Comissão do Transporte avalia cenário nacional da tarifa zero

por Marcio Alves da Silva | Revisão: Ricardo Marques — publicado 24/06/2023 03h50, última modificação 26/06/2023 11h05
Levantamento mostra que 74 cidades brasileiras já garantem a gratuidade no sistema de transporte coletivo.
Comissão do Transporte avalia cenário nacional da tarifa zero

Vereadores discutiram sobre possíveis vantagens e desvantagens em se adotar um sistema sem catracas (Foto: Carlos Costa/CMC).

As informações trazidas pelos vereadores que integram a Comissão Especial para Discutir o Novo Contrato do Transporte Coletivo - Tarifa Zero no 3º seminário “Transporte como direito e caminhos para a tarifa zero”, realizado em Brasília entre os dias 13 e 16/06, motivaram as discussões do colegiado, que esteve reunido na última sexta-feira (23) na Câmara Municipal de Curitiba (CMC).

Giorgia Prates - Mandata Preta (PT) e Jornalista Márcio Barros (PSD) fizeram relatos de suas participações no evento e apresentaram um panorama sobre as principais discussões relacionadas à mobilidade urbana, financiamento do transporte coletivo e as experiências em funcionamento do sistema de tarifa zero.

Dados apresentados pelos parlamentares revelam que, no Brasil, 74 cidades já permitem que seus moradores se desloquem sem pagar nenhuma tarifa, sendo que, destas, apenas sete possuem mais de cem mil habitantes. O amadurecimento do tema no país, detalharam os vereadores, resultou na apresentação da PEC 25/2023, que inclui o direito social ao transporte na Constituição Federal e estabelece as diretrizes do Sistema Único de Mobilidade (SUM).

Apresentada pela deputada federal Luiza Erundina (PSOL/SP) e assinada por outros 172 congressistas, a PEC é comparada a outros sistemas de prestação de serviços públicos, como o Sistema Único de Saúde (SUS) e o Sistema Único de Assistência Social (Suas), com possibilidade de financiamento das três esferas de governo: federal, estadual e municipal.

Giorgia recordou que o seminário foi realizado no marco dos dez anos de junho de 2013, “período no qual  milhões de pessoas foram às ruas protestar contra o elevado preço das tarifas de ônibus e por várias outras reivindicações, e celebrou a consolidação do Passe Livre como uma pauta nacional”. “Eu saí daqui [de Curitiba] com muitas dúvidas sobre se a gente poderia mesmo pensar em um sistema nacional de tarifa zero, mas, ali, no encontro, a partir das opiniões de especialistas e pesquisadores, eu compreendi que nós podemos ter alguns caminhos que realmente nos levem a isso", reconheceu a vereadora.

Vantagens e desvantagens da tarifa zero

Um estudo sobre as vantagens e desvantagens que a tarifa zero pode trazer foi detalhado por Márcio Barros. Conforme o vereador, entre as vantagens em não existir o pagamento de passagem estão: a promoção da inclusão social, com maior acesso das pessoas à cidade; a redução dos congestionamentos, dos acidentes de trânsito e da poluição; e o estímulo à economia local.

Já as desvantagens seriam: uma possível queda de qualidade dos serviços, com a superlotação dos ônibus; a transferência dos custos para o governo ou para a iniciativa privada; o benefício maior aos usuários frequentes do que àqueles que raramente utilizam o transporte público; e a possível redução de investimentos em outras áreas prioritárias.

Barros chamou a atenção para o fato de que a maior parte das cidades com passagem de graça são de pequeno porte e recomendou cuidado ao se fazer comparações com cidades maiores, como Curitiba, onde há integração com a região metropolitana. Neste aspecto, o vereador recebeu o apoio de Rodrigo Reis (União), que concordou sobre a impossibilidade de se comparar uma cidade de dois milhões de habitantes com outra de cem mil, afinal, “são gerenciamentos completamente diferentes”.

