Câmara aprova “super” Fundo de Abastecimento Alimentar
As hortas comunitárias, que fazem parte da política de segurança alimentar, foram citadas na discussão. (Foto: Rodrigo Fonseca/CMC)
Em primeiro turno unânime, a Câmara Municipal de Curitiba (CMC) aprovou, nesta segunda-feira, o projeto do Executivo com o objetivo de reestruturar o Fundo de Abastecimento Alimentar de Curitiba (Faac). Acatada com 36 votos positivos, a mensagem dobra as fontes de receita, prevê a expansão das atividades e eleva o fundo ao status do Programa Armazém da Família (005.00191.2022).
Sob a gestão da Secretaria Municipal de Segurança Alimentar e Nutricional (SMSAN), o Faac é regulamentado pela lei municipal 7.462/1990, norma que foi atualizada pela última vez em 2020. Além do secretário Luiz Gusi, técnicos da pasta acompanharam a votação.
O objetivo do Faac, conforme a norma, é “desenvolver ou apoiar financeiramente programas e projetos que visem à produção e aquisição de gêneros alimentícios, produtos de limpeza, higiene pessoal e demais produtos que visem à promoção da saúde e qualidade de vida da população, destinados à oferta aos consumidores de baixo poder aquisitivo, com renda familiar de até cinco salários mínimos nacionais vigente, assim como para custear benfeitorias necessárias aos equipamentos destinados às ações de segurança alimentar e nutricional”.
Assinada pelo prefeito Rafael Greca, a justificativa da mensagem diz que a adequação da lei que rege o Faac é necessária devido à “expansão, abrangência e significativo desenvolvimento das políticas de segurança alimentar e nutricional nos últimos anos, capitaneadas pelo Município, bem como a atualização dos procedimentos administrativos e operacionais relativos ao Programa Armazém da Família”.
O projeto da Prefeitura de Curitiba reescreve o artigo 1º da lei municipal vigente, para que o Fundo de Abastecimento Alimentar possa realizar investimentos, além de apenas arcar com as despesas de custeio relacionadas às políticas públicas de segurança alimentar, em especial ao Armazém da Família. Outra alteração é que as atribuições do Faac passam a contar com a promoção de ações educativas e de conscientização sobre a segurança alimentar.
Hoje, o Fundo de Abastecimento pode basicamente receber dinheiro de cinco fontes: recursos próprios, convênios com outros entes públicos, rendimentos, transferências intraorçamentárias e o saldo de anos anteriores. A proposta enviada à CMC facilita ao Faac receber doações da iniciativa privada (dinheiro ou bens móveis e imóveis de pessoas físicas ou jurídicas que disponham de seus recursos para apoiar e fomentar ações sociais, programas ou projetos financiados pelo Fundo), reinvestir ressarcimentos de valores pagos por produtos parcialmente subsidiados e receber valores provenientes de imposição de multas no âmbito de competência da SMSAN.
Para capacitar tanto o Faac quanto a execução do Programa Armazém da Família ante a legislação nacional de assistência social, o projeto os declara formalmente de “relevante interesse coletivo”. Metade do projeto é dedicada ao detalhamento do funcionamento dos armazéns, cuja legislação já sofreu modernizações nos últimos anos. A proposta ainda retira o prazo máximo de 30 dias para prestação de contas anual do Faac ao Legislativo.
O projeto recebeu duas emendas da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), apenas para adequações na técnica legislativa do texto (034.00068.2022 e 034.00069.2022). As proposições também foram acatadas com unanimidade. Se confirmada em segundo turno, com votação prevista para a sessão desta terça-feira (20), e na sequência sancionada pelo prefeito, a lei entrará em vigor com a publicação no Diário Oficial do Município (DOM).
Debate em plenário
Presidente da Frente Parlamentar da Segurança Alimentar e Nutricional, Professora Josete (PT) abriu a discussão. Ela também faz parte do Conselho Municipal de Segurança Alimentar e Nutricional, onde tem direito à voz, mas não a voto. Para a vereadora, “nós precisamos ter essa pauta como prioritária, nos diversos níveis de governo”. Além da fome, pontuou, o debate é “mais amplo” e envolve questões como os ultraprocessados, o abastecimento interno e a monocultura.
Josete defendeu a aprovação do projeto de lei e falou ainda da importância da agricultura familiar. “Hoje, 70% dos alimentos que chegam à mesa dos brasileiros vêm da agricultura familiar, porque a opção do agronegócio, dos grandes produtores, é a exportação, muitas vezes usando transgênicos, uma imensa quantidade de agrotóxicos.”
