Bullying: para combater, é preciso conhecer e identificar

por Assessoria Comunicação publicado 21/10/2010 16h15, última modificação 01/07/2021 08h20
O debate apenas começou. A lei antibullying nas escolas, de autoria dos vereadores Mario Celso Cunha (PSB) e Pedro Paulo (PT), foi aprovada em segundo turno na Câmara Municipal de Curitiba nesta semana, mas é agora que o assunto deve entrar em discussão na sociedade para que a lei se torne efetiva. Pensando nisso, os vereadores vão convidar para um debate o advogado especialista no tema, Alexandre Saldanha, que atende estes tipos de casos e já foi vítima da agressão. Ele ocupará o espaço de uma das Tribunas Livres de novembro e comentará sobre os avanços que a lei traz e a necessidade que a escola hoje tem de olhar profundamente para este problema, que sempre rondou e minou a educação infantil.
Para o advogado, a lei traz à tona a discussão de um assunto que até então era ignorado, mas que sempre esteve presente nas escolas. “O segundo contato social da criança é a escola e o bullying, na maioria das vezes, começa ali dentro. Mas o primeiro contato é com a família e é neste período que ela forma o caráter e reproduz isto no meio externo. Fora da escola a responsabilidade é exclusiva dos pais, mas dentro dela são os educadores que devem tratar o assunto e fazer os pais participarem”, disse. Para ele, o fato de a lei propor o debate nas escolas é muito importante para que se conheça melhor o que é a prática e assim combatê-la. “Um artigo muito proveitoso da lei é o que determina que as escolas registrem em ata os casos, os protagonistas e como foi tratado o assunto. Isto possibilita mapear e observar as medidas que tiveram sucesso e as que não”, argumentou. O advogado acredita que a lei dá aos curitibanos a possibilidade de formar grupos de prevenção, evitando tratar o assunto de forma punitiva, o que, acredita, não traria um resultado efetivo. “É necessária a criação de comissões para que se auxilie as escolas a tratar o assunto. Também explorar todos os meios tecnológicos para trabalhar este tema. A escola tem que visualizar este combate de forma prática, com palestras, jogos educativos, matérias de cidadania”, complementou.
Mario Celso defende a necessidade de as famílias se interessarem e tomarem conhecimento dos problemas ocorridos com os filhos nas escolas. Pedro Paulo, que também é professor e pôde observar o problema na prática, acredita que o fato da lei existir vai possibilitar que os pais cobrem uma postura mais incisiva da escola nestes casos. Segundo ele, o papel do Legislativo agora será o de promover mais debates sobre o assunto e também checar a aplicação da lei. “Toda a lei tem que ser aplicada, independente de ser obrigatória ou não. Espero que isto seja praticado e vamos fiscalizar e cobrar sua execução”, garantiu.
A nova lei deixa evidente que o bullying desconstrói a educação escolar dada ao indivíduo e as instituições de ensino precisam tomar um posicionamento para combater o problema. A partir de agora, um novo comportamento, livre de preconceitos e menos agressivo deverá fazer parte da evolução natural das próximas gerações.
Identifique o problema
O assunto está sendo incrementado no país inteiro com o lançamento, nesta quarta-feira (20), da Cartilha Bullying – 2010 – Projeto Justiça nas Escolas, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). A publicação ensina como identificar para prevenir o fenômeno social.
A cartilha mostra o perfil de vítimas e agressores. O conhecimento destas características é necessário para que os pais possam ficar alertas sobre o problema, que pode ocorrer em qualquer classe social.
