Com depoimento de vereador, Conselho de Ética encerra oitivas do PED 01/2021
Nesta segunda-feira (23), os membros do Conselho de Ética e Decoro Parlamentar da Câmara Municipal de Curitiba (CMC) tomaram o depoimento do vereador Renato Freitas (PT) no âmbito do Processo Ético Disciplinar (PED) 01/2021. O PED 001/2021 avalia se o parlamentar cometeu “ofensas discriminatórias”, “ofensas morais e à dignidade” e “intolerância religiosa” em falas nas redes sociais da CMC. A Junta de Instrução é composta por Dalton Borba (PDT), relator, Indiara Barbosa (Novo) e Éder Borges (PSD).
Após manifestação da Corregedoria, acatada pelo Conselho de Ética, o PED 01/2021 analisa somente comentários feitos por Renato Freitas no chat do YouTube da CMC, durante a transmissão da sessão plenária de 1º de abril. Lá, o vereador escreveu que “essa bancada conservadora dos pastores trambiqueiros não estão nem aí para vida, só pensam no seu curral eleitoral bolsonarista, infelizmente”. Na sua defesa prévia ao Conselho de Ética, Renato Freitas não arrolou testemunhas a serem ouvidas, logo apenas o seu próprio depoimento foi tomado.
Presidente do Conselho de Ética e relator do PED 01/2021, Dalton Borba pediu que Renato Freitas explicasse o que entendia por “trambiqueiros”, por “curral eleitoral” e por “fake news”, que explicitasse o contexto do seu comentário no chat e o que entendia ser o “tratamento precoce”. Freitas disse que usou a expressão trambiqueiros referindo-se a quem indicava o tratamento precoce para o combate ao coronavírus, sem haver comprovação científica da eficácia do kit de remédios. A íntegra do depoimento está disponível no YouTube da CMC (confira aqui).
Renato Freitas afirmou ter feito o comentário dentro do contexto das discussões do dia. Naquela data, a CMC recebeu o diretor de Centro de Epidemiologia da Secretaria Municipal de Saúde (SMS), aprovou uma moção de repúdio a Roberto Jefferson e acatou novas sugestões ao plano de imunização contra a covid-19 em Curitiba, por exemplo. A íntegra desta sessão também está disponível no YouTube da CMC (link aqui). A Borba, Freitas afirmou não ter tido a intenção de individualizar, fazendo referências “de forma genérica” e que curral eleitoral foi a forma que encontrou para se referir a “extrema direita bolsonarista”.
Indiara Barbosa questionou o conjunto das falas de Renato Freitas no chat daquela transmissão, perguntando a quem se referia a expressão “essa bancada conservadora”, utilizado pelo parlamentar e se o uso incluía vereadores da CMC. O vereador respondeu que, na ideia, juntou políticos municipais, estaduais e federais. Questionado se tentou associar mortes por covid-19 à conduta do vereador Ezequias Barros (PMB), defensor do uso preventivo de remédios contra o coronavírus, Freitas criticou novamente o “kit covid”, pois teria gerado casos de hepatite medicamentosa e exposto as pessoas a mais risco desnecessariamente.
A vereadora do Novo perguntou a opinião de Freitas sobre o seu comportamento naquele dia, se ele achava que tinha, ou não, faltado com a urbanidade esperada de um parlamentar. “Tenho a plena convicção que não [faltei com urbanidade], pois a verdade é uma possibilidade de correção e autocrítica e é sempre a maior demonstração de amor e solidariedade que se pode ter com uma pessoa”. Sobre ter individualizado suas falas, Freitas repetiu que é o método do tratamento precoce que julga ser um trambique.
Éder Borges inquiriu o vereador alvo do PED 01/2021 sobre os outros sentidos de trambique, pois ao usar a expressão estaria acusando os pastores da Câmara de Curitiba de golpistas e de estelionatários. Freitas disse que o elemento da crítica não era esse, sobre serem ou não pastores, pois se referia ao método do tratamento precoce, “as ideias e não os títulos”. Ao mencionar a comunidade médica que defende o uso desses medicamentos, e pedir que Renato Freitas comentasse esse fato, Éder Borges foi interrompido por Dalton Borba, que pediu ao parlamentar que circunscrevesse a pergunta ao objeto do PED 001/2021.
