Coordenador de igualdade racial alerta a "genocídio da juventude negra"
Nesta segunda-feira (20), Dia da Consciência Negra, a Câmara de Curitiba abriu a palavra ao coordenador municipal de igualdade racial, Adegmar José da Silva, mais conhecido como Candieiro, ativista da causa negra há mais de 30 anos. “Não vou falar deste feriado [municipal] que me magoou bastante, que não era feriado para ir pra praia, era pra reflexão”, afirmou, sobre a norma aprovada pelos vereadores em 2012, promulgada em janeiro de 2013 pelo então presidente da Casa, Paulo Salamuni (PV), e derrubada judicialmente após questionamento da Associação Comercial do Paraná (ACP) e Sindicato da Indústria da Construção Civil no Paraná (Sinduscon-PR). No discurso, o convidado saudou o “rei Zumbi dos Palmares” e pediu apoio da Casa no combate ao “genocídio da juventude negra”.
“Estamos tendo um problema muito sério no Brasil e no mundo, que é o genocídio da juventude negra. Curitiba está no mapa deste genocídio. Precisamos também conversar sobre crack, já que 80% das vítimas são afrodescendentes”, disse. “Nossas crianças, nossos jovens não estão chegando a 30 anos, estão sendo assassinados.” Para Candieiro, os vereadores podem contribuir com a realização de audiências públicas e com a destinação de emendas. Ele também alertou à intolerância religiosa e ao desconhecimento do papel dos negros na construção da cidade.
“Precisamos falar sobre isso. Oficialmente, até [19]99, não estávamos nos livros que contavam a história da nossa cidade”, continuou. Para o assessor do Executivo, a presença dos negros foi apagada de diversos momentos da cidade. “Antigamente não se aprendia a história de Zumbi, se aprendia na escola a história da princesa Isabel [que assinou a Lei Áurea]”, comentou Professora Josete (PT).
“Esta gestão está sensível a essas questões e vamos lançar em breve o [programa] Viva Curitiba Consciente, para conhecermos mais nossa história. Enquanto o leão não contar sua história permanecerá a versão dos caçadores”, apontou Candieiro. Ele destacou que os escravos participaram da construção das igrejas e prédios históricos construídos antes de 1880.
“O segundo clube social negro do Brasil não está na Bahia, está em Curitiba [a Sociedade 13 de Maio]. Onde estão os quilombos de Curitiba, se a presença negra foi tão importante aqui? Falar sobre a questão negra mexe com minha alma, mas temos pouco tempo e poucos espaços para falar”, acrescentou. De acordo com Candieiro, há um projeto para a construção do Centro de Referência da Cultura Afro, embaixo do viaduto Capanema. “Nós temos consciência negra sim, mas não temos condições de materializá-la”, finalizou, sobre a falta de recursos para colocar em prática os dispositivos do Estatuto da Igualdade Racial.
“Dia de reflexão”
“Minha mãe é negra e meu pai é pardo, filho de indígena com ciganos”, discursou Mestre Pop (PSC), que voltou a lamentar a derrubada do feriado municipal, decisão confirmada pelo Supremo Tribunal Federal (STF), em setembro do ano passado (leia mais). “Não é para fazer festa, bater tambores, soltar foguetes. Seria um dia para reflexões, para relembrar todo o passado histórico do negro, de sua vinda a nosso país, das chicotadas nas costas.”
Para Pop, mais dolorosas que “as marcas que ficavam naquele ser humano que era colocado no pelourinho para ser chicoteado” era a violência de ser arrancado de sua terra. “Quando você trazia o negro, o tirava de sua família, à força você já o matava”, lembrou. O vereador também contestou o prejuízo alegado pela ACP. Segundo ele, as cidades que têm o feriado lucram em segmentos como os restaurantes. “Hoje a única coisa que comemoramos no dia 20 é a luta incansável do Zumbi dos Palmares [data também em que seu corpo foi localizado, em 1695]. Queremos ter direito à oportunidade”, concluiu.
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