Conselho Tutelar pede apoio da CMC no combate ao abuso sexual infantil
João Carlos Pires de Camargo Alves participou da Tribuna Livre a convite do vereador Alexandre Leprevost (SD). (Foto: Rodrigo Fonseca/CMC)
Na Tribuna Livre desta quarta-feira (19), a Câmara Municipal de Curitiba (CMC) deu continuidade às atividades alusivas ao Maio Laranja e ao Dia Nacional de Combate ao Abuso e Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes, celebrado ontem, 18 de maio. Depois de relembrar o caso da menina Rachel Genofre, cujo acusado foi condenado a 50 anos de prisão neste mês, o espaço democrático de debates do Legislativo recebeu, hoje, o presidente dos Conselhos Tutelares da cidade, João Carlos Pires de Camargo Alves. Em sua fala, que ocorreu durante a sessão plenária, o convidado pediu apoio dos vereadores na mobilização para que a população denuncie casos de violência contra crianças e adolescentes.
A convite de Alexandre Leprevost (SD), primeiro vice-presidente da CMC (076.00021.2021), o conselheiro tutelar, que integra a equipe do Conselho Tuletar da Regional Cajuru, afirmou que não é possível falar do dia de combate contra o abuso e a exploração sexual infantil sem relembrar o caso que deu origem à lei que instituiu a data no país (lei federal 9.970/2000). “A lei existe há 21 anos e marca o assassinato da menina Araceli, que foi raptada e estuprada aos 8 anos de idade. Isso aconteceu há 48 anos e os envolvidos ainda não foram punidos”, disse.
Para João de Camargo Alves, apesar do Brasil ser um dos países que têm as melhores leis de proteção à criança e ao adolescentes, é uma das nações que mais viola direitos deste público. “Nós temos [em Curitiba] uma rede de proteção eficaz, temos um colegiado, mas não conseguimos combater esse mal que assola nossa sociedade 100%”, disse, para depois solicitar que os vereadores e vereadoras usem suas redes sociais e o alcance que elas têm para mobilizar a população sobre a importância da denúncia para o combate ao abuso e à exploração sexual de crianças e adolescentes. Ela pode ser feita pela Central 156, da Prefeitura de Curitiba, ou pelos canais Disque 100 e Disque Denúncia 181.
Segundo o conselheiro tutelar, existe diferença entre o que é exploração sexual e o que é abuso sexual. A exploração, esclareceu, é “aquela violência onde o sujeito financia, paga para que a criança ou o adolescente satisfaça seu desejo sexual”. “É preciso deixar claro que a criança ou o adolescente não se prostitui. Eles são explorados sexualmente. Quem tem que se negar [a praticar essa violência] é o adulto, a pessoa de maior idade”, orientou. Já o abuso sexual, continuou, é “quando um sujeito pratica atos libidinosos com a criança e infelizmente esse ato ocorre, na maioria das vezes, dentro do próprio lar”. “[Esse é um crime devastador, é um mal que não conseguimos observar direito. Hoje temos um número muito alto de crianças vítimas deste mal, mas esse número alto é só a ponta de um iceberg, porque nem tudo chega até os órgãos de proteção”, completou.
Trabalho do conselho
João de Camargo Alves explicou que os 10 conselhos tutelares de Curitiba, cada um atuando em uma administração regional, fazem o monitoramento de casos de crianças e adolescentes que são vítimas dessas violências. Mas, atualmente, o órgão enfrenta dificuldades nesse trabalho devido ao tamanho da população curitibana, à pandemia da covid-19 e à suspensão das aulas presenciais na rede pública de ensino.
Hoje, a cidade possui apenas 50 conselheiros tutelares, divididos nos 10 colegiados, número que é insuficiente para atender e acompanhar as denúncias que chegam ou que podem vir a surgir. Conforme o presidente dos Conselhos Tutelares, a resolução 139/2010 do Conanda (Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente) estabelece que municípios precisam ter um conselho tutelar para cada 100 mil habitantes. “Curitiba precisa de mais 10 conselhos tutelares, para ter 2 por regional”, alertou.
Somado ao número insuficiente de colegiados para atender uma cidade com 1,9 milhão de pessoas, há a pandemia da covid-19 que afastou cerca de 10 dos 50 conselheiros tutelares do atendimento presencial por terem comorbidade e os demais continuam atendendo as famílias, visitando os lares, segundo João de Camargo Alves, “24 horas por dia, em horário comercial de segunda à sexta e nos plantões”. “Tivemos casos de até terceira infecção entre os conselheiros”, contou, para depois informar ao plenário que a categoria está na linha de frente mas ainda não foi vacinada.
“Enquanto eu estou falando com vocês aqui, tem uma conselheira ou um conselheiro atendendo uma família, com máscara, álcool gel, mas está ali, se expondo”, emendou. “Os vereadores devem olhar com bons olhos para o Conselho Tutelar. Fomos eleitos como vocês, fomos escolhidos como vocês para representar a sociedade. Nós estamos lá, dentro da periferia, dentro da favela, dentro da quebrada, visitando as famílias, e precisamos de um olhar para a nossa classe, que até agora não foi vacinada. É importante que nossa classe receba a vacina tendo em vista que está, de forma ininterrupta, visitando as famílias”, pediu o conselheiro tutelar.
