Com debate intenso, Câmara retoma audiências sobre Zoneamento
Duas horas de audiência pública, nesta quarta-feira (3), na Câmara Municipal de Curitiba (CMC), bastaram para mostrar o quanto o Legislativo será demandado pela sociedade na reta final para a aprovação da revisão do Zoneamento da cidade. “Que a sensibilidade política da Câmara corrija o que nós, do ponto de vista técnico, não atendemos”, disse Alberto Paranhos, assessor especial do Ippuc (Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba), ao responder dúvidas da população sobre o projeto entregue aos vereadores no dia 1º de agosto de 2018 pelo prefeito Rafael Greca. Com 236 artigos, a proposta (005.00105.2018) foi aprovada pela CCJ e tramitará por outras comissões temáticas da CMC.
Empresários com divergências sobre qual deve ser o vetor de crescimento da capital, pessoas cujas casas estão em desacordo com a legislação, comerciantes de olho em vagas para carros, moradores antigos de áreas com tendência à verticalização, movimentos sociais questionando as vantagens concedidas ao Vale do Pinhão. Todos foram ouvidos pela Câmara, na audiência pública coordenada pelo vice-presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), Osias Moraes (PRB). “É importante definir o que a comunidade quer para os próximos 10 anos de Curitiba. A Câmara está aberta para todas as ideias, tragam as ideias para as comissões, pois queremos a melhor lei de zoneamento”, garantiu, na abertura da atividade, Sabino Picolo (DEM), presidente do Legislativo.
A audiência pública foi transmitida em áudio pelo YouTube da Câmara de Curitiba.
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Na mesa, com Moraes, Picolo e Paranhos, estavam Pier Petruzziello (PTB), da Comissão de Acessibilidade e liderança do Executivo na CMC, Paulo Rink (PR), da Comissão de Economia, e Maria Manfron (PP), da CCJ. Também Júlio Mazza, secretário de Urbanismo, Ricardo Bindo, assessor especial do Ippuc, e João Paulo Perússolo, do Sindicato da Indústria da Construção Civil (Sinduscon-PR). No auditório, acompanharam a audiência Alex Rato (PSD), Mauro Bobato (Pode), Geovane Fernandes (PTB), Zezinho Sabará (PDT), Katia Dittrich (SD), Herivelto Oliveira (PPS), Cacá Pereira (DC), Noemia Rocha (MDB), Bruno Pessuti (PSD), Oscalino do Povo (Pode), Ezequias Barros (PRP), Marcos Vieira (PDT) e Professora Josete (PT), além do vereador licenciado Felipe Braga Côrtes (PSD), que assumiu a diretoria de políticas públicas para pessoas com deficiência, do governo do estado.
Novos debates serão realizados pela CMC nos próximos meses e, a partir de segunda-feira (8), um formulário para que a população faça sugestões e comentários sobre o Zoneamento estará disponível na internet. “Será um formulário para questões individuais, que ficará aberto por 30 dias”, informou Rink. “Ainda há a possibilidade de emendas [ao zoneamento], portanto faremos mais audiências, para votar com tranquilidade”, completou Petruzziello.
Debate
"Acredito realmente que esta é a melhor proposta técnica possível e, no momento, é aquela que melhor reflete o embasamento do Ippuc”, assegurou Paranhos. “[A revisão do Zoneamento] trata de corrigir o excesso de privilégios. Acreditamos que a cidade vale mais que a simples soma de todos os bairros”, insistiu. O técnico repassou os cinco pontos centrais da proposta, na opinião do Executivo, que é o aumento da habitação na Zona Central, a viabilização da Conectora 3, o incentivo ao Vale do Pinhão como área de uso misto, a distribuição de mais empregos e serviços ao longo dos Eixos Estruturais e a conclusão da Linha Verde.
Paranhos relatou que o trabalho de elaboração da norma começou em 2016, com a realização de várias audiências pelo Executivo em 2017, nas quais foram ouvidos os setores produtivos e as associações de bairro. Antecipando-se à crítica, disse que existe um saldo de 7,9 milhões de km² para uso residencial e de 4,8 milhões de km² já autorizados pela prefeitura para ampliação dessas atividades, portanto não precisaria haver a concessão de novos incentivos. “A rigor, o zoneamento está funcionando e é respeitado”, afirmou.
