Relatório da CPI aponta tarifa de até R$ 2,22, nova licitação e dezenas de indiciamentos
A CPI do Transporte Coletivo, ao longo de cinco meses, teve quatro diligências, 28 reuniões e 26 pessoas ouvidas, em 110 horas de depoimentos. (Foto – Andressa Katriny)
A CPI do Transporte Coletivo da Câmara de Curitiba apresentou, na tarde desta quinta-feira (28), o relatório final dos cinco meses de investigações. Com mais de 200 páginas, o documento elaborado pelo relator Bruno Pessuti (PSC), com ressalvas dos demais vereadores do colegiado especial, aponta sugestões para reduzir a tarifa até a R$ 2,22. Também propõe uma nova licitação do sistema e dezenas de indiciamentos.
Ressalva da Professora Josete (PT) pede o indiciamento do governador Beto Richa, que era o prefeito de Curitiba quando a licitação foi realizada, em 2010. Segundo a vereadora, ata de reunião do Conselho Municipal de Transporte indica, por meio de afirmação do presidente da Urbs à época, Marcos Isfer, que Richa tinha conhecimento do edital da licitação.
“O fato (ressalva da professora Josete) foi apresentado na segunda-feira (25). Acredito que o Ministério Público possa aprofundar esse aspecto, já que em depoimento à CPI diversos agentes públicos negaram envolvimento de Beto Richa na licitação”, disse o presidente da CPI, Jorge Bernardi (PDT). O vereador não descartou que depoentes, como Isfer e o ex-diretor de Transporte da Urbs, Fernando Ghignone, sejam indiciados por falso testemunho.
Bernardi também explicou que as ressalvas foram anexadas ao relatório final - aprovado na última segunda-feira, com voto contrário apenas do vereador Chico do Uberaba (PMN), que havia solicitado prazo de três dias para analisar o documento. As sugestões seguem, na próxima semana, à prefeitura da capital, Ministério Público do Paraná (MP-PR), Receita Federal, Tribunal de Contas do Estado do Paraná (TCE-PR) e Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade, autarquia vinculada ao Ministério da Justiça responsável por investigar supostos crimes contra a ordem econômica).
“O limite da CPI é apresentar sugestões, não cabe a nós indiciar ou julgar. O relatório é apenas o começo daquilo que imaginamos como futuro do transporte coletivo de Curitiba”, declarou Bruno Pessuti. “O relatório final é técnico, imparcial e honesto”, completou.
O presidente da Casa, Paulo Salamuni (PV), destacou a criação da CPI, proposta por Chicarelli (PSDC), e a atuação de seus integrantes. Também agradeceu aos servidores e aos movimentos sociais. “Temos 38 vereadores, cada um com sua ideologia, mas aqui não há cartel, pressão de poder econômico ou grupo que nos dirija”, disse.
Instalada em 28 de junho, a CPI do Transporte Coletivo realizou quatro diligências e 28 reuniões (13 extraordinárias e 15 ordinárias). Foram ouvidas 26 pessoas, que totalizaram 110 horas de depoimentos, e apresentados 99 requerimentos com pedidos de oitivas, documentos e informações a empresas e órgãos públicos.
Indiciamentos
A CPI do Transporte Coletivo propôs indiciamentos por dois motivos: suspeita de fraude na licitação e sonegação fiscal. O primeiro grupo, que traz Isfer e Ghignone, também reúne membros da Comissão Especial de Licitação e da comissão técnica da Urbs que assessorou o processo. Diversos deles foram ouvidos pelo colegiado, como Luiz Filla, Rodrigo Grevetti e Cássia Ricardo de Aragão.
O documento levanta dúvidas sobre o “imotivado favorecimento de determinadas concorrentes a tornar as antigas operadoras do sistema concorrentes imbatíveis no certame, o que evidentemente teve o condão de frustrar o caráter competitivo, o que caracteriza fraude à licitação”.
No segundo grupo, são apontadas cerca de 60 pessoas e 35 empresas ligadas aos consórcios que operam a Rede Integrada de Transporte (RIT). Sobre eles há a suspeita de formação de cartel, apropriação indébita e sonegação do Imposto Sobre Serviços (ISS), Imposto de Renda Pessoa Jurídica (IRPJ) e Contribuição Social Sobre Lucro Líquido (CSLL).
