Audiência mostra necessidade de política intersetorial sobre drogas
Reunir gestores públicos da Defesa Social, Saúde, Assistência Social, grupos religiosos, organizações do terceiro setor, comunidades terapêuticas e pesquisadores acadêmicos mostrou a carência de uma política intersetorial relacionada à drogadição. Essa é a análise do presidente da Frente Parlamentar Contra as Drogas, vereador Ezequias Barros (PRP), que coordenou a audiência pública sobre o tema realizada na Câmara Municipal de Curitiba nesta quarta-feira (20).
Barros, Thiago Ferro (PSDB), Dr. Wolmir Aguiar (PSC) e Osias Moraes (PRB) abriram a audiência pública, que contou com a presença do secretário municipal de Defesa Social, Guilherme Rangel, da coordenadora de saúde mental da Secretaria Municipal de Saúde, Flávia Adachi, da chefe do escritório da Secretaria Estadual de Defesa Social, Larissa Marsolik, do chefe do departamento de controle financeiro da Secretaria Municipal de Finanças, Ari Piovesan, do diretor da Diretoria de Políticas Sobre Drogas, Cristiano de Bastiani, e do vice-presidente do Conselho Municipal de Política Sobre Drogas, Acácio Faria Filho.
A audiência durou duas horas e meia, nas quais cada um dos membros da mesa expôs a atuação do órgão que representava, indicando os desafios para a efetivação de uma política pública de enfrentamento às drogas em Curitiba. A íntegra das palestras está disponível para consulta no canal da Câmara Municipal no YouTube (assista aqui).
“A ideia da audiência era justamente buscar essa interlocução”, explicou Ezequias Barros. Depois das perguntas da população, além da necessidade de uma política intersetorial, o presidente da frente parlamentar assumiu o compromisso de, com os demais vereadores, buscar uma valorização do fundo municipal destinado a essas políticas públicas. Uma nova audiência pública será marcada no final do ano, após o período eleitoral.
“Difícil de mensurar”
Um dos empecilhos às políticas públicas de enfrentamento da drogadição ficou mais claro após pergunta do vereador Thiago Ferro, que questionou as autoridades presentes sobre quanto cada órgão investia na área. As representantes da Defesa Social no Paraná e da saúde mental em Curitiba, Marsolik e Adachi, explicaram que, por se tratar de um atendimento transversal, que envolve diversos cuidados e equipes, não era possível fixar o valor.
A dificuldade foi corroborada por Piovesan, das Finanças, que lamentou não haver esse “nível de detalhamento” no orçamento público. “Mas pelo fato de ser intersetorial, precisava ter um valor específico, até para o próprio conselho”, observou o vereador. “A situação do uso abusivo de drogas não se reduz só ao indivíduo, mas diz respeito também ao entorno dele. É uma situação complexa, que exige uma interface de diversas competências”, comentou Flávia Adachi. Ela disse que os procedimentos envolvem das unidades básicas de saúde às internações.
Falando da importância de uma “rede de proteção ampliada”, Larissa Marsolik, do governo do Paraná, acrescentou a importância dos movimentos da sociedade civil nesse atendimento. “Não conseguiremos apenas com o trabalho do Executivo. Precisamos compor esse trabalho com parcerias público-privadas”. Ela deu o exemplo das igrejas, “que estão lá na ponta, nas ruas, fazendo o primeiro atendimento. Elas precisam dialogar com o poder público”, indicou.
“Delitos colaterais”
O secretário municipal de Defesa Social, Guilherme Rangel, que participou de parte da audiência pública, enumerou as ações preventivas executadas pela Prefeitura de Curitiba e buscou redimensionar o problema, incluindo-o num contexto de segurança pública. “Talvez por ser delegado de polícia, entrei na carreira com 24 anos de idade, eu vejo o crime. No ano passado, foram registrados 82 mil homicídios, e 80% deles tem algum vínculo com drogas. Há muitos delitos colaterais. Se o usuário não paga, o traficante tem que mandar recado”, relatou.
