CMC aprova aplicação da Reforma Previdenciária em 2º turno
Com rito diferenciado, a Emenda à Lei Orgânica tem intervalo de 10 dias entre os turnos de votação em plenário. (Foto: Rodrigo Fonseca/CMC)
Em sessão híbrida nesta terça-feira (26), a Câmara Municipal de Curitiba (CMC) finalizou a discussão da mensagem do Executivo que aplica dispositivos da Emenda Constitucional 103/2019, a Reforma da Previdência, ao funcionalismo público da capital. O projeto foi aprovado em segundo turno com 27 votos favoráveis e 11 contrários, atendendo à exigência da maioria qualificada – ou seja, o posicionamento favorável de 2/3 do plenário, o equivalente a pelo menos 26 dos 38 vereadores (001.00002.2021).
No primeiro turno, na sessão de 13 de outubro, o placar foi de 27 votos favoráveis e 9 contrários, depois de 6h25 de discussão. Outro trâmite diferenciado, por se tratar de Emenda à Lei Orgânica do Município (LOM), a Constituição de Curitiba, foi o intervalo de 10 dias entre as votações. Antes disso, dentro do rito específico, a mensagem foi analisada por comissão especial.
Emendas à LOM não são encaminhadas para a sanção do prefeito – e sim, de acordo com o artigo 51, parágrafo 6º, da própria Lei Orgânica, dependem de promulgação pela Mesa Diretora da Câmara. O mesmo artigo, no parágrafo 5º, diz que a alteração pode ser submetida a referendo. Para tal, é necessário a manifestação de 5% do eleitorado de Curitiba ou de metade dos vereadores, no prazo de até 60 dias após a aprovação da matéria.
As alterações
A mensagem prepara a legislação municipal para alterações futuras no regime previdenciário dos servidores públicos da capital do Paraná, por meio de projetos de lei complementares. Em resumo, as modificações incidem sobre os artigos 91 e 94 da LOM, tratando da idade mínima, da aposentadoria especial dos professores, da previdência complementar e da redução da isenção de contribuição dos beneficiários do IPMC que ganham acima do teto do INSS (saiba mais).
Segundo o Executivo, a intenção é migrar do atual regime previdenciário de repartição (quando a contribuição dos funcionários da ativa custeiam o pagamento dos beneficiários) para o de capitalização (quando as contribuições do servidor custeiam sua própria aposentadoria). No artigo 91, a proposta fixa as novas idades mínimas de 62 e 65 anos, respectivamente, para homens e mulheres, com o redutor de 5 anos para professores, desde que comprovado o “efetivo exercício das funções de magistério”.
Ainda no artigo 91, o texto aponta que futura lei complementar detalhará “os requisitos e critérios de concessão de aposentadoria e pensão por morte, bem como regras de transição de aposentadoria”. Há a previsão que servidores com experiência em outros poderes públicos terão isso incorporado, para fins de aposentadoria, considerando os fatores do tempo de contribuição e do tempo de serviço.
No artigo 94, a nova redação detalha a atuação do IPMC e formaliza, na LOM, a figura do Regime de Previdência Complementar – criado com o chamado Plano de Recuperação de Curitiba, em 2017 (leia mais). Como no item anterior, é delegada a leis complementares, posteriormente, como passará a ser paga a pensão a dependentes e os termos da contribuição previdenciária de servidores e segurados.
É nesse item que o Executivo estabelece as bases para mudar a contribuição previdenciária recolhida por aposentados e pensionistas. Diz o projeto: “verificada a existência de deficit atuarial, a contribuição ordinária dos aposentados e pensionistas poderá incidir sobre a integralidade do valor dos proventos de aposentadoria e pensões por morte, garantida a isenção de contribuição sobre, ao menos, o valor correspondente a um salário mínimo, na forma do que for disposto em lei complementar”.
Lei complementar
Segundo o líder do prefeito, Pier Petruzziello (PTB), projeto de lei complementar, com as regras de transição e outras especificações, será encaminhado à CMC nesta semana. O vereador defendeu que a adequação “não resolve o problema 100%”, mas garante a “sustentabilidade real” da folha de pagamento do IPMC pelos próximos anos, sem onerar outras áreas do orçamento municipal, como a saúde e a educação. “Nós vamos daqui a pouco ter que discutir o plano de carreira do servidor também.”
“É importante dizer que o que estamos votando neste momento é a [aplicação da] Emenda Complementar 103. Estamos alterando a idade de aposentadoria, para que o servidor público trabalhe e contribua um pouco mais”, declarou. Na opinião do líder, o deficit atuarial do IPMC, de R$ 14,5 bilhões, é uma questão que não se pode “empurrar com a barriga”, para futuras gestões: “Ninguém quer se aposentar sem receber, porque me parece inclusive que é o que pode acontecer se a gente votar contrário. Alguém tem que ter coragem para resolver o problema”.
Já a líder da oposição, Carol Dartora (PT), argumentou que os Estados e Municípios não são obrigados a reproduzir a EC 103: “Não existe essa exigência. A gente não está aqui com a faca no pescoço precisando fazer esta reforma”. Em sua avaliação, o desequilíbrio foi aprofundado após a revogação, em 2017, da lei municipal 12.821/2008, que determinava ao Executivo a realização de aportes mensais extras ao instituto, com o objetivo de sanar o deficit atuarial.
A vereadora alertou que lei complementar trará mudanças nas regras para o pagamento de pensões, dentre outros pontos. “E as consequências são gravíssimas. O que a gente percebe em resumo que os servidores vão pagar mais, por mais tempo, para receber menos”, opinou.
