Plenário acata prioridade à mulher em situação de violência

por Fernanda Foggiato | Revisão: Vanusa Paiva — publicado 30/03/2022 13h10, última modificação 30/03/2022 14h06
O projeto de Carol Dartora quer desburocratizar o acesso a procedimentos administrativos, como a transferência entre escolas.
Plenário acata prioridade à mulher em situação de violência

A celeridade, frisou Dartora, faz com que “a mulher possa se desvencilhar o mais rápido possível dessa violência”. (Foto: Rodrigo Fonseca/CMC)

Na manhã desta quarta-feira (30), em despedida das sessões em modelo híbrido, adotadas em função da pandemia da covid-19, a Câmara Municipal de Curitiba (CMC) debateu mais um projeto alusivo ao Mês da Mulher. Aprovada em primeiro turno unânime, com 34 votos favoráveis, a proposta de lei prioriza a mulher em situação de violência na tramitação de procedimentos administrativos junto ao Executivo. A autora, Carol Dartora (PT), disse que a ideia é desburocratizar e dar agilidade à solução de demandas no âmbito municipal, como a pedidos de transferência entre creches ou escolas públicas. 

A matéria contempla os processos e procedimentos administrativos em tramitação em qualquer órgão ou instância da administração pública municipal direta e indireta (005.00077.2021, com o substitutivo 031.00019.2022). Além da solicitação de vaga em creche ou escola, para que a mulher em situação de violência e os filhos possam se distanciar do agressor, a proposição cita a prioridade na distribuição dos procedimentos, na publicação de despacho na imprensa oficial e nas intimações. 

Para solicitar a prioridade, a mulher em situação de violência doméstica e familiar teria que apresentar cópias do boletim de ocorrência ou de outro documento expedido pela Delegacia da Mulher; do exame de corpo delito; e da queixa-crime ou do pedido de medida provisória. Conforme a proposta de lei, a documentação comprobatória seria válida pelo prazo de dois anos. Depois desse período, caso o processo não tenha transitado em julgado ou a mulher continue sob medida protetiva, seria feita uma nova solicitação. 

Dartora reforçou que o projeto quer criar “um espaço de segurança a mulher e a seus filhos”, combatendo a burocracia. “É com muita alegria que a gente faz essa discussão ainda no mês de março [alusivo ao Dia Internacional da Mulher]”, declarou. A desigualdade de gênero, para a vereadora, é reflexo da cultura machista e violenta. 

“É necessário que haja celeridade nesses processos, para que a mulher possa se desvencilhar o mais rápido possível dessa violência”, argumentou. “De repente [é necessária] uma transferência de creche, de escola, e ela passa por uma situação de ser revitimizada, porque às vezes são muitas burocracias, o processo é muito longo, e ela tem que ficar explicando porque precisa de agilidade. E isso é muito desgastante para quem já está vivendo uma situação de risco, sob ameaça”, justificou. 

“Que a gente possa se antecipar aos casos de feminicídio, encorajar a mulher a se desvencilhar de seu agressor”, continuou. Dartora ainda apresentou diversos dados sobre a violência doméstica, cujos registros aumentaram durante a pandemia da covid-19. No Brasil, citou a autora, a cada dois minutos uma mulher é agredida. 

De acordo com a pesquisa “Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher — 2021”, realizada pelo Instituto DataSenado, em parceria com o Observatório da Mulher contra a Violência, 68% das entrevistadas conhecem uma ou mais mulheres em situação de violência. Já 27% das mulheres ouvidas declararam já ter sofrido algum tipo de agressão por um homem. Dessas, 18% convivem com o agressor. 

Diálogo com o Executivo

“Quando os projetos são bons, quando há a construção de diálogo, quando se torna viável, nós [o Executivo] temos todo o interesse”, disse o líder do prefeito da Casa, Pier Petruzziello (PP). Ele e Dalton Borba (PDT) alertaram para a redação do parágrafo único ao artigo 2º, referente aos documentos exigidos para solicitar a prioridade. 

Para os vereadores, a apresentação da fotocópia de exame de corpo delito e da queixa-crime, além do boletim de ocorrência, poderia excluir as mulheres em situação de violência psicológica, moral ou patrimonial, por exemplo. Petruzziello sugeriu que a autora estude a apresentação de emenda, para a análise na votação em segundo turno. 

Líder da oposição, Professora Josete (PT) defendeu a realização de concurso público e a formação permanente dos servidores das unidades de saúde, “geralmente a porta de entrada para o acolhimento da mulher em situação de violência”, da área de assistência social e da Casa da Mulher Brasileira. “Numa lista de 84 países, o Brasil hoje é o 7º em número de feminicídios". 

Maria Leticia (PV), procuradora da Mulher na CMC, falou da importância do trabalho desenvolvido pela Patrulha Maria da Penha, vinculada à Guarda Municipal, e da “visão emancipadora, para que as mulheres efetivamente tenham acesso a espaços, inclusive a espaços de poder”. “Por mais que tenhamos leis como a Maria da Penha, todos os dias observamos a escalada da violência contra a mulher. Em todos os aspectos”, opinou Serginho do Posto (DEM). 

“O que a gente tem observado é que as normas não estão sendo cumpridas”, alertou Amália Tortato (Novo). A parlamentar lembrou das agressões flagradas em sacada de prédio do Bigorrilho, na noite do último dia 18, e da dificuldade que uma das vizinhas teve para registrar a ocorrência. “Por que falaram para ela voltar na segunda-feira? Eu não consigo me conformar com essas coisas”, acrescentou. Ela chegou a apresentar pedido de informações oficiais sobre a questão (062.00196.2022). 

Se confirmada em segundo turno, na sessão da próxima segunda-feira (4), e sancionada pelo prefeito, a lei entrará em vigor 90 dias após a publicação no Diário Oficial do Município (DOM). As sessões plenárias começam às 9 horas e são transmitida pelos canais da CMC no YouTube, no Facebook e no Twitter. 

Mês da Mulher

A pauta alusiva ao Mês da Mulher, na Câmara de Curitiba, teve outros debates e ações. O plenário confirmou, no dia 9 de março, projeto para a criação de campanha educativa sobre a pobreza menstrual, à espera de sanção (005.00063.2021). A iniciativa, de Maria Leticia, sugere às escolas municipais a oferta de absorventes higiênicos, calcinhas absorventes e coletores menstruais às alunas.  

Nessa terça-feira (29), os vereadores aprovaram, em segundo turno unânime, proposta de lei voltada à inserção da mulher em situação de violência no mercado de trabalho (005.00058.2021). O projeto é de autoria de João da 5  Irmãos e de Flávia Francischini, ambos do PSL. 

No último sábado (26), a praça Eufrásio Correia recebeu o Dia da Cidadania, ação da seccional Paraná da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-PR) com o apoio da Procuradoria da Mulher (ProMulher) da CMC. Além de um dia dedicado à mulher, em 24 de março, foram realizadas homenagens às servidoras da Casa e a personalidades femininas da capital, durante sessão solene organizada pelas vereadoras.