Bastiani, que responde pela Diretoria de Políticas Sobre Drogas, cobrou a importância de uma ação contínua no setor. “Quando eu entrei [na secretaria] em setembro [do ano passado], tinha convênios de 2011 parados. Houve muitas trocas de equipe, então não dá tempo [de pôr políticas públicas em prática]. Não acontece de uma semana para outra”, alertou. Ele deu o exemplo das atividades realizadas desde segunda-feira (18), na Semana de Prevenção ao Uso de Drogas. “Começamos a trabalhar nela no dia 15 de março e eu ainda acho que foi tarde”, disse.
Com limitações orçamentárias, Bastiani deu o exemplo da parceria com o lutador Maurício Shogun, cujo instituto social gratuitamente vai interagir com 80 crianças do bairro Barreirinha. “Esperamos que com esse exemplo surjam mais apoios”, disse Bastiani, que conta com a constituição de uma rede de voluntários, convênios e parcerias para oferecer à comunidade atividades capazes de tirar as pessoas das drogas. “Elas não precisam da droga para se divertirem, pode ser o esporte, pode ser a cultura”, apontou.
Fundo municipal
Outro ponto levantado pelos vereadores e pelas autoridades foi a importância de fortalecer o Conselho Municipal de Política Sobre Drogas. Hoje, explicou Acácio Faria, a gestão do fundo municipal fica à cargo da Secretaria Municipal de Defesa Social e, como não há a destinação de recursos da cidade, ele depende de repasses federais e de emendas parlamentares. “Outros conselhos têm fundos milionários; o nosso tem R$ 4,2 mil, da Secretaria Nacional de Políticas Sobre Drogas”, comentou.
A questão foi colocada pelos vereadores da Frente Parlamentar Contra as Drogas como uma linha de ação dos parlamentares junto ao Executivo. Ezequias Barros comprometeu-se a oficiar a prefeitura sobre o tema, agendando reunião para apresentar essa demanda à secretaria de Finanças. “Curitiba tem um orçamento bilionário; com um milhão já se faria muita coisa [no enfrentamento da drogadição]”, opinou. Thiago Ferro defendeu a autonomia do conselho, que hoje é apenas um órgão consultivo, na gestão do fundo.
“Temos que traçar metas e objetivos para uma linha de atuação que reduza o avanço da droga”, propôs Osias Moraes, que entende ser essa a forma de se atacar “um problema sistêmico”. Para Wolmir Aguiar, o foco precisa ser “o atendimento no mundo real”. Ele destacou a articulação dos vereadores da frente parlamentar, “que têm um trabalho na Câmara, dentro das comissões, que possibilita apresentar projetos e os alavancar para que virem leis”.
Também participaram da audiência pública Anderson Walter, da FAS; Augusto Soavinski, do departamento estadual de políticas públicas contra as drogas; Jackson de Souza e Roberto Monroy, da comunidade terapêutica Mannain; João Chinilovski, do movimento Reage; Edineia Malichesk, do Caaps Bairro Novo; o pastor Fabio Raymann, do projeto Novo Caminho; Anderson Cruz, do projeto Alcance; Filomena Fuzon, da comunidade terapêutica Precavida; Rogério Victório, chefe da capelania da Polícia Militar do Paraná; pastor Eduardo Villanova, da Igreja Metodista do Bacacheri; Roger Ferreira, do Conselho Estadual da Juventude; Beethoven Juvenal, da Associação Oda de Castro Peçanha; José Mauro de Borba, da Associação Martas e Marias; Valéria Prochmann, do Conseg do Centro Cívico; Maurício Barcelos, da Federação Paranaense das Comunidades Terapêuticas; Luiz Carlos Hauer, da Comissão de Políticas de Drogas da OAB-PR; Renan Ricardo, da Sociedade Bíblica; Paulo Brito, assessor parlamentar do deputado estadual Gilson de Souza; e Herbein Bernardes, do Instituto Ponte.
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