“Essa não é uma pauta de direita ou de esquerda, é uma pauta universal”, destacou o líder do governo, Pier Petruzziello (PP). “Nós vamos ser vencedores realmente quando a gente não assistir mais a essas cenas [de pessoas em situação de vulnerabilidade]. Quem sabe um dia a gente não precise mais discutir esse programa.”
Com a modernização da lei, pontuou, será possível “ampliar a pauta de itens dos Armazéns da Família”. “Ou seja, você amplia a gama de produtos, traz um produto saudável, um produto bom e mais barato”, explicou. “Essa cadeia é a segurança alimentar: produto saudável, qualidade, variação de produtos e baixo preço.”
Maria Leticia (PV) observou que o Brasil, nos últimos anos, retornou ao Mapa da Fome. “Em 2022, chegamos ao alarmante quadro de 33 milhões de pessoas em insegurança alimentar”, citou. Na esfera municipal, a vereadora falou, dentre outros pontos, do aumento da obesidade infantil, indicado no último relatório da Secretaria Municipal da Saúde (SMS).
A proposta, disse Serginho do Posto (União), “faz com que tenhamos uma segurança jurídica em torno do fundo”. Um programa com destaque no debate do projeto de lei foram as hortas comunitárias. “As hortas urbanas são uma referência, declarou Mauro Bobato (Pode). Para João da 5 Irmãos (União), o trabalho “cada vez mais tem avançado”.
Além de frisar as hortas comunitárias, Oscalino do Povo (PP) avaliou que é importante que “seres humanos, tanto como nós, estão tendo dignamente a melhora da sua alimentação”. “Um bairro tão pequeno, igual o Fazendinha, é servido por quatro hortas comunitárias. [...] Três que já existem e já demos início para a [implantação da] quarta horta”, pontuou Salles do Fazendinha (DC).
Ezequias Barros (PMB) e Jornalista Márcio Barros (PSD), por sua vez, ressaltaram os avanços do Programa Mesa Solidária, apesar da polêmica, no ano passado, com a proposta inicial encaminhada pelo Executivo. “Claro, gostaríamos que ninguém precisasse disso, que todos tivessem salário”, observou Ezequias.
Presidente da Comissão de Direitos Humanos, Defesa da Cidadania e Segurança Pública da CMC, Márcio Barros lembrou do papel do titular da SMSAN, Luiz Gusi, para a construção de substitutivo ao Mesa Solidária e da lei 16.065/2022, que instituiu o Marco Regulatório da Segurança Alimentar. Aprovada em setembro passado, a norma estabelece 14 diretrizes a serem seguidas pela prefeitura no relacionamento com a Região Metropolitana de Curitiba, visando à integração socioambiental e logística.
Além do secretário e servidores da Segurança Alimentar e Nutricional, a votação foi acompanhada por Aline Pasda e Carina Lickfeld, representantes da Federação de Cooperativas da Agricultura Familiar e Economia Solidária do Paraná (Fecafes).
Venda de terreno
O plenário acatou outro projeto do Executivo em primeiro turno. A mensagem solicita a autorização da CMC para alienar (vender) um lote com 146,87 m², no bairro Hugo Lange. O projeto teve 35 votos positivos e 2 abstenções (005.00058.2022). Avaliada por R$ 203 mil, a operação imobiliária foi solicitada pelo casal Antonio Cesar Cioffi de Moura e Maria Esperia Costa Moura, vizinho ao lote público.
O termo de concordância foi assinado em novembro de 2021, retomando o andamento de um processo aberto em 2008, e prevê o pagamento diretamente aos cofres da Prefeitura de Curitiba (005.00058.2022). Trata-se, segundo a mensagem, de uma faixa estreita, com 3,43 m de largura, interna a um terreno já murado.
“[O terreno] é uma tira que faz limite com um imóvel privado”, afirmou Professora Josete (PT). Dessa forma, justificou a vereadora, não é possível atender aos “interesses do povo”, construindo equipamentos públicos naquele espaço. “É melhor que ele seja incorporado a um imóvel privado, que ele seja vendido, do que ser um lugar para jogar lixo”, argumentou.
Renato Freitas (PT), por sua vez, defendeu o voto contrário. Para ele, a questão não é o tamanho dos terrenos, e sim a “supremacia do interesse público sobre o interesse privado”. “Cabe à prefeitura fazer uma audiência pública demonstrando todos os imóveis abandonados da cidade, para que a gente não perceba uma política patrimonialista”, citou.
Os vereadores acataram, nesta manhã, mais três projetos. Um deles é a revisão do Regimento Interno, modificando 48 regras internas do Legislativo de Curitiba. As sessões começam às 9 horas e têm transmissão ao vivo pelos canais institucionais no YouTube, no Facebook e no Twitter.
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