Audiência da Saúde: Curitiba pede decreto estadual para alinhar restrições na RMC
Com a pandemia, as sessões da CMC são feitas por videoconferência. Na foto, a secretária Márcia Huçulak. (Foto: CMC)
“A gente precisava de um decreto estadual. Seria muito importante uma medida que alinhasse todos [municípios da Região Metropolitana de Curitiba, RMC]”, declarou, nesta terça-feira (25) a secretária municipal de Saúde, Márcia Huçulak, à frente do enfrentamento da pandemia na capital do Paraná. Questionada pelos vereadores da Câmara Municipal de Curitiba (CMC), ela pontuou que a conurbação com as cidades da RMC demanda uma ação conjunta dos municípios para conter o contágio, mas que há administrações resistentes à articulação.
“Estamos aguardando decreto do governador. Tudo que acontece na região metropolitana impacta Curitiba. As linhas de ônibus que geram aglomeração têm conexão com a região metropolitana”, disse Huçulak, revelando estar em contato com o secretário estadual de Saúde, Beto Preto, e com outros gestores municipais do SUS. Ela destacou que em Guarapuava, União da Vitória, Foz do Iguaçu e Maringá têm encarado um agravamento da pandemia, e que isso poderia aumentar as medidas restritivas do Estado. No fim do dia, a Prefeitura de Curitiba renovou a bandeira laranja até sexta-feira (28).
“A Assomec [Associação dos Municípios da Região Metropolitana de Curitiba] recomendou, mas nem todos prefeitos aceitaram”, corroborou Pedro Henrique de Almeida, da Diretoria do Sistema de Urgência e Emergência da cidade. Ele apontou, inclusive, que o fechamento do comércio no último sábado (22), foi necessário para reduzir a pressão dos traumas no sistema de saúde, uma vez que a capital tem disponibilizado progressivamente mais leitos para acidentados do entorno. “A gente precisava pôr a sociedade em casa para reduzir o trauma”, disse Huçulak, que ouviu críticas dos vereadores, para quem isso aumentou a aglomeração nos mercados.
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A audiência pública foi coordenada pela Comissão de Saúde, Bem-Estar Social e Esporte, presidida por Noemia Rocha (MDB), e é uma exigência da lei complementar federal 141/2012, como ferramenta de transparência na gestão dos recursos do Sistema Único de Saúde (SUS). Graças a um acordo entre as lideranças parlamentares e a colaboração da Secretaria Municipal de Saúde (SMS), a audiência, que geralmente dura 2h, foi estendida por 4h30. Márcia Huçulak respondeu a perguntas de 23 vereadores e do público, que se manifestou pelas redes sociais da CMC.
Bandeira vermelha
Perguntada diretamente por Denian Couto (Pode) sobre Curitiba estar à beira de um retorno à bandeira vermelha, com agravamento das medidas restritivas, conforme foi noticiado pela imprensa, Márcia Huçulak respondeu que essa decisão obedece a critérios técnicos. “Criamos um painel com nove indicadores, que baliza nossas decisões, ponderando a propagação [do vírus] e a capacidade de atendimento do sistema de saúde”, disse a secretária. Contudo, ela alertou que “os indicadores da semana passada estavam muito próximos [do limite] e apontavam para a bandeira vermelha”.
Curitiba tem hoje 96% dos leitos SUS exclusivos para covid-19 ocupados e uma taxa de transmissão de 1,1 – o que significa que 100 contaminados passam o vírus para 110 pessoas. “A média está entre 800 e 900 novos casos por dia e entre 20 e 25 mortes. Isto ainda é um patamar muito elevado. Na última semana, estamos novamente tendo um aumento. No final de abril tínhamos 5 mil casos ativos e hoje temos quase 10 mil casos ativos da doença. Isso significa a franca circulação da covid-19”, alertou Alcides Oliveira, diretor de Centro de Epidemiologia da Secretaria Municipal de Saúde.
“Nos meses de junho e julho [de 2020], quando tivemos o primeiro avanço da covid-19, demorou quatro semanas para o aumento dos casos. Em novembro e dezembro [de 2020] e março e abril [deste ano] demoramos em torno de 15 dias. A doença mudou de perfil [de contágio]. Em 27 de novembro [com a bandeira laranja], demorou 6 dias para a reversão da tendência, ou seja, 6 dias ocorrer a queda e 26 dias para a redução da curva. Já no dia 12 de março, com a bandeira vermelha, foram 5 dias para a queda e 20 dias para a redução da curva. A bandeira vermelha faz com que se tenha uma queda mais expressiva. É um mecanismo de preservação da vida”, afirmou Oliveira.