Debate ampliado
Além dos líderes da base e da oposição, mais 11 dos 38 vereadores participaram da discussão da proposta de alteração da LOM. Em debate com pouco mais de 3 horas, Petruzziello, Serginho do Posto (DEM), Sargento Tânia Guerreiro (PSL), Marcelo Fachinello (PSC), Amália Tortato e Indiara Barbosa, ambas do Novo, defenderam a proposta em pauta.
Já Dartora, Dalton Borba (PDT), Maria Leticia (PV), Noemia Rocha (MDB), Professor Euler (PSD), Professora Josete (PT) e Renato Freitas (PT) se posicionaram contra a alteração da LOM. A sessão foi suspensa, assim como no primeiro turno, para falas de representantes de sindicatos dos servidores municipais (confira).
“Mesmo que não houvesse a PEC 103, os Municípios teriam que fazer esses ajustes. Os Estados teriam que fazer esses ajustes”, disse Serginho do Posto. O vereador ponderou que o projeto “chegou [a plenário] com essa condição de ser votado” após debate em audiência pública e avaliação em comissão especial. A responsabilidade do Município, continuou, é manter os pagamentos das aposentadorias e pensões em dia, e para isso é necessário o equilíbrio atuarial. “É uma matéria que não é nada simpático para o legislador aprovar. Porém, nós temos que ter a responsabilidade.”
Apesar de declarar o voto favorável, a Sargento Tânia Guerreiro defendeu o tratamento diferenciado, na lei complementar, aos servidores da Guarda Municipal e da saúde, além do magistério. “O projeto de lei complementar será enviado o mais breve possível, para que se tenha tempo para o debate”, encaminhou Fachinello.
Para Indiara, os ajustes significam “responsabilidade com as futuras gerações e os servidores públicos”. Ela acredita que tanto a Câmara quanto a Prefeitura de Curitiba estiveram abertas ao diálogo. “Sim, vamos ter que enfrentar este tema, daqui um tempo, de novo”, completou. “As aposentadorias do INSS são muito abaixo que as aposentadorias dos servidores, nós sabemos. Há os benefícios que não se sustentam.”
Assim como no primeiro turno, Amália Tortato comparou a Previdência brasileira “a uma pirâmide financeira”, em que “as pessoas que estão trabalhando hoje estão pagando as aposentadorias de quem está recebendo”. “O que a gente está fazendo é um remendo, isso não vai funcionar. Daqui a dois, três ou quatro anos, a gente vai estar aqui discutindo a reforma, ou remendo, da Previdência.” Na Holanda e na Dinamarca, citou, homens e mulheres se aposentam com a mesma idade, independentemente da profissão, e recebem, do governo, o mesmo valor.
“Nós não podemos comparar o Brasil, um país de dimensões continentais, com a Holanda e a Dinamarca. Não podemos comparar com a economia do Brasil”, respondeu Dalton Borba. Sobre a aplicação da EC 103, o vereador reforçou o posicionamento contrário porque a proposta não atenderia aos princípios da legalidade, da constitucionalidade e da isonomia. “O servidor já está pagando esta conta, sempre pagou. Não adianta trazer a Previdência da Holanda, da Dinamarca, porque não se aplica no Brasil.”
Noemia Rocha apontou que a lei municipal 15.042/2017, além de revogar legislação de 2008 para os aportes extras, antecipou outras alterações, como o aumento da alíquota de contribuição do funcionalismo e a devolução de cerca de R$ 600 milhões, referentes à contribuição patronal de servidores aposentados e pensionistas, ao Executivo. “Eles foram já penalizados com uma reforma fora de hora.”
Para Professora Josete, é necessário diálogo com o Executivo e superar a “falsa dicotomia” entre os direitos dos servidores e os interesses da população. “Política pública se faz com servidor público valorizado, reconhecido. […] Dialogando com aqueles que estão lá na ponta, garantindo o atendimento à população”, argumentou. Ela ainda questionou os cálculos atuariais: “Vira e mexe as coisas mudam, conforme as necessidades da prefeitura. Então não são os servidores que têm que pagar por isso”.
Presidente da Comissão de Participação Legislativa, Professor Euler lembrou que o artigo 51 da LOM, no parágrafo 5º, sujeita a emenda à realização de referendo, caso haja, dentro de 60 dias, a manifestação de metade dos vereadores ou de 5% do eleitorado da capital, “o que corresponde a 65 mil assinaturas”. “Independentemente do resultado que teremos hoje aqui, este resultado não terá efeito porque vamos coletar mais de 65 mil assinaturas e vai para consulta popular, no ano que vem [junto às eleições]”, prevê.
A procuradora da Mulher da CMC, Maria Leticia, apresentou recorte de gênero da idade mínima estipulada à aposentadoria voluntária das servidoras, de 62 anos para as servidoras e de 65 para os servidores, com 5 anos a menos para o magistério. Em sua avaliação, a medida aumenta a sobrecarga para as mulheres, que são a maior parte do funcionalismo municipal.
Renato Freitas retomou críticas às alterações acatadas em 2017, além de falar do "sucateamento do Estado”, sem que concursos públicos reponham os servidores da ativa, e da "forma que [o projeto] traz este conteúdo”. “É absolutamente viciada. Para o resultado que quer o prefeito”, declarou. Também questionou a idade mínima proposta para a aposentadoria, “com a justificativa de uma suposta longevidade”, e a possível taxação de aposentados e pensionistas com os menores salários, “em meio a uma pandemia”. “Quem vai pagar a conta desta reforma é o funcionalismo público de base”, opinou.
Dentre outros projetos, os vereadores também concordaram, nesta manhã, com mensagem do Executivo para aporte de R$ 50 milhões ao Instituto Curitiba de Saúde, o ICS (saiba mais). As sessões plenárias têm transmissão ao vivo pelos canais da CMC no YouTube, no Facebook e no Twitter.
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