“A CPI mostrou que as concessionárias nunca tiveram o recolhimento do ISS auditado pela prefeitura”, avaliou o relator. “Foram R$ 480 mil sonegados por apenas uma empresa.”
Redução da tarifa
Para a redução da tarifa, os vereadores indicam sugestões à Urbs, prefeitura, governo estadual e empresas. “Encontrar a fórmula de cálculo dos itens tarifários foi uma das maiores dificuldades da CPI. A redução da tarifa é possível com alterações em pelo menos 15 dos itens da planilha”, destacou Pessuti.
Com as modificações na planilha tarifária, os vereadores calculam que a tarifa possa chegar a R$ 2,63. Dentre elas, a retirada do cálculo dos gastos com o Sites e o Segbus e a revisão dos valores destinados à manutenção da bilhetagem eletrônica, lubrificantes, encargos administrativos e combustível. “Não somos contrários à rentabilidade justa (que compõe a tarifa técnica), mas as empresas lucram até 40% em apenas um item”, justificou o relator.
O documento aponta que a redução poderia ser ainda maior. Se retirada da planilha as taxas de administração da Urbs e do Fundo Assistencial (repassado ao sindicato que representa os motoristas e cobradores de ônibus, o Sindimoc), chegaria a R$ 2,51. Com a manutenção dos subsídios, a R$ 2,22.
“O Fundo Assistencial é importantíssimo à categoria, mas o que questionamos é sua legalidade. Sugerimos que seja mantido, mas não provisionado na tarifa”, explicou Bruno Pessuti. “Como um acordo coletivo pode criar um item tarifário que onera todos os usuários?”
Quanto à Urbs, o vereador questionou que, se já existe a taxa de administração, por que há a cobrança pelos serviços de limpeza e vigilância dos terminais. Ele levantou a possibilidade de se alterar a natureza jurídica da sociedade de economia mista ou, ainda, criar uma secretaria municipal para tratar do transporte coletivo.
“A tarifa de Curitiba sempre esteve entre as menores do país, mas após a licitação passou a figurar entre as três mais caras”, declarou Bernardi. “Além de caro, o serviço se deteriorou e passou a receber subsídio do Poder Público. Neste ano foram R$ 90 milhões, valor que em 2014 pode chegar a R$ 140 milhões.”
No relatório são feitas, ainda, diversas sugestões. Ao governo estadual, pede-se a aplicação da isenção do ICMS sobre o diesel, que será discutida em plenário, na próxima semana, junto à secretária da Fazenda do Paraná, Jozélia Nogueira. São levantadas, ainda, questões como convênios para se prover as gratuidades (idosos, policiais militares etc.), publicidade nos ônibus, fiscalização dos contratos, combate aos “fura-catraca” e universalização do Cartão Transporte.
Nulidade
O relatório sugere a nulidade dos contratos. Por meio de Termo de Ajuste de Conduta (TAC) supervisionado pelo MP-PR, as empresas operariam como permissionárias da RIT até a nova licitação, já com a planilha da tarifa técnica alterada e a redução tarifária.
“Entendemos que os contratos são nulos e deve ser apresentada ação judicial”, apontou o relator. De acordo com ele, um dos motivos que justifica a nulidade foi a ausência de novo parecer antes da publicação do edital, após 40 alterações. “O primeiro documento sugeria, por exemplo, que o combustível constasse na tarifa da planilha pelo preço mínimo. Já o alterado, que fosse pelo valor médio.”
Composição
A CPI do Transporte Coletivo contou com a representatividade de todas as bancadas da Câmara Municipal de Curitiba. O colegiado teve como presidente e vice, respectivamente, Jorge Bernardi (PDT) e Serginho do Posto (PSDB). Na relatoria e vice, Bruno Pessuti (PSC) e Valdemir Soares (PRB).
Também integraram a Comissão Parlamentar de Inquérito os vereadores Chicarelli (PSDC), Chico do Uberaba (PMN), Cristiano Santos (PV), Geovane Fernandes (PTB), Mauro Ignacio (PSB), Noemia Rocha, Paulo Rink (PPS), Professora Josete (PT) e Tiago Gevert (PSC, que substituiu Toninho da Farmácia, do PP).
Confira a íntegra do relatório final! (Os anexos com as ressalvas apresentadas por vereadores da Comissão serão disponibilizados na próxima semana).
Reprodução do texto autorizada mediante citação da Câmara Municipal de Curitiba