Interpelada pelos parlamentares sobre o tratamento dado ao comércio, Márcia Huçulak defendeu o trabalho da Saúde. “O nosso comitê passa horas discutindo e os membros estão publicados [na internet]. São profissionais renomados. Sugiro que a Câmara faça uma audiência pública e ouça o outro lado, que não o comércio. Que ouça os diretores de hospitais, os infectologistas. Que faça um grande debate”, retrucou a gestora do SUS na cidade. "Para nos unirmos, vocês precisam parar de acusar a população e os empresários. É o primeiro passo. É nítido para a população, e muito claro para nós, a falta de critério para os decretos. Qual o critério técnico para definir as limitações de cada segmento?", rebateu Alexandre Leprevost (SD).
Antes, Huçulak tinha revelado receber ligações constantes dos diretores de hospitais para aumentar as restrições. Por exemplo, a secretária da Saúde contou que, na semana passada, recebeu ligações dos diretores de pronto-socorro alertando para a lotação desses leitos. “tinha hospital com sete fraturas de fêmur esperando, precisando operar. Era uma situação que não tínhamos antes. Estávamos sobrecarregados com o trauma. A nossa bandeira não olha só para a covid-19”, explicou Huçulak. Dalton Borba (PDT) e Indiara Barbosa (Novo), por exemplo, tinham criticado a medida por ela colateralmente aumentar a aglomeração de pessoas nos mercados durante a semana.
“Abre e fecha” do comércio
Bastante frequente no comentário dos vereadores foi a crítica às mudanças sobre a operação do comércio e os pedidos, verbalizados, por exemplo, pelo Professor Euler (PSD) e por Carol Dartora (PT), para que seja adotado um rodízio das atividades que coíba o contágio sem precisar do “abre e fecha”. Márcia Huçulak comentou que a sugestão de fechar um dia determinada atividade, numa espécie de rodízio, não seria efetiva.
Mas a secretária da Saúde disse que o comitê está aberto a essas sugestões, de forma que, por exemplo, ao perceberem que os profissionais do telemarketing dividiam os ônibus com os da Saúde cedo pela manhã, alteraram o horário daqueles para as 9h. “Eu sinto muito pelas perdas econômicas, isso me dói no coração, mas o principal objetivo desta pasta e do comitê é proteger a vida. A ciência está buscando alternativas e respostas que nós não temos. Países que não fizeram medidas restritivas têm maior perda do PIB, maior número de casos e de óbitos”, argumentou.
“Estamos tentando construir um protocolo separando [os segmentos], pois antes o setor de eventos estava num bloco só. Fizemos um estudo para pensar em alternativas. Temos buscado alternativas com vários setores. Quem mais quer sair do abre-e-fecha somos nós. O comitê não aguenta mais”, disse Márcia Huçulak, dando como o exemplo a regulação das academias e das canchas desportivas. Sobre a lotação dos ônibus, disse que diariamente a Urbs repassa o uso do cartão-transporte à SMS, que cruza esses dados com os testes positivos, para bloquear esses usuários.
"Dois pesos e duas medidas"
A exemplo do que aconteceu na semana anterior, vereadores criticaram a Prefeitura de Curitiba pela realização de um grande evento no parque São Lourenço, no dia 14 de maio, no qual o chefe do Executivo, Rafael Greca, inaugurou os novos Memorial Paranista e Jardim de Esculturas. "A Curitiba da AIFU tem dois pesos e duas medidas? Essas ações já multaram em mais de R$ 11 milhões os sofridos empresários curitibanos de bares, restaurantes, eventos e comércio. A inauguração do Memorial Paranista foi feita em desacordo total com o decreto e a bandeira vigentes. Um evento com mais de 500 convidados, como ocorreu, vai contra todos os protocolos existentes na pandemia, em razão do alto risco de contágio", acusou Flávia Franscischini (PSL).
Cobrada, Márcia Huçulak afirmou que a Saúde não foi consultada pela prefeitura sobre a atividade. “O comitê não emitiu parecer. Não é da responsabilidade da SMS fiscalizar aglomerações. Não participamos das AIFUs que envolvem bares, festas e outros eventos”, respondeu, acrescentando que cabe à pasta de Urbanismo e à Guarda Municipal realizar essa fiscalização. "A sua resposta foi inconclusiva. É inaceitável o que aconteceu. Não poderia ter ocorrido o evento. Por mais que a Saúde não esteja diretamente ligada, é inaceitável que não tivesse conhecimento evento, nem o secretário Jamur. Quantos empresários estão há mais de um ano e meio sem abrir as suas portas e se põem cinco mesinhas, no mesmo momento a AIFU chega e multa. Como que a AIFU fica sabendo disso e não de um evento para 500 pessoas. É subestimar a inteligência dos vereadores", retrucou Flávia Francischini.
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