Câmara de Curitiba mantém veto ao estacionamento no recuo
Com 21 votos favoráveis, 13 contrários e 2 abstenções, a Câmara Municipal de Curitiba (CMC) acatou, nesta segunda-feira (19), o veto total do prefeito ao projeto de lei que previa o uso do recuo obrigatório para a circulação e o estacionamento de veículos. Sujeita à avaliação do Conselho Municipal de Urbanismo (CMU), a permissão poderia ser solicitada por comércios, prestadores de serviços e edificações de uso comunitário – ou seja, destinadas a cultos religiosos, lazer, cultura, saúde e assistência social (005.00001.2017). De iniciativa de Bruno Pessuti (PSD), a proposta havia sido confirmada em plenário na sessão de 18 de setembro (saiba mais).
O debate começou após o pequeno expediente e ocupou toda a ordem do dia e o restante do tempo regimental da sessão. “Será um tempo a mais [de espera] para nosso cidadão”, disse Pessuti sobre a emenda proposta pelo Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba (Ippuc) ao projeto de revisão da Lei da Zoneamento, Uso e Ocupação do Solo, em tramitação na CMC e que deve ser votado em 2019 (005.00105.2018). Apesar disso, ele comemorou a possibilidade de se regulamentar a questão, já que o artigo 215 da proposta enviada à Casa reforça a proibição ao estacionamento no recuo frontal, inclusive no subsolo.
O dispositivo era, inclusive, uma das justificativas do Executivo para o veto total. Já a emenda proposta do Ippuc, apresentada em plenário por Bruno Pessuti, autorizaria o estacionamento “em caráter excepcional, quando o recuo não for necessário para a ampliação do sistema viário”. “Temos que esclarecer que não se trata da calçada”, justificou o vereador. Ele lembrou do adiamento de projeto semelhante, de sua iniciativa, na legislatura passada, que depois disso não retornou à pauta e foi arquivado.
“O estacionamento no recuo é realizado em uma área particular. Que ele [empresário] paga por isso e mantém a empregabilidade de diversas pessoas”, acrescentou Pessuti. Sobre os casos autorizados pelo Executivo, argumentou que ocorrem “à revelia da lei” – exceto quando o recuo possui mais de 15 metros ou em habitações unifamiliares, situações previstas em decreto municipal. “Nós não queremos que a Secretaria [Municipal] da Defesa Social precise trocar de lugar porque os carros estão estacionados ali”, citou, dentre outros exemplos. “É possível regulamentar, é possível resolver este problema. Simplesmente vedar não é a solução.”
Recuo são as faixas junto aos limites do terreno que não podem conter edificações. O frontal, por exemplo, é o espaço entre o imóvel e o passeio (a calçada), no qual o projeto mantém a proibição ao estacionamento. O texto também alertava ao cumprimento da taxa mínima de permeabilidade do lote (área capaz de absorver chuva) e indicava a aplicação de multa de R$ 400 à utilização do recuo sem a autorização da Prefeitura de Curitiba. O projeto alteraria os artigos 116 e 314 da lei municipal 11.095/2004, o Código de Posturas da cidade.
Para embasar o veto, o Executivo também apontava vício de iniciativa, por se criar suposta atribuição ao CMU, e eventual diminuição das áreas de solo permeáveis, além de prejuízo à paisagem urbana e à arborização. O ofício ainda argumentava que aumentariam as guias rebaixadas, deixando o pedestre “muito mais vulnerável a possíveis atropelamentos” e dificultando a implantação de abrigos de ônibus e outros mobiliários.
Defesa
Em reunião no dia 19 de setembro, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) havia recomendado a derrubada do veto. O colegiado acatou o parecer de Felipe Braga Côrtes (PSD), para quem a iniciativa não cria atribuições ao Conselho Municipal de Urbanismo, o qual já teria a competência de “julgar questões referentes à matéria urbanística”. “As justificativas não se sustentam”, defendeu o vereador, nesta segunda, quando rebateu tecnicamente os argumentos do Executivo. “São desculpas.”
