Saúde, foi uma cobertura menor do que foi em 2022. Insistimos nesta convocação de todos levarem seus familiares que têm vacinas a serem feitas [a uma unidade de saúde], [..] não faltam vacinas, não faltam aplicadores”, disse.
“Vacina é ciência em gotas e é o que nos proporciona viver mais, com mais saúde”, defendeu a gestora do SUS. Segundo Battistella, os casos da covid-19 aumentaram, mas “a pequena onda que estamos vivendo ainda não se traduz em gravidade com vivemos no passado, graças à cobertura vacinal”. Conforme dados do Informe epidemiológico da Sesa, até novembro de 2023 o Paraná registrou 90.455 casos confirmados de covid-19 em crianças de 0 a 4 anos, sendo que 67 foram a óbito em todo Estado.
Saiba mais sobre as moções que são debatidas na Câmara de Curitiba
O Regimento Interno da CMC prevê esse instrumento para que os parlamentares possam formalizar decisões colegiadas, tomadas pela maioria dos seus membros, a respeito de fatos públicos que julguem relevantes. Levadas à discussão na segunda parte da Ordem do Dia, as moções são enquadradas regimentalmente como requerimentos, bastando a maioria simples, em votação simbólica, para serem declaradas aprovadas pela Câmara de Vereadores. As que são aprovadas podem ser convertidas em ofícios, que são encaminhados pelo Legislativo às pessoas ou instituições citadas, ou apenas publicizadas pela CMC, como apoio a uma causa de interesse público.
Ano passado, os vereadores aprovaram 28 moções, sendo 6 de protesto e 22 de apoio ou desagravo.
Reprodução do texto autorizada mediante citação da Câmara Municipal de Curitiba