Câmara faz 318 anos com Curitiba

por Michelle Stival da Rocha — publicado 24/03/2011 11h50, última modificação 27/08/2020 14h07
Câmara faz 318 anos com Curitiba

Tela Fundação de Curitiba, de Theodoro de Bona, que está no Colégio Estadual do Paraná. Foi encomendada pelo prefeito Algacyr Mäder e pintada no Rio de Janeiro. (Foto - Irene Roiko)

Em 24 de março de 1693, o Capitão Povoador Mateus Leme recebia petição dos moradores para “ajuntar e fazer eleição e criar justiça e câmara formada, para que assim haja temor de Deus e d'el-Rei e pôr as coisas em caminho”. É com esta aclamação da população que, cinco dias depois, é fundada a Vila de Nossa Senhora da Luz dos Pinhais (Curitiba). Este relato, citado no livro Curitiba 300 Anos, retrata as necessidades do pequeno povoado, que já passava de “noventa homens”.

O requerimento cita algumas situações que justificavam o pedido de instalação da Câmara. “... e quanto mais cresce a gente se vão fazendo maiores desaforos, e bem se viu esta festa andarmos todos com as armas na mão, e apeloirou-se (apelou-se) dos outros mais e outros insultos de roubos, como é notório e constante pelos outros casos que têm sucedido e daqui em diante será pior, o que tudo causa o estar deste dito povo tão desamparado de governo e disciplina da justiça”.

A partir daí, a história de Curitiba começa a ser registrada oficialmente nas atas da Câmara Municipal, fundada juntamente com a Vila, em 29 de março de 1693. A Câmara foi o primeiro órgão administrador de Curitiba. Ao longo destes 318 anos, este parlamento teve papel decisivo para o desenvolvimento e crescimento da cidade. Todas as decisões administrativas passaram por discussões na Casa, desde construção de ruas, praças, até planos diretores e legislações a respeito do comportamento social.

Naquele ano de fundação, a Câmara Municipal era um conselho formado por dois juízes e três vereadores. Além deles, faziam parte da administração da Vila o procurador, o tesoureiro e o escrivão. Também existiam as figuras do almotacel (fiscal do peso), o alcaide (chefe de polícia) e o porteiro. Este último era o responsável pela divulgação das ordens da Câmara e, conforme a importância da medida tomada pela Casa, esta era afixada em edital ou anunciada “a toque de caixa” pelas ruas da cidade.

Formação da cidade
No início da colonização da Vila, a ordem da Coroa Portuguesa para a Câmara era tornar o cenário o mais urbano possível e formar definitivamente uma cidade que serviria de apoio às tropas lusitanas que queriam conquistar o Brasil Meridional, disputado com a Espanha.

Aos poucos, foi sendo paginada, com as casas ordenadas no formato urbanístico mais padronizado possível, de acordo com as orientações recebidas do reino de Portugal. Com o passar do tempo, também iam se definindo os comportamentos e regras para um bom convívio entre os moradores.

No início da colonização, a Vila se desenvolvia devagar, muito diferente do que se vê hoje. Em 14 de julho de 1783, um registro das atas revela que a Câmara exigia dos moradores cuidados que “formozeassem” a Vila e sua paisagem “urbana”. Estes cuidados iriam desde manter as casas em ordem, a auxiliar nas construções em benefício da população. Os próprios moradores eram incumbidos das obras públicas, como pontes e estradas. Eram nomeados pela Câmara, a mando da Coroa.

O cenário foi mudando. Animais soltos pelas ruas, comuns até meados do seculo XVIII não eram mais permitidos. Reiteradas vezes, a Câmara deliberava sobre a permanência deles na Vila, como numa ata de 1748, que determinou que “se exterminasse os porcos ou os enchiqueirasse para que não andassem soltos, causando prejuízos e danos”.

Passados mais de cem anos, também não se admitia mais a “lavagem de roupas” na Carioca de Baixo (atual Praça Zacarias), como relata uma ata de 1860, que incumbia um fiscal de proibir tal ato na fonte. A praxe era recorrente desde o início da colonização. Por não haver água encanada na cidade, as pessoas se aproveitavam deste recurso próximo.

Um pouco antes disso, a Vila havia sido elevada à categoria de cidade. Em 26 de julho de 1854, a lei número 1, do presidente da província, Zacarias de Góes e Vasconcelos, fixava-a como capital da província. Até então, todas as capitais ficavam em cidades litorâneas. Curitiba, que disputava o posto com Paranaguá, foi escolhida, apesar da pouca fé de que prosperaria longe do mar. Prosperou.

Por muitos anos a Câmara ainda exerceu poder administrativo na cidade. Após a proclamação da República, em 1889, a figura do prefeito como administrador do município passou a ser mais evidente e foram então se delineando os limites entre os poderes Executivo e Legislativo.

Quase cem anos depois, após ter passado por duas ditaduras, a delimitação efetiva de suas atribuições veio com a Constituição de 1988. Foi instituído um papel representativo da população e restaurou-se a função de criar leis em benefício do município.


Referências Bibliográficas: As informações históricas contidas neste artigo foram retiradas dos manuscritos existentes na Câmara; dos Boletins do Archivo Municipal de Curitiba (B.A.M.C.), de Francisco Negrão, e do livro 300 Anos - Câmara Municipal de Curitiba 1693-1993.