Comissão da Verdade realizará audiência pública em Curitiba

por Assessoria Comunicação publicado 28/06/2012 16h00, última modificação 02/09/2021 10h34
A Comissão de Direitos Humanos confirmou, nesta quinta-feira (28), que a capital do Paraná fará parte do roteiro nacional da Comissão da Verdade. A audiência pública será realizada em outubro, com o objetivo de reunir informações e dar divulgação às investigações realizadas pelo grupo de trabalho, que apura casos de violação dos Direitos Humanos acontecidas entre os anos de 1946 e 1988. “A Câmara de Curitiba vai participar deste processo de resgate da verdade sobre a ditadura, pois é sensível à causa”, declarou o vereador Pedro Paulo (PT), presidente da comissão.
A confirmação da audiência pública foi uma das novidades relatadas pelos  integrantes do Fórum Paranaense de Resgate da Verdade, Memória e Justiça aos vereadores da comissão. Milton Alves, Norton Nohama e Roberto Salomão também anunciaram a criação de um Observatório de Direitos Humanos no estado, a possibilidade de ser construído um museu dedicado ao tema na cidade e o processo de interiorização do fórum, com a participação de outras cidades do Paraná. Os vereadores Paulo Salamuni (PV), Jorge Yamawaki (PSDB) e Julieta Reis (DEM) acompanharam a reunião.
Memória
Os parlamentares colocaram-se à disposição do fórum e receberam sugestões para ações futuras. Norton Nohama, assessor da reitoria da Universidade Federal do Paraná (UFPR) e membro do fórum, pediu a participação da comissão no grupo de trabalho criado para definir os parâmetros de criação do Observatório de Direitos Humanos. “Queremos a Câmara de Curitiba junto conosco, para pensar o observatório, que pode receber recursos da Capes para as atividades de pesquisa”, adiantou Nohama. Já integram o grupo de trabalho representantes da Secretaria Estadual de Justiça, da Ordem dos Advogados do Brasil no Paraná, do Ministério Público, dos setores de Ciências Jurídicas e Humanas da UFPR, da Assembleia Legislativa do Paraná e da Unibrasil.
Milton Alves, da coordenação do fórum, reforçou o interesse das 50 entidades que compõem a iniciativa em construir um roteiro de visitação na cidade, que recupere os principais pontos de interesse para a história de resistência à ditadura militar em Curitiba. “A Igreja do Guadalupe, por exemplo, abrigou diversas reuniões clandestinas durante o período. Na Boca Maldita foi realizado um comício das Diretas Já. O fórum não se basta no resgate dessa memória, mas também busca a  construção de uma consciência mais democrática”, argumentou.
Durante a reunião, cogitou-se a possibilidade do terreno que abrigava o antigo presídio do Ahú ser utilizado para a construção de um museu dedicado a esse período da história nacional. Neste sentido, também foi sugerido aos vereadores um trabalho de revisão dos nomes de logradouros públicos na cidade, que considerasse novas denominações para ruas e praças que façam referência a torturadores e demais pessoas ligadas a violações dos Direitos Humanos.
Educação
Roberto Salomão, também da equipe de coordenação do fórum, entende que a missão da sociedade é maior que a condenação dos torturadores, após o trabalho de identificação a ser realizado pela Comissão da Verdade. “No nome do fórum, fizemos questão que houvesse a palavra Justiça. A condenação dessas pessoas é menos importante do que a exacração pública dos crimes que elas cometeram. Com o tempo, elas terão que ir para a cadeia, pois os crimes são inafiançáveis e imprescritíveis. Só que a memória que as pessoas terão desses crimes fica e ajuda a afirmar uma nova cultura de defesa dos Direitos Humanos”,  disse.  
O professor de Direito da UFPR, Leandro Franklin, também pediu o apoio da Câmara no processo de documentação da história desse período. “A memória da ditadura militar está muito calcada na oralidade, em depoimentos, e precisa ser transformada em documento e preservada em publicações”, argumentou o acadêmico. Ele sugeriu que o Legislativo participe, e talvez sedie, a realização de uma audiência pública preparatória para a visita da Comissão da Verdade, em outubro. A ideia foi bem aceita pelos vereadores.
Paulo Salamuni citou livro da jornalista Tereza Urban, em que ela descreve o ambiente cultural da época e apresenta documentos nos quais constam a atividade de resistência de vereadores e personalidades. “Eu vivenciei parte destes fatos, pois várias reuniões aconteceram na minha casa. O esforço da Comissão da Verdade não é motivado por um espírito revanchista, só que para dirigir melhor às vezes é preciso olhar no retrovisor, para que se tome a direção correta”, disse o parlamentar, reforçando a importância da defesa dos Direitos Humanos. Jorge Yamawaki destacou que, além do resgate dessa história, a comissão da Câmara de Curitiba tem mais atribuições, como receber denúncias recentes de violação de direitos.
A necessidade de revisar o conteúdo do ensino básico na cidade também foi tema da reunião, levantado pela professora Janeslei Aparecida, do sindicato da categoria. “Para construir uma educação de valores democráticos, temos que revisar a história do Brasil ensinada nas escolas. Ela parece um conto de fadas, onde o rei é bonachão e o fim da escravidão foi uma decisão da princesa. Isto esconde quatro séculos de escravidão. A repressão policial do regime militar tem as suas raízes aí, nessa polícia escravista”, defendeu a educadora. Sérgio Athayde, da Central Única dos Trabalhadores, reforçou o desejo de reverter este quadro. “Eu é que estava lutando pela democracia e não aceito ser chamado de terrorista. Há uma inversão perversa de valores”, afirmou. Em seu breve testemunho, relatou casos de violação aos Direitos Humanos cometidos na época da ditadura militar.
“A reunião cumpriu o seu objetivo, indo além do esperado para um primeiro encontro”, ressaltou Milton Alves. Na ocasião também foi exibido um vídeo documentário, com depoimentos sobre a ditadura na capital do Paraná. Na peça, Laércio Souto Maior, Valmor Marcelino, Edésio Passos, Zélia Passos, Carmem Ribeiro, Júlio Manso Vieira e Fernando Sá Brito contam as suas experiências pessoais com o regime militar, casos de tortura e o efervescente ambiente político da época.