Ainda assim, a proposta prevê a ampliação dos limites para o porte de pequenos negócios, que passa de 100 m² para 200 m² e 400 m² (com outorga). “Pelos dados do IPTU, 60% dos negócios da cidade estão nesta faixa, e outros 30% até 400 m²”, informou Paranhos. Para os negócios de porte médio, nas vias coletoras e setoriais, o limite passa de 400 m² para 2.000 m², com possibilidade de chegar a 10.000 m². “O Ippuc é contra um grande empreendimento no meio de uma área residencial”, disse Paranhos, comentando a pergunta sobre a instalação de um shopping no Sítio Cercado. Mauro Bobato (Pode) havia questionado se algo “um pouquinho maior” poderia ser viabilizado na área. “Ali é possível chegar até 10 mil m². Mas [um empreendimento de] 50 mil m² não vai ficar dentro de uma zona residencial”, disse Paranhos.
Opondo-se à exposição, que para ele estaria com “valores invertidos na análise”, João Carlos Perussolo, do Sinduscon-PR, criticou a política de coeficientes para construção, privilegiando a outorga onerosa – pela qual o investidor precisa pagar à prefeitura para construir a totalidade de pavimentos permitidos. Colocando-se como representante de um coletivo de entidades chamado informalmente de G-10 (Asbea-PR, ACP, Ademi-PR, CVI-PR, Crea-PR, Fecomércio-PR, Fiep, IEP, Secovi-PR e Sinduscon-PR), disse que isso encarece a moradia e provoca um êxodo dos mais pobres para a região metropolitana.
Confira outras fotos da audiência pública no Flickr da Câmara de Curitiba.
“Não existe no Brasil nenhum caso onde aumentar o coeficiente [dos terrenos, permitindo a construção de mais pavimentos] diminui o valor da terra. É o contrário. Em outras cidades, a tendência é baixar [o coeficiente] para 1, pois o valor da outorga vai para o Fundo de Habitação de Interesse Social – que hoje quase não tem recursos”, disse Paranhos. Ele deu o exemplo da zona central, onde não havia distinção para uso residencial e comercial. “Falta habitação? Baixa-se a habitação. É preciso corrigir o Plano Diretor para forçar a entrada dos grandes terrenos vazios no mercado, com IPTU progressivo”, concluiu. Depois, à imprensa, Perussolo disse que as 10 entidades concordam com 95% da proposta.
Representando uma associação de moradores de Bigorrilho, Andrea Portela Regina dos Santos, opôs-se à mudança no zoneamento da área, que permitiria edificações com mais pavimentos que as encontradas hoje, na sua maioria casas. “Não somos contra o uso [misto], somos contra os parâmetros de construção, não cabem prédios ali”, disse. Sobre a mudança de zoneamento, Paranhos afirmou que a transição proposta era a melhor proposta técnica. “Não é que todos os prédios terão seis pavimentos”, pontuou, dizendo que quem desejar seguir ali não será impedido disso, mas que talvez haja valorização dos imóveis. “Vai ocasionar a expulsão? Talvez. Se as pessoas quiserem vender, venderão bem”. Manter as “casinhas”, somou, seria um abuso ao crescimento ordenado da cidade.
O que é a Lei de Zoneamento?
A Lei de Zoneamento, Uso e Ocupação do Solo é o instrumento legal que organiza a ocupação do território, define tamanhos mínimos e máximos de lotes, regula e estabelece limites para o uso do solo e para o tamanho, a forma, a altura e o recuo das edificações. Baseia-se no princípio de que a ocupação e os usos devem ser induzidos e disciplinados para evitar que aconteçam de forma desorganizada. Desta maneira, a lei busca garantir a qualidade da ocupação urbana. A revisão dela é etapa seguinte à modernização do Plano Diretor, aprovado em 2015. As regras atuais de zoneamento estão na lei 9.800/2000.
A proposta de revisão do Zoneamento, que deve passar pelas comissões de Constituição e Justiça, Acessibilidade, Meio Ambiente, Economia e Urbanismo, está organizada em 11 partes, que trazem a conceituação legal e quais são os eixos, zonas e setores especiais de Curitiba conforme as características, intensidade de uso e ocupação do solo. Também há regramentos para o uso, aproveitamento e ocupação do solo; sobre estacionamentos; empreendimentos inclusivos de habitação de interesse social; condições especiais de ocupação do lote; estudo de impacto de vizinhança; além de disposições finais e transitórias.
Já os critérios de uso e ocupação do solo para cada um dos eixos, zonas e setores estão definidos em 49 quadros anexos ao projeto de lei. Estes documentos estabelecem os parâmetros gerais de ocupação dos lotes, usos permitidos e permissíveis, coeficiente de aproveitamento, altura (quantidade de pavimentos), porte (em m²), porcentagem da taxa de ocupação, recuo (em metros), taxa de permeabilidade, afastamento das divisas (metros), e o tamanho do lote padrão. Ainda na proposição constam mapas do Zoneamento (geral), do Sistema Viário, do Setor Preferencial de Pedestres e da Zona Histórica.
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