O parecer afirma, por exemplo, que o acesso aos imóveis e garagens regulares já ocorre pela guia rebaixada, “sem que isso represente risco especial aos ciclistas e pedestres”. “A lei vai fazer que o conselho possa efetivamente tomar decisões conforme o caso. Não vai abrir [liberar] para todos”, declarou Braga Côrtes. “A retirada das vagas de estacionamento nas vias faz com que os comércios de rua fechem. Quando a faixa amarela passa na frente, para o trânsito é bom, mas para o comércio é um horror.”
“Ele [o projeto] regulamenta uma questão que está irregular em nossa cidade. Imagine a Setran [Secretaria Municipal de Trânsito] multando a própria Setran”, complementou Noemia Rocha (MDB) sobre imóveis em que há estacionamento no recuo. Em sua avaliação, o pedido para se deixar o debate para a Lei de Zoneamento pode ser atribuído à “vaidade” do prefeito. Os vereadores Goura (PDT), Professor Euler (PSD) e Professora Josete (PT) também participaram do debate, em defesa da derrubada do veto.
Contrapontos
“Não podemos nos esquecer que a lei é genérica, é universal. Não pode valer só para quem tem comércio”, ponderou Julieta Reis (DEM), favorável à manutenção do veto. A decisão, para ela, não seria apenas jurídica, mas também urbanística. “O veto fala que temos que discutir esta questão na Lei de Zoneamento”, completou. “Aprovar uma lei esparsa, sozinha, é muito complicado. Vamos dar um voto de confiança ao Ippuc.” A parlamentar ainda alertou à impermeabilização do solo e disse que “não podemos cimentar tudo”.
“Temos que ser responsáveis por nossas atitudes, senão seremos cobrados”, argumentou o primeiro vice-líder do Executivo na CMC, Sabino Picolo (DEM), sobre eventuais atropelamentos no recuo obrigatório. “O prefeito está pedindo uma oportunidade. Que se faça um amplo debate durante a Lei de Zoneamento. Vamos deixar tudo para o conselho decidir? Vamos fazer leis aqui. Leis claras”, acrescentou. “Vou fazer um apelo para que cessem ou diminuam as notificações [aos estabelecimentos].”
Presidente da Comissão de Urbanismo, Obras Públicas e Tecnologias da Informação, Helio Wirbiski (PPS) concordou com o debate junto à Lei de Zoneamento, “de uma forma coerente e que preserve vidas”. Para ele, uma discussão mais amplia traria “segurança jurídica” aos empresários. O vereador disse que devem ser abordados temas como as vagas de estacionamento em bares, a permeabilidade do solo e o incentivo ao uso da bicicleta. “Estamos criando mais burocracia”, opinou, sobre a autorização depender do aval do CMU, no texto que teve o veto mantido.
Segundo Toninho da Farmácia (PDT), o Ippuc e a Secretaria do Governo Municipal se comprometeram a contemplar a questão no novo Zoneamento – por meio de emenda ao artigo 215. Caso contrário, avaliou ele, os alvarás continuarão a ser negados, já que era prevista a análise caso a caso, pelo CMU. Geovane Fernandes (PTB), Jairo Marcelino (PSD) e Oscalino do Povo (Pode) também defenderam a manutenção do veto e o debate junto a Zoneamento.
Em resposta a Julieta Reis, Pessuti disse que o Código de Posturas não é uma legislação esparsa. Sobre eventuais acidentes devido ao estacionamento no recuo, alegou que a lei dependeria de posterior decreto do Executivo. “Claro que a segurança é primordial. Na regulamentação de Belo Horizonte, as entradas e saídas são feitas de forma paralela.”
A rejeição do veto precisaria do voto da maioria absoluta dos 38 vereadores – “metade mais um”, ou seja, 20 parlamentares. Nesse caso, o projeto seria reenviado ao prefeito, que teria 48 horas para promulgá-lo – se não o fizesse, o presidente do Legislativo deveria promulgar a lei integralmente, dentro do mesmo prazo. A base legal para essa tramitação está na Lei Orgânica do Município (artigos 46, 47 e 57) e no Regimento Interno da CMC (artigos 163, 197 e 198). Agora, com a manutenção do veto, o projeto de lei de Bruno Pessuti será arquivado.
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