Aprovada regulamentação de banheiros-família de grandes estabelecimentos
O objetivo é reforçar que os banheiros-famíllia podem ser acessados por crianças de até 10 anos de idade, pessoas com transtorno do espectro autista (TEA) e pessoas com deficiência intelectual – acompanhados de um responsável. (Foto: Rodrigo Fonseca/CMC)
Com 32 votos “sim”, 3 votos “não” e 1 abstenção a Câmara Municipal de Curitiba (CMC) aprovou nesta terça-feira (21) o substitutivo geral ao projeto de lei que, originalmente, tornava obrigatória a inserção do símbolo mundial do autismo na entrada dos banheiros-família de shoppings centers da capital (005.00031.2021). A norma, que passará por nova votação amanhã (22) e deverá receber emendas, agora propõe uma regulamentação para o uso desses banheiros não só nos shoppings, mas também em restaurantes, supermercados, aeroportos e outros estabelecimentos. O debate em torno da matéria tomou quase 2 horas das 3 regimentais da sessão plenária.
O substitutivo (031.00061.2021) apresentado ao projeto do vereador Jornalista Márcio Barros (PSD) dividiu opiniões em plenário quanto à necessidade de propor mais uma regulamentação para o setor privado e, ainda, ao caráter “punitivo” da medida. O novo texto foi elaborado pela Comissão de Saúde, Bem-Estar Social e Esporte e segundo o relator da proposta no colegiado, Marcelo Fachinello (PSC), em consenso com o autor da iniciativa.
A redação acatada pelo plenário da CMC regulamenta o uso dos banheiros-família com o objetivo de reforçar que esses locais possam ser acessados por crianças de até 10 anos de idade, pessoas com transtorno do espectro autista (TEA) e pessoas com deficiência intelectual – acompanhados de um responsável. Também estabelece que a sinalização dos banheiros-família cite a lei municipal, com a transcrição na íntegra desta regra. Na proposta original, os estabelecimentos seriam obrigados a inserir a fita colorida, símbolo mundial do ausitmo, na porta desses banheiros.
Ainda foram fixadas sanções pelo descumprimento da norma: advertência por escrito, com concessão de prazo de 30 dias para regularização; seguida de multa de R$ 2 mil e suspensão do alvará de licenciamento para o estabelecimento em caso de primeira e segunda reincidências, respectivamente. A lei, se aprovada em segundo turno e sancionada, poderá entrar em vigor 90 dias após sua publicação no Diário Oficial do Munícipio.
Famílias demandam a inclusão
Autor da proposta original, Márcio Barros ressaltou que o autismo é uma “causa muito séria”, uma pauta que tem cada vez mais defensores dentro da Câmara de Curitiba, como Pier Petruzziello (PTB) e Flávia Francischini (PSL) e esse transtorno, que não tem cura, atinge 1 a cada 160 pessoas no mundo, segundo a OMS (Organização Mundial de Saúde). “Casos mais graves ocorrem em crianças. E casos mais leves só são diagnosticados quando o portador do TEA está mais velho”, analisou e, na sua avaliação, o problema enfrentado pelas famílias aumenta neste ponto.
Como exemplo, o vereador apresentou em plenário uma reportagem produzida por seu gabinete, em que uma família com um adolescente autista relata constrangimentos que o pai ou mãe passam para ajudar o filho a ir ao banheiro em locais públicos. Esta dificuldade, reforçou Barros, é vivenciada não só para quem tem autismo, mas também por quem tem qualquer outra deficiência intelectual. Ele defendeu que a iniciativa representa para essas famílias “qualidade de vida, respeito e cidadania”.
Marcelo Fachinello celebrou o fato de que o substitutivo geral foi aprimorado em parceria com Márcio Barros e que a votação em primeiro turno ocorreu nesta terça, 21 de setembro, Dia Nacional de Luta da Pessoa com Deficiência (lei federal 11.133/2005). “É mais um passo qu esse dá na história de superação diária da pessoa com deficiência. Portadores de TEA ou que têm alguma deficiência intelectual precisam usar o banheiro com o auxílio de terceiros em lugares públicos. Muitas vezes essas pessoas são adolescentes, ou até mesmo adultos. Com a aprovação da lei, a educação da sociedade e a afixação da placa informativa nos banheiros-família, o projeto fará com que a vida dessas pessoas fique mais fácil.”
Mãe de um adolescente que tem autismo, Flávia Francischini (PSL) ressaltou que não só portadores do transtorno doe espectro autismo é que precisam da assistência para usar os banheiros, idosos também têm essa necessidade e a regulamentação poderá beneficiá-los. “Tenho o Érico [estagiário do gabinete parlamentar da vereadora] que não tinha me visto ainda depois que voltei da licença, e que hoje me recebeu com um abraço muito feliz. Ele é autista e tem apresentado para a gente um trabalhado excepcional dentro do gabinete. Fico muito feliz porque existe sim essa bandeira aqui dentro, que é trabalhada pelos 38 vereadores.”
