Audiência alerta ao diagnóstico precoce das doenças neuromusculares
Atendimento humanizado e direitos dos portadores de doenças neuromusculares pautou audiência pública virtual. (Foto: Carlos Costa/CMC)
A Câmara Municipal de Curitiba (CMC) discutiu, na tarde dessa quinta-feira (28), a necessidade do atendimento humanizado e os direitos das pessoas com doenças neuromusculares, um grupo de mais de 100 condições que afetam direta ou indiretamente a função muscular e podem ser adquiridas ou herdadas. De iniciativa do vereador Jornalista Márcio Barros (PSD), a atividade contou com a participação do Executivo, de especialistas na área e de representantes de organizações da sociedade civil, que alertaram à importância do diagnóstico precoce, da divulgação de informações sobre as distrofias e do apoio do poder público (assista ao debate na íntegra, aqui).
Presidente da Comissão de Direitos Humanos, Defesa da Cidadania e Segurança Pública da CMC, Barros contou que teve acesso ao tema quando ainda era repórter, e que a ideia é dar continuidade ao debate. “Eu perdi um filho e ele tinha uma doença rara. Ele viveu sete meses. E o maior problema foi justamente a falta de diagnóstico”, relatou. “A gente precisa trazer políticas públicas, para aprimorar o diagnóstico precoce, a informação.”
A vereadora Noemia Rocha (MDB), que preside a Comissão de Saúde, Bem-Estar Social e Esporte, destacou que a audiência pública dá voz à população, em busca de avanços. Para a Sargento Tânia Guerreiro (PSL), também é importante “cuidar de quem cuida”. “Imagina o sofrimento desta mãe, desta família, quando tem um diagnóstico desse. Eu acho que a gente podia estudar alguma coisa, junto a esses profissionais que entendem muito melhor disso”, propôs. “Estamos aí para aprender”, disse Oscalino do Povo (PP).
A presidente da Organização Paranaense de Distrofias Musculares, Patricia Krebs, relatou dificuldades no atendimento hospitalar aos portadores de doenças neuromusculares, em todo o país. “Nós trabalhamos para que os pacientes tenham qualidade de vida e um aumento dessa expectativa. E não é justo entrarmos com nossos filhos em um hospital e sairmos com eles em um caixão”, disse. “Nós estamos querendo unir forças. O que não é certo são as mães nos grupos falarem ‘meu filho está ruim, mas eu não vou levar no hospital porque eu tenho medo’.”
“Estou nessa briga há 30 anos”, afirmou a médica Ana Lúcia Langer, autora do Alerta Médico das Distrofias Musculares e referência nacional no tema. Ela perdeu um filho pela condição em 2020, aos 35 anos de idade. Para o diagnóstico e o tratamento dos pacientes, explicou, existem condições específicas. “Nós perdemos crianças por oxigenação indevida no pronto socorro. O tratamento é expandir o pulmão, jamais o oxigênio, que vai deprimir o centro respiratório e vai matá-la”, citou a especialista.
Ana Lúcia pediu apoio à divulgação do alerta médico. Além do risco da oxigenação, ela deu como exemplos a realização de campanhas com pediatras aos marcos do desenvolvimento, como atrasos na marcha; e pedido para a inclusão da dosagem da enzima CPK no teste do pezinho ou, pelo menos, em exames pré-operatórios para crianças. “Nós não sabemos tudo, nós aprendemos a cada dia.”
Conforme a fisioterapeuta Sibele de Andrade Melo Knaut, representante do Conselho Regional de Fisioterapia e de Terapia Ocupacional, são necessárias diretrizes para o acompanhamento hospitalar e o domiciliar, “termos profissionais preparados, especialistas, para a gente conseguir dar qualidade de vida a esses pacientes, a essas crianças”. A fonoaudióloga neurofuncional Karina de Fátima Portela de Oliveira Pereira e a fisioterapeuta Maíra Coelho, especialista em doenças neuromusculares, falaram da dificuldade para os profissionais terem acesso a seus pacientes em ambiente hospitalar. Maíra também lembrou que o Hospital de Reabilitação, foi destinado, na pandemia, ao tratamento da covid-19.
“Infelizmente passamos por um baque muito grande coma questão da covid, mas hoje o centro [de Reabilitação] já está se reestruturando”, respondeu a médica paliativista Luciane Cristine, da Sociedade Paranaense de Pediatria. Ela declarou apoio à causa, “inclusive com eventos científicos, com a mobilização dos nossos hospitais, estruturando manuais”, e ponderou que cuidados paliativos não são terminais, e sim de doenças sem cura, para a qualidade de vida do paciente.
“A nossa dificuldade é também o diagnóstico. Eu tenho pego pacientes que chegam no ambulatório com 30 anos ainda sem diagnóstico”, contou a neurologista dos hospitais Cajuru e Marcelino Champagnat, Luciane Filla. Outra questão, indicou ela, é a falta de uma rede domiciliar, em parceria com o poder público, para o acompanhamento dos pacientes em uma fase mais avançada, que estejam acamados ou com o uso do ventilador, por exemplo.
Com a reabilitação e equipamentos adequados, ponderou a neuropediatra Adriana Banzzatto, do Hospital Pequeno Príncipe, muitos pacientes não vão precisar de internamentos. A mesma visão é a da fisioterapeuta Adriana Maria Barreto Domingues, do Pequeno Príncipe, para quem as equipes precisam de atualizações constantes sobre os tratamentos.
De acordo com a diretora de atenção à saúde da Fundação Estatal de Atenção à Saúde (Feas), Tatiane Filipak Tatiane Filipak, em 2018 foi criada uma equipe multidisciplinar para atendimento domiciliar a pessoas em ventilação mecânica. “A gente faz uma visita em casa, avalia a estrutura do domicílio. Em alguns casos ajudamos a rever a parte da estrutura elétrica”, argumentou. “Esses programas não chegam até as associações. Em que porta podemos nós procurar isso? Não adianta ter e nós desconhecermos Acho que seria bem interessante a Secretaria da Saúde divulgar, ter um contato maior com as associações”, pediu Adriane Loper.
Nos encaminhamentos da audiência pública, Noemia Rocha sugeriu a apresentação de projetos de lei para declarar de utilidade pública municipal as organizações ligadas à causa, para que elas possam receber recursos e firmar convênios com o poder público. Junto ao Executivo, propôs a realização de campanha para ampliar a divulgação de informações e dos atendimentos disponíveis e questionou quando serão retomados os atendimentos de doenças neuromusculares no Hospital de Reabilitação.
Conforme Tatiane, os leitos covid devem ser desativos até o final de novembro, para que em dezembro as atividades sejam retomadas. A Patricia Krebs, ela disse que “se a mãe necessita de suporte domiciliar, é só acionar via unidade básica de saúde”.
Também participaram do debate representantes do Hospital de Clínicas; o ortopedista Luiz Antônio Munhoz; Márcia Chemin, da Sociedade Brasileira de Bioética; o presidente do Conselho Regional de Fonoaudiologia (CRF) Celso Luiz Gonçalves dos Santos Júnior; e Kamile Ziliotto Ferreira e Iuri Victor Romero Machado, da Comissão de Direitos Humanos OAB-PR.
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