Em resposta, Renato Freitas voltou a dizer que entendia se tratar de charlatanismo, “depois da posição oficial do Ministério da Saúde, que já disse que o método não é eficaz”. Borges perguntou se o vereador acreditava que “os pastores não estavam preocupados com a vida”, ouvindo de Freitas que “essa é uma conclusão que você tirou, para além do que foi dito por mim”. Esse argumento, que as palavras são polissêmicas, que têm usos além dos utilizados pelo vereador, foi mobilizado por Renato Freitas várias vezes ao longo da oitiva.
Abertas as perguntas aos vereadores que não são membros da Junta de Instrução, apenas Denian Couto (Pode) manifestou o desejo de questionar Renato Freitas. Ele perguntou a opinião do vereador sobre o chat da transmissão da sessão plenária do YouTube, se ele a usou na condição de parlamentar ou se via a si próprio, ali, como um cidadão comum se manifestando na internet. “Entendo que se tratava de manifestação enquanto vereador, [pois] o chat é a extensão da tribuna, os comentários são equivalentes aos comentários da sessão plenária”, respondeu Freitas.
A próxima etapa, antes da Junta de Instrução deliberar terminativamente sobre o caso, é consultar novamente a Corregedoria da CMC, para que ela se manifeste sobre o novo conteúdo reunido pelo Conselho de Ética.
Entenda o caso
Os autores da denúncia – Ezequias Barros (PMB), Sargento Tânia Guerreiro (PSL), Osias Moraes (Republicanos) e Pastor Marciano Alves (Republicanos) – alegaram violação de cinco artigos do Código de Ética e Decoro Parlamentar da Casa por “ofensas discriminatórias”, “ofensas morais e à dignidade”, “intolerância religiosa” e “quebra de decoro” por parte do representado, Renato Freitas, em declarações durante e fora das sessões plenárias (leia mais).
Na sindicância, aberta no dia 13 de abril, a corregedora decidiu dividir os fatos narrados em três pontos, por envolverem “contextos distintos”: a) afirmações nas sessões plenárias dos dias 10 e 17 de fevereiro; b) afirmações em vídeo em canal próprio de Freitas no YouTube no dia 5 de abril; e c) comentários no chat do YouTube da CMC no dia 1º de abril.
A corregedora, Amália Tortato (Novo), inadmitiu os dois primeiros pontos, amparados, segundo ela, pelo “direito de opinião e manifestação” e pelo princípio de “inviolabilidade do discurso parlamentar”. Entretanto, avaliou que o terceiro item “deixa claro que se tratou de ataque pessoal e dirigido, não ao discurso, mas aos colegas vereadores”. Freitas escreveu, no chat do YouTube da CMC: “essa bancada conservadora dos pastores trambiqueiros não estão nem aí para vida, só pensam no seu curral eleitoral bolsonarista, infelizmente”.
Em esclarecimentos enviados à Corregedoria, oportunidade aberta por Amália Tortato embora não fosse procedimento obrigatório nessa etapa de apuração, Renato Freitas argumentou: “relacionei a defesa e propaganda recomendando o uso do chamado ‘kit-covid’ ao trambique e chamei de irresponsabilidade. Desde logo, cabe conceituar o termo ‘trambique’: ‘negócio fraudulento’, ‘fraude’, ‘logro’ [Dicionário Online de Português]; ‘enganar fraudulentamente’ [Dicionário Piberam]”.
“Entendo que há indícios da ocorrência de infração ético-disciplinar prevista no art. 7º, inciso I, do Código de Ética e Decoro Parlamentar”, concluiu a corregedora. Assim, foi afastada a sanção de perda de mandato, prevista no art. 10 do Código de Ética da CMC, considerada por Amália Tortato uma “penalização desproporcional”. A conclusão da sindicância foi submetida pela Mesa Diretora do Legislativo ao Conselho de Ética no dia 1º de junho, deflagrando o PED 01/2021.
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