Audiência pública alerta para violência contra a mulher
Foram debatidas pautas como machismo, participação política, feminicídio e o ciclo da violência. (Foto: Carlos Costa/CMC)
Na tarde dessa segunda-feira (13), o auditório do anexo 2 da Câmara Municipal de Curitiba (CMC) recebeu uma audiência pública alusiva à campanha Março Laranja, de enfrentamento à violência contra mulheres e meninas. “A luta feminista não é uma luta apenas pelo direito de voto, que é uma conquista recente do ponto de vista do direito civil. [...] é uma luta pelo direito de igualdade de direitos humanos”, ressaltou o vereador Angelo Vanhoni (PT), propositor do debate.
Diversas oradoras, ao longo do evento, chamaram a atenção para o público majoritariamente masculino – uma exceção para discussões sobre os direitos das mulheres. “Esse enfrentamento não é somente das mulheres. Os homens precisam estar conosco, ao nosso lado”, frisou, inicialmente, a procuradora da Mulher na CMC, Maria Leticia (PV). Ela lembrou que, como médica legista, trabalhou durante 27 anos “na ponta, atendendo mulheres vítimas da violência”. A Procuradoria da Mulher (ProMulher) do Legislativo realizou, de 6 a 10 de março, uma programação alusiva ao Dia Internacional da Mulher (saiba mais).
Professora Josete (PT), na mesma linha, destacou o apoio dos homens à causa. “Gostaria de destacar que nós temos aí muitas coisas a superar, mas o feminicídio é uma das questões que mais nos preocupa. Não é possível que mulheres sejam mortas por serem mulheres, porque querem garantir sua liberdade, ter sua autonomia, escolher a roupa que querem vestir. Então nós temos avançado, mas temos ainda muitos desafios”, avaliou.
“Como delegada de polícia, eu já vi muita coisa”, relatou a delegada Tathiana Guzella, da Polícia Civil do Paraná. “Na Divisão de Homicídios, mais do que em qualquer outro lugar, eu vi, sofri e convivi com as vítimas de violência doméstica com aquilo que há de pior, o feminicídio; alguns consumados, outros tentados”, continuou. Ela chamou a atenção para a questão cultural de que “o machismo é algo milenar” e “ressignificar é a grande palavra”.
Coordenadora da Marcha Mundial das Mulheres do Paraná, Marilda Ribeiro da Silva também representou a Frente Feminista de Curitiba e Região Metropolitana. “Uma das nossas maiores bandeiras, da nossa luta feminista, é assegurar a participação política das mulheres”, pontuou. Ela pediu ainda a recriação da Secretaria Municipal de Políticas para Mulheres, “que seja capaz, que seja estruturada, com orçamento, com recurso, com pessoal técnico e preparado” – pauta apoiada, na sequência, por outras participantes.
A advogada Andréia Vitor, integrante da Comissão de Igualdade Racial da seccional Paraná da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-PR), disse que a discussão é ampla, com espaço para “múltiplas vozes” e demandas. “Sem a visibilidade, sem a representatividade [política], todo e qualquer discurso vai ficar restrito a ‘eles lavam a louça ou não’”, citou. “O machismo existe na estrutura da nossa sociedade.”
Março Laranja
O presidente do Sindicato dos Metalúrgicos da Grande Curitiba, Sérgio Butica, explicou que o Março Laranja nasceu no movimento sindical metalúrgico, “uns 20 anos atrás”, e que a proposta está sendo levada às câmaras municipais. “Eu quero dizer da surpresa de vocês de verem tantos homens aqui”, comentou. Segundo ele, a entidade já realizou diversas mobilizações pela proteção das mulheres contra o assédio moral e sexual.
“Na campanha Março Laranja, foi estabelecida a cor laranja pela ONU. E a ONU Mulher lançou também a campanha Eles por Elas”, comentou a diretora da Força Sindical do Paraná, Neuralice Maina. Ela defendeu a a criação e a fiscalização de leis, assim como a retomada da secretaria específica para tratar das políticas públicas para a mulher.
Assessora da Força Sindical, Fernanda Queiroz alertou que 90% dos casos de feminicídio no Brasil são cometidos pelo marido ou ex-marido da vítima. Quanto à cor laranja, a oradora acrescentou que seu uso é associado, pela ONU, com a prevenção e com o combate à violência contra as mulheres e meninas.
Ciclo da violência
“Vocês sabiam que aqui no Paraná, em Curitiba, tem uma das sete Casas da Mulher Brasileira [do país]? É ali no Cabral, na avenida Paraná. Sabiam também que, desde que ela foi instalada [em 2016], já fez mais de 89 mil atendimentos”, declarou a coordenadora da Casa da Mulher Brasileira de Curitiba, Sandra Prado. Segundo ela, a falta de autonomia financeira e a dependência emocional são os que mais prendem ao relacionamento abusivo.
A advogada Jessica Luna, vice-presidente do Instituto Alice Quintilhano, entidade que atua na prevenção e na defesa dos direitos de vítimas diretas e indiretas de violência doméstica, de feminicídio e de relacionamento abusivo, também falou durante a audiência pública. “Combater a violência; ela precisa ser uma pauta de todos”, afirmou ela, relatando ter passado pelo ciclo de violência doméstica. A violência doméstica, lembrou, não abrange apenas as agressões, mas também a violência psicológica, sexual, moral e patrimonial, dentre outras.
“Muitas vezes a mulher, por estar dentro deste ciclo, não consegue identificar”, ponderou. Também é importante, indicou a advogada, desenvolver ações para as pessoas no entorno dessa violência, como os órfãos do feminicídio: “E quem fica, quem são essas crianças, o que é feito por elas?”. O presidente do instituto, Gilmar Quintilhano, que é órfão do feminicídio, e a assessora psicossocial da entidade, Claudia Aline Alves de Lima, também acompanharam o evento.
“Se nós sairmos daqui compreendendo que o que impede a igualdade entre homens e mulheres é o machismo, nós podemos sair felizes. E o machismo não é genético, o machismo é uma construção social”, propôs a secretária-geral do Sindicato dos Empregados em Estabelecimentos Bancários, Financiários e Empresas do Ramo Financeiro de Curitiba e Região, Cristiane Paula Zacarias. “O que sustenta o machismo é o patriarcado, e o patriarcado só vê valor nos homens".
Também houve espaço para a participação do público, com falas sobre a implantação das práticas integrativas para os profissionais que atendem na Casa da Mulher Brasileira, sobre a Lei Maria da Penha, sobre a participação da mulher nas Casas Legislativas do país e sobre pedido de apoio à formalização do Março Laranja.
*Notícia revisada pelo estudante de Letras Brunno Abati
Supervisão do estágio: Alex Gruba
Reprodução do texto autorizada mediante citação da Câmara Municipal de Curitiba