Sobre a suspensão das aulas presenciais, João de Camargo Alves disse que isso prejudicou a “parceria muito eficaz com as escolas [públicas]” que ajuda a identificar os casos de abuso e exploração sexual infantil. Apesar de não opinar sobre se as escolas e CMEIs devem reabrir ou não, ele alertou para a necessidade de implantação de uma política pública específica para atender crianças e adolescentes que estão em casa, sofrendo algum tipo de violência.
“A ferramenta que tínhamos era a escola, que nos comunicava. Até porque, aquela criança abaixo dos sete anos que está sendo violentada sexualmente [...] ela percebe, dentro do seu eu, que essa violência é um ato de carinho do seu protetor. E a gente só consegue descobrir que a criança sofre violência quando ela aflora um sinal alerta, na escola, na sociedade, com os amigos, com os vizinhos. E como isso acontece, se estamos em um período pandêmico?”, questionou.
Dúvidas dos vereadores
Após sua exposição, o convidado respondeu dúvidas dos vereadores sobre o tema. Carol Dartora (PT), após observar que os números de denúncia de casos de abuso e exploração sexual contra crianças e adolescentes são “subnotificados porque as famílias ainda têm esse pacto de silêncio”, perguntou que tipo de políticas públicas específicas para esse combate poderiam ser implantadas. João de Camargo Alves citou como exemplo investimentos em educação remota, para orientar “através de vídeos e conteúdos, sobre como [crianças e adolescentes podem] denunciar”. “Precisamos armar mais as nossas crianças para se defenderem. Porque essa violência acontece dentro do próprio lar. 90% delas, estudos apontam que, infelizmente, quem está praticando é o pai, é a mãe, é o irmão, é a tia. Ontem mesmo atendi um caso na sede do conselho em que a mãe estava praticando este tipo de violência contra a filha”, complementou.
A Nori Seto (PP), que indagou sobre se houve aumento da violência infantil durante a pandemia, ele respondeu que não dados precisos, mas foi categórico ao afirmar que esse aumento existe, porque existem denúncias anômicas, que são só a “ponta do iceberg. “Temos na cidade muitas regiões periféricas, e mesmo sabendo que a violência sexual não escolhe classe, na maioria das vezes, ela está na periferia. Eu sou de periferia, sou de favela e sei o que estou falando. [...] Enquanto eu falo aqui agora tem uma criança dentro de um lar sendo vitimizada. Precisamos pensar ações mais estratégicas, pesquisar a nível de Brasil e de mundo, outras ações que deram certo e trazer para cá.”
O presidente dos Conselhos Tutelares ainda respondeu a Alexandre Leprevost, que o programa Força-Tarefa Infância Segura, desenvolvido pela SEJUF (Secretaria de Estado da Justiça, da Família e do Trabalho), tem parceria com os conselhos tutelares da capital, que trabalham com o eixo 4 – de um total de 18 que são aplicados atualmente – que está relacionado às ações nas comunidades. Sobre a existência de dificuldades para ampliar o número de conselhos tutelares, indagada por João da 5 Irmãos (PSL), ele informou que não só a regional Cajuru, onde atua, necessita urgentemente de mais conselheiros tutelares, mas outras regiões também. “A gente já iniciou um pedido na prefeitura, fizemos encaminhamentos, estamos juntando documentos para mostrar para o Conselho Municipal de Direitos [Humanos], mostrar para o Ministério Público.”
Já a Noemia Rocha (MDB) e Osias Moraes (Republicanos) que perguntaram sobre como é o atendimento das crianças e adolescentes que são vítimas do abuso ou da exploração sexual, ele orientou que elas são encaminhadas para o Hospital Pequeno Príncipe, onde há um médico específico para fazer o atendimento; e para o Nucria (Núcleo de Proteção à Criança e ao Adolescente Vítimas de Crimes), cuja delegacia tem uma equipe técnica qualificada para o atendimento. E quando precisam ser retiradas de casa, são levadas para uma instituição que presta o acolhimento, decisão que, segundo ele, “viola outro direito” desta criança ou adolescente.
A íntegra da Tribuna Livre está disponível no canal do YouTube do Legislativo. O debate ocorreu logo após a participação do ex-vereador Thiago Ferro na sessão plenária. Também participaram do debate, os vereadores Sargento Tânia Guerreiro (PSL), Jornalista Márcio Barros (PSD), Ezequias Barros (PMB), Marcos Vieira (PDT), Professora Josete (PT), Indiara Barbosa (Novo).
Tribuna Livre
A Tribuna Livre é um espaço democrático de debates mantido pela CMC, para ser canal de interlocução entre a sociedade e os parlamentares. Os temas discutidos são sugeridos pelos vereadores, que por meio de um requerimento indicam uma pessoa ou entidade para discursar e dialogar no plenário. As falas neste espaço podem servir de prestação de contas de uma entidade que recebe recursos públicos, apresentação de uma campanha de conscientização, discussão sobre projeto de lei em trâmite na Casa etc.
Conforme o Regimento Interno do Legislativo, as Tribuna Livres ocorrem nas quartas-feiras, durante a sessão plenária – geralmente, após a votação dos projetos de lei e demais proposições, a menos que ocorra a inversão da pauta. Se você participa de uma entidade, representa uma causa ou atividade coletiva, entre em contato com um dos vereadores para sugerir a realização da Tribuna Livre. O RI veda o uso desse espaço por representantes de partidos políticos; candidatos a cargos eletivos; e integrantes de chapas aprovadas em convenção partidária.
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