Câmara avalia restrição ao uso de sistemas de reconhecimento facial

por José Lázaro Jr. | Revisão: Vanusa Paiva — publicado 08/07/2022 16h10, última modificação 08/07/2022 16h32
Projeto prevê que a tecnologia não poderá ser usada indiscriminadamente na cidade.
Câmara avalia restrição ao uso de sistemas de reconhecimento facial

Projeto quer restringir o uso da tecnologia de reconhecimento facial em Curitiba. (Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil)

Foi protocolado, na Câmara Municipal de Curitiba (CMC), um projeto de lei que proíbe o uso indiscriminado da tecnologia de reconhecimento facial na cidade, prevendo que o poder público aplicará restrições a esses sistemas quando eles forem utilizados na segurança pública e na identificação em massa de cidadãos em espaços públicos. A proposição baseia-se em pesquisas recentes sobre essas tecnologias, que revelam haver mais falhas de reconhecimento entre mulheres e pessoas negras, levando a um grande número de falsos positivos (005.00138.2022).

“A tecnologia do reconhecimento facial primeiro coleta a imagem do rosto, logo depois o sistema identifica métricas específicas da pessoa, como a distância entre os olhos, largura do queixo e o comprimento da boca. Por fim, esses dados biométricos são combinados em uma espécie de assinatura facial, que é então comparada com outras já armazenadas em um banco de dados. Somente quando as assinaturas faciais são compatíveis, em teoria, seria possível identificar um sujeito de forma automatizada”, explica a justificativa, antes de apontar os problemas da tecnologia.

A proposição alerta que a coleta dessas informações podem ser utilizadas indevidamente, como indica uma decisão recente, de março de 2021, da Autoridade Europeia de Proteção de Dados, que “emitiu um parecer pedindo o banimento de tecnologias de reconhecimento facial em todo o bloco europeu”. Também argumenta que essas ferramentas criadas no exterior são ensinadas a reconhecer rostos a partir de exemplos de homens brancos, logo apresentam muitos erros em estabelecer assinaturas faciais de mulheres e de pessoas negras, levando a um número elevado de falsos positivos. 

“Em 2019, na Micareta de Feira de Santana, na Bahia, o sistema de videomonitoramento capturou os rostos de mais de 1,3 milhão de pessoas, gerando 903 alertas, o que resultou no cumprimento de 18 mandados e na prisão de 15 pessoas, ou seja, de todos os alertas emitidos, mais de 96% não resultaram em nada”, exemplifica a justificativa. “Estados e Municípios têm adquirido sistemas de reconhecimento facial por dezenas de milhares de reais ao mesmo tempo em que outras áreas importantes para os cidadãos estão sem o devido financiamento”, defende a proposição.

O projeto tem 25 itens, distribuídos em 10 artigos, sendo que o artigo 3º é onde estão dispostas as situações em que deve ocorrer a restrição do reconhecimento facial na cidade. O projeto veda ao poder público indiscriminadamente “obter, adquirir, reter, vender, possuir, receber, solicitar, acessar, desenvolver, aprimorar ou utilizar tecnologias de reconhecimento facial ou informações derivadas de uma tecnologia de reconhecimento facial”. Também aplica as mesmas condições a contratos com terceiros, a convênios com pessoas jurídicas e a vigilâncias continuadas de munícipes ou de um grupo de indivíduos.

O uso não autorizado de tecnologias de reconhecimento facial, ou em desacordo com a regulamentação da lei, deverá ser interrompido e as informações coletadas deverão ser excluídas em até “dez dias da descoberta do fato”. O projeto prevê genericamente a aplicação de multa nessas situações, cuja receita seria revertida às políticas de direitos humanos de Curitiba. As únicas exceções são as pesquisas científicas e equipamentos em uso por servidores públicos que dependem do reconhecimento facial para serem utilizados. A iniciativa é de Carol Dartora (PT).

Tramitação
Quando um projeto é protocolado na CMC, o trâmite regimental começa com a leitura da súmula dessa nova proposição durante o pequeno expediente de uma sessão plenária. A partir daí, o projeto segue para instrução da Procuradoria Jurídica (Projuris) e, na sequência, para a análise da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). Se acatado, passa por avaliação de outros colegiados permanentes do Legislativo, indicados pela CCJ de acordo com o tema da proposta.

Durante a fase de tramitação, podem ser solicitados estudos adicionais, juntada de documentos, revisões no texto ou posicionamento de outros órgãos públicos a respeito do teor da iniciativa. Após o parecer das comissões, a proposição estará apta para votação em plenário, sendo que não há prazo regimental previsto para a tramitação completa. Caso seja aprovada, segue para a sanção do prefeito para virar lei. Se for vetada, cabe à Câmara dar a palavra final – se mantém o veto ou promulga a lei.

Restrições eleitorais
Em respeito à legislação eleitoral, a comunicação institucional da CMC será controlada editorialmente até o dia 2 de outubro. Nesse período, não serão divulgadas informações que possam caracterizar uso promocional de candidato, fotografias individuais dos parlamentares e declarações relacionadas a partidos políticos, entre outros cuidados. As referências nominais serão reduzidas ao mínimo razoável, de forma a evitar somente a descaracterização do debate legislativo.

Ainda que a Câmara de Curitiba já respeite o princípio constitucional da impessoalidade, há dez anos, na sua divulgação do Poder Legislativo, publicando somente as notícias dos fatos com vínculo institucional e com interesse público, esses cuidados são redobrados durante o período eleitoral. A cobertura jornalística dos atos do Legislativo será mantida, sem interrupção dos serviços de utilidade pública e de transparência pública, porém com condicionantes (saiba mais).