Obrigatoriedade, burocracia, sanções
Único parlamentar a se abster do voto, Alexandre Leprevost (Solidariedade) ponderou que a proposta é válida “para que a gente possa trabalhar justamente no sentido da inclusão”, mas se incomodou com o caráter “mais punitivo” do que educacional. Por isso, sugeriu ao autor do projeto que retirasse os dispositivos que tratam das penalidades, “para que o público que entra no banheiro saiba que a qualquer momento vai encontrar uma criança, um adulto autista com seu pai ou sua mãe”.
“Nós estaríamos educando, conscientização e não buscando punir com multa de R$ 2 mil. Daqui a pouco teremos fiscais sem saber o que é um banheiro-família. Hoje, restaurantes que têm banheiros família são muito poucos. E daqui a pouco vamos ver fiscais procurando banheiros-família onde não têm”, emendou Leprevost, cuja sugestão recebeu apoio de Jornalista Márcio Barros – que orientou que o colega reúna as 13 assinaturas necessárias para apresentar uma emenda em segundo turno – e do líder do governo na CMC, Pier Petruzziello (PTB), que diz não ser favorável a projetos de caráter punitivo, mas entender que esta regulamentação é relevante por buscar a quebra de paradigmas e preconceitos.
Denian Couto (Pode) também disse não concordar com as penalidades, por defender que iniciativas como essa devam ser educativas, e se comprometeu a assinar a emenda em segunda votação. “Sem sanção, o projeto passa a ter viés educativo, esclarecedor. Essa parcela da população precisa de política pública inclusiva, e isso é incontestável. Se tirarmos a multa, o projeto se torna educativo e nós podemos, inclusive, cobrar todos que se incluam neste ponto de atendermos a essa parcela da população.”
Na opinião das vereadoras da bancada do Novo, Amália Tortato e Indiara Barbosa, que votaram contra a matéria, a regulamentação vai prejudicar quem empreende ou quer empreender no município, na medida em que cria mais uma regra a ser seguida, “mais uma plaquinha”, gerando mais custos para a iniciativa privada, em especial para o pequeno e médio empreendedor.
“O Brasil é o país que tem uma das maiores cargas tributárias do mundo. Que tem uma burocracia infindável, que tem milhões de leis e obrigatoriedades para o empreendedor e para as pessoas. E essa é mais uma. O empreendedor que coloca um banheiro-família, ele quer atender seu público, ele faz isso justamente por ter uma demanda. E agora ele tem que tirar uma placa e colocar outra. Ou seja, [tem que atender] mais uma obrigação além das milhares obrigações que tem que enfrentar todos os dias. É mais uma coisa que ele tem que enfrentar para manter seu negócio aberto”, analisou Indiara.
“Temos o costume de achar que nós temos que proteger os outros. Recentemente aprovamos nesta Casa a obrigatoriedade de instalar grades e telas em espaços de uso comum dos condomínios, como se nós estivéssemos supondo que aquelas pessoas que moram em condomínios não têm capacidade de tomar suas próprias decisões. E se eles decidirem não colocar as grades? Quem somos nós em dizer o que eles têm que decidir? Defesa da liberdade é uma das mais difícieis e uma das mais belas”, completou Amália Tortato, ao citar como exemplo sua própria experiência de optar por frequentar estabelecimentos que disponibilizam fraldários.
Dalton Borba (PDT) rebateu os argumentos do Novo, alegando que o ônus da lei – se sancionada – será quase “insignificante ao empreendedor”. Para o vereador, “quem monta qualquer tipo de comércio hoje tem que propiciar o acesso a todos”. “A empresa não é feita para uma fatia social. A empresa tem que prestar seu serviço para todos”, disse. “A lei proposta parece que está prejudicando alguém. Ninguém gosta de punir. Mas acho que a lei vai um pouco além. É uma causa que atinge na ponta, que atinge as famílias, é o famoso ‘o que abunda não prejudica’. A lei vai servir para a consciência das pessoas, para que elas possam dizer ‘olha, você sabia que tem uma lei que me deixa fazer isso’?”, argumentou Petruzziello.
Também participaram do debate os vereadores Eder Borges (PSD), Maria Leticia (PV), Noemia Rocha (MDB), Professor Euler (PSD), Professora Josete (PT) e Salles do Fazendinha (DC). Com a aprovação da matéria em primeiro turno, o texto retorna amanhã para o debate em segundo turno. O autor da proposta original, Jornalista Márcio Barros, afirmou já estar alinhando com o gabinete de Alexandre Leprevost a elaboração da emenda que irá excluir do projeto as sanções previstas em caso de descumprimento da norma.
As sessões plenárias da CMC são transmitidas ao vivo pelas redes sociais, de segunda a quarta, a partir de 9h, horário regimental. Para conferir as votações e pronunciamentos de hoje, acesse este link no canal do YouTube do Legislativo.
Reprodução do texto autorizada mediante citação da Câmara Municipal de Curitiba