“Então eu acho que o grande sucesso dessa comissão vai ser a gente conseguir soluções para uma cidade grande. Claro que, vendo o que deu certo e o que deu errado nessas cidades menores, porque elas já estão fazendo, são modelos para nós”. Reis disse que vai formalizar ao colegiado o pedido de uma visita a Paranaguá, cidade do litoral do estado que também adota o sistema de tarifa zero.

Quem paga a conta?

Para tratar da questão do financiamento, Márcio Barros citou o exemplo de Vargem Grande Paulista (SP) onde, segundo ele, a prefeitura chegou a um modelo em que a gratuidade é financiada através de um fundo de transporte, “cujas principais receitas são uma taxa paga pelas empresas locais, no lugar do vale-transporte, além de publicidade nos ônibus, locação de lojas nos terminais e 30% do valor das multas de trânsito”.

“Pagar tarifa zero sem investimento público, isso não existe,  isso é uma utopia, é um nonsense. A gente achar que vai ter uma magia aqui em Curitiba, que nós vamos ter ônibus novos rodando a custo zero, isso não existe, o custo vai ter e nós temos que nos concentrar em quem vai pagar a conta", assinalou Dalton Borba (PDT). Ainda na opinião do vereador, “a hipótese de redução da tarifa tem que ser a segunda, pois a primeira tem que ser a da tarifa zero; e os custos devem ser vistos como investimento, e não despesa. Isso, na verdade, não é um projeto que se cria para se ter uma pauta social, mas uma pauta de desenvolvimento econômico nacional”.

Rumos da comissão

O direcionamento dos trabalhos da comissão chegou a ser questionado por Giorgia Prates, que levantou dúvidas sobre se o colegiado buscaria a tarifa zero ou apenas uma redução no custo da passagem, bem como sobre a sistematização do relatório final. Presidente do colegiado, Herivelto Oliveira (Cidadania) lembrou que defende a tarifa zero desde 2019, quando ingressou na Câmara de Curitiba, e reafirmou seu propósito de atingir esse objetivo. “Talvez a gente não consiga chegar à tarifa zero, porém não é a minha opinião que vai prevalecer, mas a de um consenso [do grupo] depois dessas reuniões que nós tivermos”, ponderou.

Outros assuntos

Bruno Pessuti (Pode) disse ter participado de um seminário de bilhetagem eletrônica em São Paulo e sublinhou que o tema foi muito debatido em Curitiba nos últimos anos. Ele acrescentou que o Governo Federal repassou, durante a pandemia, recursos aos municípios para auxiliar no custeio do transporte coletivo e lamentou que “poucos municípios conseguem dar transparência ao sistema de bilhetagem”. No entanto, o vereador garantiu que atualmente Curitiba possui um sistema robusto e transparente e que poderia até mesmo servir de modelo a outras cidades na questão da implantação do Sistema Único de Mobilidade.

Já Professor Euler (MDB) sugeriu que a Comissão de Transporte busque ter também uma função educativa e que chame a participação das pessoas para discutir os prós e os contras da tarifa zero. O parlamentar indicou que a Diretoria de Comunicação Social da CMC pode desenvolver conteúdos sobre o tema. Euler ainda lembrou que sugeriu à Prefeitura a criação de uma loteria municipal para que parte das receitas fosse direcionada como subsídio aos custos do transporte coletivo, com o objetivo de reduzir o valor pago pelos passageiros.

A Comissão do Transporte

Formada por oito parlamentares, a Comissão Especial do Transporte foi criada a partir da iniciativa de Herivelto Oliveira, eleito presidente do colegiado. Serginho do Posto (União) foi escolhido vice-presidente. A relatoria está com Bruno Pessuti (Pode) e a vice-relatoria com Dalton Borba (PDT). Também são membros os vereadores Giorgia Prates – Mandata Preta (PT), Jornalista Márcio Barros (PSD), Professor Euler (MDB) e Rodrigo Reis (União).


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