As vítimas da prática têm um temperamento mais tímido, com características físicas diferentes da maioria, como usar óculos, ser mais gordinho ou muito magro. Já o agressor tem um perfil mais popular, mais extrovertido, aparenta domínio pela força ou por influência verbal. Mas isto não é fator determinante para a prática. O que contribui é o fato destes indivíduos virem de famílias omissas na educação ou desestruturadas e muitas vezes serem influenciados por programas de tv e videogames. Segundo o advogado, os pais não veem provas evidentes de que seus filhos praticam bullying, por muitas vezes não apresentarem este tipo de comportamento em casa. “Geralmente, quem pratica tem dupla personalidade. Dentro de casa é um e na escola se comporta de outra forma”, alertou Saldanha.
Segundo a cartilha do CNJ, para descobrir se a criança ou adolescente está sendo vítima, é necessário abrir um canal para o diálogo e observar seu comportamento no lar. Pode haver queda no rendimento escolar ou intensidade nos estudos, depressão, comportamento antissocial, agressividade, perda de apetite ou apetite em excesso. “Pode também passar mal antes de ir para a escola ou antes do intervalo, porque é neste horário que acontece o assédio”, acrescentou Saldanha.
As práticas contra estas vítimas são inúmeras. A cartilha descreve algumas destas atitudes. Entre elas, insultar, ofender, falar mal, colocar apelidos pejorativos, “zoar”, bater, empurrar, beliscar, furtar, roubar, entre outras. A publicação revela também que a ação dos meninos é mais visível, por serem mais agressivos, mas as meninas costumam provocar intrigas, fofocas e o isolamento das colegas.
Alexandre lembrou de um caso extremo, do menino Yuri Henrique Mendes Chaves, de Telêmaco Borba, que faleceu quatro dias após ter sido agredido por colegas mais velhos na saída do colégio, no início deste ano. Inicialmente, o garoto já estava sofrendo ameaças e provocações e não queria mais ir à escola.
Supere o problema
A Cartilha Bullying revela atitudes que podem ajudar vítimas a superar o sofrimento. Segundo a publicação, a identificação precoce pelos pais e professores é essencial. “Os pais não devem hesitar em buscar ajuda de profissionais da área de saúde mental, para que seus filhos possam superar traumas e transtornos psíquicos”, diz.
Outra atitude que os pais podem tomar é perceber talentos destes jovens e estimulá-los a desenvolver estas habilidades, para que assim possam resgatar a autoestima e construir uma identidade social.
Multimídia
Alexandre Saldanha elogiou a nova lei municipal, por ser uma das primeiras no Brasil que cita o ciberbullying. “Por isto, ela é muito avançada, tem uma visão futurista, é prática”. Segundo ele, as redes sociais da internet têm sido muito usadas para assediar colegas. “É preciso educar o uso destes recursos, não retirar o instrumento”, ponderou.
A cartilha do CNJ considera o bullying virtual uma das formas mais agressivas da prática. “Além de a propagação das difamações ser praticamente instantânea o efeito multiplicador do sofrimento das vítimas é imensurável. O ciberbullying extrapola, em muito, os muros das escolas e expõe a vítima ao escárnio público”, diz a cartilha, afirmando que os traumas e consequências são dramáticos.
Outros recursos tecnológicos podem incentivar o assédio nas escolas. Saldanha alertou que há até um jogo de videogame cujo objetivo é a prática do bullying. Quem fizer mais, vence. “A própria empresa que criou o jogo cria também uma política de violência desde os pequenos”. Saldanha lembrou ainda dos seriados americanos para a geração teen, recheados de preconceitos contra os colegas, estereótipos e estigmas.
Evento
O bullying também está sendo alvo de discussão na 40ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira de Psicologia, que iniciou nesta quarta-feira em Curitiba, na ExpoUnimed. O encontro deve terminar no sábado e está reunindo cerca de dois mil profissionais. Em debate também estarão as formas de detecção e tratamento de desvios de conduta, como a psicopatia.
Serviço
A Cartilha Bullying – 2010 – Projeto Justiça nas Escolas pode ser baixada pela internet, no link “documentos” do endereço http://www.cnj.jus.br/index.php?option=com_content&view=article&id=12311&Itemid=1249